Diz o seu director-adjunto, Amílcar Correia:
"No ano que terminou, um ano para esquecer, como se chamava o nosso especial dedicado aos acontecimentos de 2020, o PÚBLICO foi o site de referência em Portugal com mais visitas. O PÚBLICO online totalizou mais de 276 milhões visitas durante o último ano, um crescimento de 43% face a 2019. O tempo médio de permanência dos leitores nas páginas do site aumentou 35% nos últimos 12 meses. Comparando com os dados revelados pelo Expresso e pelo Observador, o PÚBLICO teve mais 35% de visitas do que o primeiro (que registou um total de 203 milhões de visitas) e mais 4,3% do que o segundo (que registou 264 milhões de visitas)."
Isto não surpreende, porque os Portugueses que LÊEM não procuram ler textos truncados, escritos no vergonhoso mixordês, que anda por aí, e nada tem a ver com a Cultura Linguística Portuguesa.
Quem LÊ, procura textos escorreitamente escritos em Bom Português, e não só o Jornal PÚBLICO, como LIVROS, que, felizmente, estão a desabrochar, por aí, em Bom Português, incluindo as traduções de obras estrangeiras.
Parabéns PÚBLICO! Parabéns a todos os que preferem o que é Português, porque o que é Português é bom e é nosso!
Isabel A. Ferreira
1 – A grafia portuguesa de 1945, que está em vigor, visto não ter sido revogada - é aplicada pelos mais instruídos, mais cultos e pelos mais conscientes do significado de uma Língua para um País.
2 – A grafia brasileira de 1943, preconizada pelo AO90, e que não está em vigor em país nenhum, excePto em Portugal - é aplicada pelos mal informados, mal formados, ignorantes, cobardes, acomodados, comodistas e escravos do Poder, mais conhecidos por acordistas.
3 – A Mixórdia Ortográfica Portuguesa, a mais disseminada – é aplicada pelos semianalfabetos e pelos analfabetos funcionais (que os há por aí aos montes) que escrevem absolutamente à balda, como lhes dá na telha, a mistura das grafias portuguesa e brasileira e a que provém da ignorância deles.
Perante isto, é da inteligência mandar às malvas o AO90, e regressar à nossa grafia, à grafia portuguesa, pois Portugal é um país (por enquanto independente, mas a caminho de deixar de ser) que tem uma Língua, por que haverá de adoPtar a variante brasileira do nosso Português, e andar para trás como o caranguejo?
Porém, ao que consta, os que podem, querem e mandam não pretendem finar o AO90, nem aprimorar o estudo da Língua Portuguesa, nas escolas portuguesas, para estarmos ao nível das escolas europeias. Os que podem, querem e mandam apoiam, incondicionalmente, a Mixórdia Ortográfica Portuguesa, a nova linguagem, que eles próprios adoPtaram, e que acham (se ao menos pensassem!) que é moderna e muito graciosa.
Vivemos tempos estranhos, em que os €€€€€€€€€€€ e outros obscurantismos, e não o sonho da Língua escrita e falada com qualidade, comandam a vida…
Então façamos correr mundo, o que se passa em Portugal, no que respeita ao desrespeito pela Língua Oficial do País.
Claro que o que irão ver a seguir, tem a ver com a bandalheira que o AO90 introduziu na grafia portuguesa. Nunca como depois deste "acordo", o Português se degradou tanto, porque agora tanto faz, como tanto fez, escrever de um modo ou de outro. Ninguém paga multa por escrever incorrectamente a Língua Materna. Mas devia pagar. Por cada erro deviam pagar uma multa de 5.000 €, e Portugal poderia, deste modo, contratar Professores habilitados para o Ensino da Língua Portuguesa Portuguesa, pagar as suas dívidas, e ainda sobraria dinheiro nos cofres do Estado para editar manuais escolares em Língua Portuguesa. Portugal seria um país muito, muito rico.
Assim, é um pobretanas, e desprestigiado no mundo inteiro, um alvo fácil da chacota das pessoas mais cultas e instruídas.
O jornal i em grande estilo 😂
Fonte:
A filosofia do AO90 é para cortar tudo o que não se lê, mas a gana é tanta, que eles cortam até o que se lê…
Fonte:
Até tu, Expresso?
Fonte:
Será que isto é abrangido pelo novo acordo ortográfico!? 😅 É que não se lê, corta-se!
Fonte:
Do verbo “TRACAR”
Fonte:
No site da RTP anda alguém fortemente empenhado em dar cabo da língua portuguesa.
Vergonhoso! Santa ignorância!
Fonte:
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10220677746591465&set=a.1278758846968&type=3&theater&ifg=1
Portugal... RTP 3 – CULTA e Adulta e portuguesa (?) e paga com os nossos impostos.
Fonte:
É só ler com sotaque…
Fonte:
Ainda andamos nisto de fato. Só falta a gravata.
Não é à primeira, não é à segunda… seria à terceira?
Fonte da imagem:
E, para finalizar, algo com que nos deparamos demasiadas vezes:
Quem, no seu juízo perfeito, poderá dizer que está contentinho com o que se passa em Portugal com todo este desmando ortográfico (e isto é apenas uma ínfima recolha, das várias centenas que por aí existem).
E com isto me vou, por um tempo, para preservar a minha sanidade.
Até ao meu regresso!
Isabel A. Ferreira
Francisco Miguel Viegas diz, e muito bem, no artigo que dá título a esta publicação:
«O impacto real do AO90 verifica-se em textos concretos e não em ilusões. Convém que o poder político deixe de insultar quem o elege e de atirar areia para os olhos ou, segundo a doutrina vigente, arena para os óculos».
Na minha perspeCtiva, o que FMV escreveu neste texto, seguindo uma óPtica correCtíssima, assim muito, muito espremidinho, significa isto: se os acordistas não assentaram o AO90 na mais profunda ignorância do Português (e já nem falo no de lá ou no de cá) parece, pois demonstram-no constantemente, diariamente, insistentemente, mentendo dó...
Além disso, se pretenderam unificar as ortografias brasileira e portuguesa, esqueceram-se de um pormenor importantíssimo: ou o Brasil começava a escrever totalmente à portuguesa, pois é à portuguesa que todas as outras ex-colónias escrevem, ou Portugal e todas as outras ex-colônias começavam a escrever à brasileira. De outro modo, cada um puxa a brasa à sua sardinha, e lá vai a tontice de querer unificar algo que é absolutamente impossível de unificar, pelos motivos mais óbvios a qualquer ser pensante.
E é bem verdade o que diz, FMV: convém que o poder político deixe de insultar quem o elege e de atirar areia para os olhos de todos os que os têm bem abertos e são capazes de raciocinar...
Isabel A. Ferreira
Por Francisco Miguel Valada
«O Acordo Ortográfico e as respectivas facções»
«Está nisto desde que veio. (…) De curtas e compridas tem-nos chamado de tudo.»
António Lobo Antunes, Memória de Elefante
«A primeira frase de um recente despacho da Lusa, divulgado pelo Expresso, ilustra bem a farsa do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90). Passo a transcrever: “As fações rivais líbias convidadas pela ONU a participar em negociações políticas na quarta-feira em Genebra (Suíça) anunciaram esta segunda-feira separadamente a decisão de suspenderem a respetiva participação no diálogo, alegando motivos diferentes.” Efectivamente, esta frase está e não está de acordo com o esperado de uma frase cumpridora do estabelecido na base IV do AO90. Por um lado, temos *fações e *respetiva, porque em português europeu a oclusiva velar correspondente à letra ‘c’ nas palavras facções e respectiva não é pronunciada. Por outro lado, como em português do Brasil a oclusiva velar correspondente à letra ‘c’ naquelas palavras é pronunciada, o resultado seria diferente se este texto, em vez de aparecer no Expresso, tivesse aparecido na Folha de S. Paulo, ou seja, haveria facções e respectiva.
Isto é, actualmente, em português do Brasil escrito, versão 1990, aquelas grafias correspondem às fabulosas formas já existentes no português europeu escrito com a ortografia de 1945, a ortografia óptima, segundo a melhor informação científica disponível. Assim sendo, em português do Brasil com AO90 e em português europeu sem AO90, temos esta deliciosa frase: “As facções rivais líbias convidadas pela ONU a participar em negociações políticas na quarta-feira em Genebra (Suíça) anunciaram esta segunda-feira separadamente a decisão de suspenderem a respectiva participação no diálogo, alegando motivos diferentes.”
Com efeito, apesar do reconhecido valor grafémico da letra ‘c’ em facções e respectiva, os autores do AO90 decidiram aniquilá-la em português europeu. É evidente que tal decisão de supressão da letra ‘c’ foi tomada ao arrepio de pareceres e artigos científicos, aos quais os deputados e o Governo não ligaram nenhuma, escolhendo o pouco corajoso acto da fuga para a frente. Alguns, aliás, têm preferido mesmo o recurso à provocação e à deselegância. Recentemente, um deputado do Partido Socialista (PS) aproveitou a morte de João Malaca Casteleiro para ofender quem estuda e trabalha. De facto, Ascenso Luís Simões lamentou que “quem nega a atual [sic] ortografia não entenda que a língua portuguesa não pode ficar agarrada a uma visão é [sic] um tempo marcados pelo colonialismo”. Aguarda-se uma retractação, uma vez que pedir para ler pareceres e artigos, pelos vistos, é pedir imenso. Convém, apesar de tudo, separar o trigo do joio. Por exemplo, Pedro Cegonho, também ele deputado do PS, tem disponibilidade para ouvir educadamente argumentos contra o AO90. É essa, aliás, a impressão que fica do excelente e minucioso relato feito por Rui Valente, sobre o encontro de uma delegação da Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico com representantes do Grupo Parlamentar do PS.
Voltando ao assunto que aqui trago, a supressão da letra ‘c’ tem, portanto, duas consequências: uma consequência interna e outra externa. Quanto à interna (do ponto de vista português europeu), temos a provável homonímia de *fação com uma localidade do concelho de Sintra chamada Fação e a potencial rima de *respetiva com discretiva. No que diz respeito à externa, cria-se um novo fosso entre as normas europeia e brasileira, afastamento provocado justamente pela principal base do AO90. Em suma, exactamente o oposto das promessas e juras de negociadores, promotores e amigos do dito cujo.
O impacto real do AO90 verifica-se em textos concretos e não em ilusões. Como vimos no início, a primeira frase de um despacho da Lusa não tem qualquer palavra afectada pelo AO90 em português do Brasil, mas tem duas palavras afectadas pelo AO90 em português europeu. Convém que o poder político deixe de insultar quem o elege e de atirar areia para os olhos ou, segundo a doutrina vigente, arena para os óculos.
Autor de “Demanda, Deriva, Desastre: Os Três Dês do Acordo Ortográfico” (Textiverso, 2009)
Fonte:
«Na morte do “pai” do Acordo Ortográfico de 1990, era preferível que tivesse ficado o homem e morrido a “obra”.» (Nuno Pacheco)
Pois concordo plenamente com o Nuno Pacheco.
E o facto é: não os Homens, mas o Futuro e a História sempre se encarregaram de julgar os que, pelas suas acções destruidoras, deixaram um rasto ruinoso, pelo caminho que percorreram em vida.
E o Dr. João Malaca Casteleiro (logo ele, um linguista, quem diria!) fez uma escolha errada, altamente prejudicial aos interesses de Portugal e dos Portugueses, e é essa escolha que marcará negativamente o seu lugar na História, e não só o dele, como o de todos os que se envolveram e estão envolvidos, na destruição da Língua Portuguesa, através da imposição ilegal (não esquecer que o AO45 não foi revogado e é a ele que devemos “obediência”) de um “acordo ortográfico” que nunca foi acordo, além de ser uma grande fraude.
Fiquemos com mais um excelente contributo de Nuno Pacheco, para a História da Defesa da Língua Portuguesa, em Portugal.
Texto de Nuno Pacheco, publicado no Jornal Público
«Há casos em que é justo dizer: morre o homem, fica a obra. Mas na morte de João Malaca Casteleiro, lembrado na maioria dos obituários noticiosos como “pai” do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90), era preferível que tivesse ficado o homem e morrido a “obra”. Apesar de ser difícil nutrir por ele simpatia, dado o que protagonizou, há que reconhecer-lhe a teimosa persistência num acordo que desde a génese era claramente um logro, mas que ele acabou por fazer impor.
Numa entrevista recente ao Observador, o linguista Fernando Venâncio (autor de Assim Nasceu Uma Língua, ed. Guerra & Paz, 2019 caracterizou deste modo tal logro: “O AO90 visava possibilitar um relatório, uma declaração, uniformes para todos os países de língua portuguesa. Visava, até, e aí já entramos no terreno da alucinação, conseguir a circulação de produtos linguísticos idênticos (traduções de literatura, legendagens, instruções de máquinas de lavar) por todas essas áreas do Planeta. Mas tenho de lhe tirar o chapéu, ao Dr. Malaca Casteleiro e seus próximos: foi com essa visão paradisíaca que convenceram os políticos.”
Pois agora que morreu, nem todos se apressaram a tirar-lhe o chapéu. No dia em que foi conhecida a sua morte, domingo, 9 de Fevereiro (a morte ocorrera no dia 7), a primeira notícia surgiu no Jornal de Notícias, assinada por Sérgio Almeida, seguindo-se, por esta ordem, as do Correio da Manhã, Sapo, PÚBLICO, Diário de Notícias, Observador e Expresso. O jornal i só no dia seguinte deu a notícia e apenas na edição em papel, numa breve de última página. Curiosamente, quer o Ciberdúvidas, quer o Instituto Internacional da Língua Portuguesa (sítio oficial do AO90), quer a Academia das Ciências de Lisboa (esta lamentando o falecimento numa curta nota) só no dia 10 deram notícia da sua morte. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, evocou-o como “defensor da língua portuguesa” (sic), mas do Governo, ou de ex-governantes que o apoiaram, nada se ouviu. Só o silêncio. Quanto à CPLP, só no dia 11 expressou “profunda consternação e grande pesar” pelo falecimento.
Há outro motivo, na história da língua portuguesa, para recordar João Malaca Casteleiro: o Dicionário da Academia das Ciências de Lisboa (ACL), também este controverso. Fundada em 24 de Dezembro de 1779, no reinado de D. Maria I e em pleno iluminismo, a então Academia Real das Ciências começou a editar um dicionário da língua portuguesa em 1793, mas não passou do primeiro volume, só com a letra A, volume esse que viria a ser reeditado, “com a modernização indispensável”, 183 anos depois, em 1976. E não passaria daí até 1988, ano em que a Fundação Gulbenkian “lhe concedeu os meios indispensáveis à remuneração permanente da equipa do Dicionário”, segundo escreve no prefácio do dito (que viria a ser publicado em 2001, mas já lá vamos) o então presidente da ACL, Pina Martins, que fala ainda num “vultoso subsídio pontual” de duas outras entidades: a Secretaria de Estado da Cultura e a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento. Malaca Casteleiro foi indicado para coordenador e a equipa, cuja lista o livro integra, contou com 61 “colaboradores externos” que trabalharam no dicionário por “um período, em princípio, não inferior a seis meses”.
Enquanto isto, o que sucedia no mundo, nestes dois séculos, em matéria de dicionários do português? Publicava-se o pioneiro Vocabulário do padre Raphael Bluteau (de 1712 a 1728), o Dicionário de Morais (1789, com uma edição monumental em 1961 de 12 volumes, 12.278 páginas e 304.460 vocábulos), o de Eduardo de Faria (1853), o de Frei Domingos Vieira (1871), o Aulete (iniciado em 1881), o Michaelis (1887?), o Cândido de Figueiredo (1898), o Lello Prático Ilustrado (1927), o da Porto Editora (1952), o de José Pedro Machado (1958, com reedições em 1971 e 1981, esta com 12 volumes e um 13.º de actualização, em 1986, num total de 8063 páginas), o Vocabulário de Rebelo Gonçalves (1966), o Aurélio (1975) e o da Texto Editora (de 1995, que dedicava as suas últimas 48 páginas, num total de 1654, a dizer o que mudaria com o acordo ortográfico).
O da ACL sai em 2001, e com uma chancela comercial: a da Verbo. O mesmo ano em que, no Brasil, se publicava pela primeira vez o Dicionário Houaiss. Mas enquanto este, na edição portuguesa, logo em 2002 e também pela mão de Malaca Casteleiro (que coordenou a sua adaptação à ortografia de 1945), lamentava não ter havido “ainda vontade política de levar por diante a implantação do Acordo Ortográfico celebrado em 1990”, o da ACL omitia-o por completo. Como se não existisse. Dez anos depois de o AO90 ter sido assinado em Lisboa, a ACL punha à venda um caro dicionário em dois grossos volumes com a norma de 1945 (que ainda hoje está legalmente em vigor, assinale-se!), não dedicando uma só palavra ao acordo que o seu próprio coordenador fizera questão de “vender”, com êxito, a políticos desejosos de brilhar numa qualquer ribalta da História. Isto quando dicionários como o da Texto (de 1995) já incluíam listas de palavras que seriam alteradas no novo acordo! Uma alucinação por fases, que habilidade! Só que em todas elas coube ao público, e à língua, pagar o preço do desvario.
P.S.: Por lapso (já corrigido, devido ao alerta de um leitor), não tinha sido referido o Vocabulário de Rebelo Gonçalves, editado em 1966.»
Fonte:
«É esse o problema»
Por Hélder Guégués
«O Expresso Curto de hoje, assinado por João Cândido da Silva, coordenador do Expresso Online, não foi à máquina corta-língua: há um «baptizado», uma «direcção», vários «directos» e «indirectos», um «actualmente», um «jacto» (o de Carlos Ghosn), vários «objectivos» (nenhum, infelizmente, parece ser o de assentarem a cabeça), um «nocturno» (que não é o de Chopin, nem ninguém aqui falou de Santana Lopes), «actuais», «respectivos», «perspectiva», «actualidade», «actuação»... Para alguns, escarninhos, isto mostra a liberdade de que se goza no Expresso; para mim, é meramente a demonstração da bandalheira ortográfica e linguística que ali reina e campeia no reino. Mas eu nem me devia queixar, não é?, afinal, nem sinais do tal acordo. (Parabéns, João Cândido da Silva.) Só que logo, amanhã, no futuro outros jornalistas do mesmíssimo Expresso voltam a seguir ineptamente a ortografia mutiladora do AO90. Esse é que é o problema.»
Fonte:
As intermitências do Acordo Ortográfico
***
Concordo plenamente consigo, Helder Guégués.
Para mim, tudo isto é também uma grande bandalheira ortográfica e linguística, não só no Expresso, infelizmente, mas em muitos outros lugares, incluindo as escolas, pela mão de professores.
E este, realmente, é um grande e grave problema.
Isabel A. Ferreira
Um texto de Francisco Miguel Valada, para ler, reler e reflectir.
«A união de fato e o pára-raios: hábitos e recaídas
Kein Mensch kann wirklich leben, wenn nicht noch ein Funken von Hoffnung in ihm ist. Und das sollten die Massenmedien nie vergessen.
— Hans-Georg Gadamer
A marcha era lenta, iam velhos entre eles e mesmo os moços estavam no limite da fadiga, não podiam mais. Alguns quase se arrastavam, sustentados apenas pela esperança.
— Jorge Amado
***
Esta semana tem sido extremamente produtiva. Tivemos alguns exemplos do sítio do costume, como o contato de 13 de Maio ou os contatos de anteontem, aos quais se juntam os fatos de ontem:
Exactamente: fatos.
No Expresso. tem havido recaídas. Como se sabe, não há três sem quatro.
Efectivamente: pára-raios.
E hoje?
Hoje, dedicaremos a nossa atenção ao sítio do costume e a outro aspecto da adopção do AO90:
Exacta e efectivamente: coletivo, colectiva e colectivamente.
E amanhã?
Amanhã, felizmente, não há Diário da República.
Desejo-vos um óptimo fim-de-semana.
Fonte: https://aventar.eu/2019/05/page/2/
Um interessante texto, de Zé Morgado, no Blogue Atenta Inquietude, para reflectir o AO90.
Origem da imagem: https://acasadevidro.files.wordpress.com/2015/03/f-pessoa.jpg
Por Zé Morgado
Segundo o Expresso, a Assembleia da República irá dentro de algum tempo apreciar um conjunto de recomendações de alterações no Acordo Ortográfico de 1990, o acordo do nosso descontentamento. As recomendações foram elaboradas por um grupo de trabalho constituído pelo Parlamento. Será ainda apreciado um projecto de lei decorrente de uma petição subscrita por mais de 20.000 cidadãos que exigem a sua revogação.
Enquanto for possível reverter a situação criada pelo AO90 vale a pena insistir, importa que não nos resignemos. É uma questão de cidadania, de defesa da Cultura e da Língua Portuguesa.
É importante recordar que apenas Portugal, S. Tomé e Príncipe, Brasil e Cabo Verde procederam à ratificação. Em 2018 a Academia Angolana de Letras solicitou ao Governo angolano que o Acordo Ortográfico de 1990 não seja ratificado e há uma semana a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados do Parlamento do Brasil aprovou um requerimento de audiência pública para que seja debatida a revogação do AO ao que parece por indicação do Presidente Bolsonaro o que será porventura umas raríssimas ideias positivas vindas da figura.
Como tantas vezes tenho escrito, desculpem a insistência e não inovar, entendo, evidentemente, que as línguas são estruturas vivas, em mutação, pelo que requerem ajustamentos, por exemplo, a introdução de palavras novas ou mudanças na grafia de outras, o que não me parece sustentação suficiente para o que o Acordo Ortográfico estabelece como norma.
Mas o que se fez foi transformar a Língua Portuguesa numa confusão impossível de concertar dadas as diferenças entre o Português falado pelos diferentes países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
Há dias, em vários órgãos de comunicação social encontrava-se um título onde se lia “Para brisas de Realidade Aumentada para tornar os carros mais seguros”. Como? A frase faz sentido em Português? O que são “brisas de realidade aumentada” e o que têm a ver com a segurança dos carros? Ah, afinal é pára-brisas. E não podia continuar a ser?
A ideia da impossível harmonização não colhe e não é um problema. Basta atentar no inglês ou no castelhano em tantos países que têm estas línguas com língua oficial sem necessidade de um “acordo”.
O que na verdade se verifica, existem exemplos extraordinários, é a transformação da Língua Portuguesa numa mixórdia abastardada. Por coincidência, ontem assinalou-se o Dia da Língua Portuguesa, talvez fosse boa ideia protegê-la.
Como tenho escrito e repito, vou continuar a escrever assim, “desacordadamente”.
***
Comentário:
CM disse...
As línguas serão "estruturas vivas", como dia, e a criação de novas palavras é um facto. Já quanto à necessidade da mudança da grafia das palavras, convirá reflectir...
O inglês não necessitou de mudanças e o francês teve uma há 250 anos.
Os alemães mudaram algumas grafias mas o resultado foi o aparecimento de sequências de três consoantes iguais...
A grande reforma do espanhol, exceptuadas as mudanças de hifenização, mudou 10 ou 15 palavras (sic) sendo que uma delas foi Qatar, que a reforma propõe que se escreva em espanhol, Catar... Propõe, porque como afirmava uma ilustre linguista e académica de número da Real Academia de Espanha, não se pode mudar a ortografia numa democracia, motivo pelo qual todas as mudanças são meramente indicativas.
"Reformas" como a de 1911, nenhuma democracia a teve.
Uma outra questão, num país onde o mito do progresso tem tanto sucesso, consistirá em verificar o que é "evolução": a evolução consiste na passagem de um estado inferior a outro superior e mais complexo... Na ortografia, consiste na estabilização da mesma - o que exige uma escolarização de qualidade e universal - acompanhada de hábitos de leitura e de escrita. Portugal é um dos países com maior analfabetismo na Europa e a taxa de decréscimo nos últimos 40 anos é menor que a mesma taxa dos 40 anos anteriores à década de 70 do século passado.
Quanto à iniciativa - tudo o que seja acabar com o acordo é bom, mas em Portugal rege o princípio da prevalência da lei internacional, pelo que o acordo - que legalmente não está em vigor em lado nenhum! - o acordo, dizia-se, mesmo apenas assinado, não pode ser modificado sem ser por ratificação unânime de todos os signatários do mesmo!
Conviria que Portugal deixasse de viver, no que ao estado de direito diz respeito, no país das maravilhas.
Rever? Rever o quê? O que há para rever no AO90?
Bem, se me disserem que é para repor todas as consoantes mudas que o AO90 surripiou, e dar o dito pelo não dito no que respeita à acentuação e hifenização mal-amanhadas, alinhavadas à pressa, o que provocou mais caos do que ordem na escrita, se é para repor a grafia da Língua Portuguesa, então será uma medida inteligente.
Tudo o resto será uma tentativa de colar cacos.
Imagem reconstituída daqui: https://medium.com/@pedrograca13/kintsugi-4d16a67040b5
Se é para colar os cacos deixados pela imposição ilegal do AO90, a pergunta é: o que andou a fazer o Grupo de Trabalho criado pelo Parlamento para “estudar” (ou fazer-de-conta que ia estudar?) a aplicação das novas regras (desregradas) para a Língua Portuguesa (que é como quem diz, o modo de grafar à brasileira) para chegar à conclusão de que é preciso “rever” e não eliminar urgentemente o aborto ortográfico antes que faça mais mossa do que já fez?
É óbvio que ninguém quer uma revisão, porque uma revisão seria admitir que o AO90 tem alguma ponta por onde se lhe pegue. O que não é verdade. Até o Brasil quer a REVOGAÇÃO. Por que há-de Portugal pretender rever o que os outros países estão a descartar?
Porém o que mais me chamou a atenção nesta notícia, que pode ser lida mais abaixo, foi o que disse o assessor cultural do presidente da República, Pedro Mexia:
Lê-se:
«Mas, afinal, o que está em cima da mesa? Não é provável que a revogação do acordo aconteça em Portugal. Apesar da frontal discordância perante o AO, o escritor e assessor cultural do Presidente da República, Pedro Mexia, reconhece que seria “problemático” anular o acordo, depois de este ter sido aplicado na Administração Pública e nas escolas — “foi dado um passo maior do que as pernas e até alguns dos maiores defensores estão a assumir que foram feitos erros e disparates».
Como disse, Pedro Mexia? O maior disparate é dizer que seria “problemático” anular o acordo. Isto é passar um atestado de incapacidade intelectual a todos os que cegamente ou servilmente começaram a escrever incorreCtamente a Língua, que passaram anos a escrever correCtamente, antes de a imposição forçada da grafia brasileira.
Neste grupo dos incapazes de tornar a escrever como sempre escreveram, não estão incluidos as crianças e os jovens, porque estes têm capacidade para aprenderem e desaprenderem tudo e mais alguma coisa, sem o menor problema. Os adultos, que fazem parte da administração pública, não terão a capacidade de tornar a escrever como sempre escreveram? Serão assim tão inscientes? Isso não serve de desculpa, não é um argumento racional, para que se mantenha o erro, enquanto nos restantes países o AO90 está a ser rechaçado.
Não há problemática nenhuma, Pedro Mexia, o que há é má-vontade. Voltar atrás vai dar algum trabalho, mas não é impossível. Impossível é manter os Portugueses e os funcionários públicos a escrever a mixórdia ortográfica criada pela aplicação do AO90, a exemplo do primeiro-ministro de Portugal e da comunicação social servilista, que nem à brasileira, nem à portuguesa, o que escrevem é à balda.
Veja-se aqui um bom exemplo da mixórdia ortográfica gerada pelo AO90, por parte de quem tinha o DEVER de falar e escrever correCtamente a Língua do país, do qual é primeiro-ministro, e no seu Tweeter, dá uma no cravo outra na ferradura, à baldex (para usar uma linguagem muito na moda).
(Imagem recebida via-email)
Não é da racionalidade destruir uma Língua, e ficar parvamente sós, apenas porque se acha que uns poucos já não são capazes de voltar a escrever correCtamente, o que levaram anos a aprender. Mas que raciocínio mais retorcido será este? É assim tão mais difícil desaprender o que em menos de dez anos aprenderam? Não posso aceitar esta premissa sem perplexidade.
Quanto às crianças, nas escolas, não haverá o mínimo problema. Se não houve para mim, que com a maior facilidade, aprendi e desaprendi a escrever e a falar ora à brasileira, ora à portuguesa, durante a minha infância, adolescência e juventude, sempre que me deslocava daqui para lá, e de lá para cá, e não sou nenhum supercérebro, não haverá o mínimo problema com as crianças e jovens de hoje. Isto é algo que pode ser comprovado pelas Ciências da Mente, porque o cérebro dos mais jovens está mais disponível para a aprendizagem, do que os cérebros menos jovens.
Portanto, o “argumento” ah! o acordo já foi aplicado e é “problemático” voltar atrás é um não-argumento.
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Regressemos à notícia assinada por
Alexandra Carita e Christiana Martins
Nota: os trechos e os comentários a negrito são da minha responsabilidade.
Parlamento revê (des)Acordo Ortográfico
«Grupo de trabalho constituído pelo Parlamento recomenda alterações. PS é o único partido que não quer mexidas. Uma década depois de entrar em vigor, o acordo pode voltar à estaca zero.
(O PS lá terá razões que a racionalidade desconhece).
Dez anos depois de ter sido aprovado, em Maio de 2009, o Acordo Ortográfico (AO) deverá agora ser alterado. É isso que defende o grupo de trabalho criado pelo Parlamento para estudar a aplicação das novas regras para a Língua Portuguesa. A recomendação consta do relatório final que será entregue nas próximas semanas. Mas o polémico tratado pode mesmo vir a ser revogado, como exige um projecto-de-lei que resulta de uma petição assinada por mais de 20 mil pessoas e que deu entrada no mês passado na Assembleia da República. Tudo isto numa altura em que, no Brasil, a discussão sobre a revogação do AO está na ordem do dia e em que Cabo Verde está prestes a declarar o crioulo como língua oficial. A reviravolta, esperada por tantos ao longo da última década, pode mesmo acontecer. O Governo está contra.
(Ao Governo, estando enterrado nesta negociata obscura até ao pescoço, não convém mexer nela, para que a verdade não venha ao de cima.)
Os partidos não são consensuais na análise ao AO e prepara-se um esgrimir de opiniões. PSD, CDS, PCP e Bloco de Esquerda querem alterar ou mesmo revogar o documento. O PS é o único que quer que tudo fique como está. A Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC) é o mais radical dos documentos a ser alvo de votação em plenário: pretende a “suspensão” por “prazo indeterminado” com vista a serem “elaborados estudos complementares que atestem a sua viabilidade económica, o seu impacto social e a sua adequação ao contexto histórico, nacional e patrimonial em que se insere”. As 20 mil assinaturas entregues conseguiram o registo de um projecto-de-lei e aguarda-se a definição da data da votação no hemiciclo, que deverá ocorrer ainda nesta legislatura.
Os signatários exigem a revogação da Resolução da Assembleia da República que aprova o segundo protocolo modificativo do AO, no qual se decidiu que a sua ratificação por apenas três dos então sete países de língua oficial portuguesa (Portugal, Brasil, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, e, mais tarde, um oitavo chamado Timor-Leste) era o bastante para que o documento entrasse em vigor (ver texto em baixo).
Mais: o projecto-de-lei designa ainda a ortografia anterior ao AO, vigente até 31 de Dezembro de 2009 e nunca revogada, como aquela a utilizar no presente. Maria do Carmo Vieira, membro da comissão representativa da ILC, defende que “não se trata de um braço-de-ferro, mas sim de uma luta pela inteligência, pelo carácter científico e pelo patriotismo”. “Aperfeiçoar o que é medíocre e está errado não me parece válido”, conclui.
Os deputados terão duas oportunidades para reflectir. O relatório conclusivo da “Avaliação do Impacto da Aplicação do Acordo Ortográfico de 1990” será apresentado na Comissão de Cultura nas próximas semanas e a sua votação parece ser mais fácil, bastando a iniciativa legislativa de um deputado ou grupo parlamentar para chegar a plenário.
O que querem os partidos
“No entendimento do grupo de trabalho, o AO carece, no mínimo, de ser aperfeiçoado”, afirma José Carlos Barros, deputado do PSD, coordenador do grupo de trabalho e relator do relatório final. “É evidente que a unificação ortográfica não se conseguiu. Na prática, o que está a acontecer é que Portugal está a aplicar o AO à força por uma resolução do Conselho de Ministros”, continua o deputado. Para o PSD, o Acordo foi um passo “não ponderado”. Na mesma linha está a deputada centrista Teresa Caeiro: “Não conheço ninguém que se reveja no AO”. O documento, afirma a representante do CDS-PP no grupo de trabalho, “foi absolutamente precipitado e levado a cabo por meia dúzia de académicos, que conseguiram levar em frente uma decisão que ninguém exigia”. Teresa Caeiro acredita que “mais vale reverter o erro do que perpetuá-lo” e defende, por isso, a revogação do Acordo. “O meu desejo é que se tenha a honestidade e a humildade para parar e rever o AO.”
O PCP, pela voz de Ana Mesquita, garante que as incongruências na aplicação do tratado são gritantes. “É a boa altura para se fazer a discussão sobre o AO e arranjar uma saída elegante do imbróglio em que estamos metidos”.
A tendência de voto do Bloco de Esquerda parece ir no mesmo sentido. Luís Monteiro assinala que existem críticas a fazer ao AO e tem muitas reservas em alguns pontos. O bloquista considera “pertinente uma iniciativa legislativa sobre o acordo e apoia a sua discussão em plenário”. “O AO pode ser melhorado”, diz, advertindo, no entanto, que a posição do BE é contra a revogação.
(Como é que algo que é rejeitado por milhares de escreventes, e que já ficou provado que é um aborto ortográfico, pode ser melhorado? Não pode melhorar-se algo que não é passível de ser melhorado. É como tentar dessalgar um arroz de ervilhas salgado, ou tornar sã uma fruta podre).
Sozinho, aparece o Partido Socialista. Diogo Leão, o deputado que acompanhou as reuniões do grupo de trabalho, diz, que “o PS não tem qualquer iniciativa em vista”. Para o partido do Governo, o acordo está em vigor e o “Estado respeita-o, as novas gerações já foram educadas com a nova ortografia e toda a Administração Pública o utiliza”. “Sendo assim, não temos motivos para o questionar”, conclui Diogo Leão.
(Bem, o PS com este modo de pensar, passa um atestado de estupidez não só aos Portugueses, como às novas gerações e principalmente à administração pública, que passou vários e compridos anos a grafar à portuguesa, e uns poucos a grafar à brasileira, e agora já não se lembra o que aprendeu na infância. Isto até pode acontecer a quem tem cérebros mirrados, mas não a quem tem cérebros activos, que é o caso das novas gerações. E há que ter em contra que é IRRACIONAL manter um erro, assente num argumento também tão IRRACIONAL).
Ao Expresso, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, diz que “os sistemas de ensino, editorial, jurídico e científico estão hoje sintonizados e a concertação político-diplomática com os outros países de língua portuguesa nesta matéria é ainda significativa”. Por isso, conclui o ministro que tutela o Acordo Ortográfico, “não se afigura a necessidade ou a oportunidade de, no momento, efectuar uma reversão”.
(O que diz o kapo de serviço para a destruição da Língua Portuguesa é uma redonda mentira. Ninguém está sintonizado em nenhum dos sistemas referidos, e muito menos existe concertação político-diplomática com os outros países. Zero concertação. Mas esta é a função de um kapo, que todos nós esperamos que seja afastado da próxima governação, para que a racionalidade regresse a Portugal.)
No entanto, feitas as contas, se o PS ficar isolado na votação do relatório conclusivo do grupo de trabalho, o AO será mesmo revisto e discutido com os votos do PSD, CDS, PCP e BE. O PAN não teve assento neste grupo de trabalho.
Cúmplices de Bolsonaro
Questionado pelo Expresso na viagem à China, o Presidente da República remete o desafio de alterar a situação para os políticos: “Estive em Moçambique há três anos e dizia-se que ia haver uma posição; em Angola iam tomar uma posição; no Brasil, periodicamente diz-se o mesmo, mas depois não é tomada posição nenhuma. Desde o início do meu mandato que me falam nisso [revogação] e o que tenho visto é que, quer em Portugal quer nos outros países, é uma matéria recorrentemente tratada, mas não há nenhuma iniciativa política. Mesmo no Parlamento não há”.
(O senhor presidente anda muito distraído e tão focado na sua pessoa que não está a par do que se passa ao seu redor. Acorde, senhor Presidente! Existe um país chamado Portugal, do qual é o presidente. Esqueceu-se? A Constituição da República Portuguesa não está a ser respeitada. Portugal violou várias convenções e o senhor não tem conhecimento disto? E ainda diz que não há nenhuma iniciativa política, quando devia pressionar o Governo para que revogue o AO90, que está a destruir a nossa identidade?)
Enquanto chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa diz que não pode formular juízos. Ainda assim, mantém as críticas que fez no passado. Em 2016, Marcelo, em declarações polémicas ao Expresso, referindo-se à não-ratificação do acordo por Angola e Moçambique, abriu a porta a uma revisão da vigência do AO. “Não é claro que o objectivo diplomático esteja a ser atingido e, caso estes países decidam não o adoptar, impõe-se uma reflexão sobre a matéria, que é de competência governamental, mas o Presidente não deixará de sublinhar a utilidade e necessidade de reflexão se se verificar que o objectivo primeiro não é atingido.”
(Enquanto Chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa formula juízos de tudo e mais alguma coisa, excePto da Língua Portuguesa, que ele, como Chefe de Estado, devia defender e não defende).
Até hoje, passados três anos, nem Angola nem Moçambique ratificaram o tratado. E agora é o Brasil que ameaça sair. Há uma semana, em Brasília, a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados aprovou um requerimento de audiência pública para que seja debatida a revogação do AO.
No documento a que o Expresso teve acesso, o deputado Jaziel Pereira de Sousa, do Partido da República, uma das siglas de direita, afirma que o pedido vem na sequência de um desejo do Presidente Jair Bolsonaro. Ainda antes deste requerimento oficial, Filipe Martins, assessor especial de Bolsonaro para Assuntos Internacionais, publicou no Twitter a intenção do Governo. “Depois de nos livrarmos do horário de Verão, temos de nos livrar da tomada de três pinos, das urnas eletrónicas e do acordo ortográfico.”
Em Portugal, um dos principais rostos da defesa do Acordo Ortográfico, Carlos Reis, professor da Universidade de Coimbra, diz que não existe uma estratégia para a língua portuguesa em nenhum dos países enquanto “o discurso político se limitar a declarações de circunstância, sem conteúdo nem propósito de continuidade”. E deixa um alerta aos partidos portugueses que discordam do acordo: “Resta saber se acabarão por se descobrir cúmplices inesperados de Jair Bolsonaro.”
O que vai mudar
Mas, afinal, o que está em cima da mesa? Não é provável que a revogação do acordo aconteça em Portugal. Apesar da frontal discordância perante o AO, o escritor e assessor cultural do Presidente da República, Pedro Mexia, reconhece que seria “problemático” anular o acordo, depois de este ter sido aplicado na Administração Pública e nas escolas — “foi dado um passo maior do que as pernas e até alguns dos maiores defensores estão a assumir que foram feitos erros e disparates”.
(Pedro Mexia é assessor do presidente. E quem é assessor do presidente, normalmente diz ámen.)
É precisamente para corrigir alguns desses erros que o grupo de trabalho constituído pelo Parlamento propõe o aperfeiçoamento do AO. Na base está o documento “Sugestões para o Aperfeiçoamento do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa”, entregue na AR em 2017, pela Academia de Ciências de Lisboa, o órgão consultivo do Governo no que respeita à língua portuguesa. Os três pontos-chave que determinam as alterações ao Acordo prendem-se com a acentuação gráfica, as sequências consonânticas e o emprego do hífen. Nada mais nada menos do que as regras que mais confusão têm gerado na escrita pós-AO. Exemplos multiplicam-se, mas vejam-se os mais comuns. O presente do indicativo da 3ª pessoa do singular do verbo parar (que, com o acordo, passou a escrever-se “para”) voltará a ter acento (“pára”), deixando de se confundir com a proposição para; no caso das consonantes mudas, voltam a ser escritas em algumas palavras para não gerar ambiguidade, como acontece com recessão (económica) e receção (de hotel); finalmente, no que respeita à hifenização, palavras com sentido único como faz-de-conta recuperam o hífen, bem como as palavras com formas reduzidas, afro-brasileiro ou euro-asiático.
(Aqui falta dizer que a acentuação e a hifenização são importantes para Brasil e para Portugal, porém para os Portugueses, além da hifenização e da acentuação há a grafia brasileira mutilada, que NÃO pertence à Língua Portuguesa, e essa tem de ser eliminada. A grafia brasileira é do Brasil. Não é de Portugal. As consoantes MUDAS têm de ser devolvidas à Língua Portuguesa. A revogação do AO90, para o Brasil, reduz-se apenas à acentuação e à hifenização, porque as consoantes mudas, lá, continuarão a ser suprimidas, tal como são desde 1943. Para Portugal a revogação do AO90 inclui a hifenização, a acentuação e a GRAFIA. Não esquecer deste pormenor importante: a grafia portuguesa tem de ser devolvida a Portugal).
Para quem pensa que as alterações poderão ser uma catástrofe para a economia livreira, João Alvim, presidente da APEL (Associação Portuguesa de Editores e Livreiros), desdramatiza: “O AO tem de evoluir e melhorar, muitas regras têm de ser analisadas, repensadas. Se tivermos de fazer alterações onde é necessário, fá-lo-emos progressivamente”. Mas não deixa de anunciar o pior, caso se tenha que alterar tudo, o que obrigaria a uma revisão completa dos livros técnicos, de ensino, manuais e livros de referência. “Nem quero pensar nisso”, diz João Alvim.
(Assim como se atirou ao lixo, os livros e os manuais correCtamente escritos, assim se atirará ao lixo os livros e manuais incorreCtamente escritos. As editoras deviam ser penalizadas pela ganância que tiveram, na destruição da Língua, mirando lucros com os novos livros acordizados. Daí que a falência era a pena que deviam levar pelo crime de lesa-língua.)
Com Filipe Santos Costa
Dez anos de legalidade pouco ou nada clara
Dos oito Estados subscritores, só Portugal cumpriu o que estava assinado. Os outros ou nunca ratificaram, ou não cumprem, ou querem sair.
Se Jair Bolsonaro cumprir a intenção de revogar o Acordo Ortográfico (AO) no Brasil, a ideia de uma língua transatlântica ficaria esvaziada em cerca de 220 dos mais de 250 milhões de falantes de Português. Mas esta hipótese é apenas o mais recente problema numa longa história de percalços num projecto que beneficia a fonética em detrimento da ortografia e começou a ser concebido no fim dos anos 80 e ainda hoje não tem aplicação plena. Amanhã comemora-se o Dia da Língua Portuguesa e da Cultura e a 13 de Maio passam dez anos da efectiva entrada em vigor do AO, mas pouco há para comemorar.
Além da proposta brasileira, esta semana, o secretário executivo da CPLP em deslocação a Luanda reuniu-se com a ministra da Educação de Angola para discutir o acordo. Questionada pelo Expresso, a CPLP não esclareceu o conteúdo da reunião. Sabe-se, contudo, que Angola, juntamente com Moçambique, nunca ratificou o AO, mantendo muitas reticências à sua aplicação. Mas, mesmo quanto aos países que o terão ratificado, como São Tomé e Príncipe, o cumprimento prático do AO é questionável.
(São Tomé e Príncipe está-se nas tintas para o AO90. A língua dominante é o Francês.)
Tudo começou em Janeiro de 1990, quando Pedro Santana Lopes foi nomeado secretário de Estado da Cultura por Cavaco Silva com duas incumbências fundamentais: concluir o Centro Cultural de Belém e fazer o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Em apenas uma semana daquele ano, delegações dos sete Estados — Portugal, Brasil, Cabo Verde, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe — aprovaram os contornos do AO na Academia de Ciências em Lisboa. Em Maio de 1991, o tratado foi aprovado pelo Parlamento português, com votos favoráveis do PSD, CDS; o PS dividiu-se e o PCP absteve-se; e o então Presidente, Mário Soares, ratificou a decisão.
O primeiro protocolo modificativo surgiu em 1998 e o sentido originário do AO começou a ruir, com a supressão da exigência da entrada em vigor simultânea nos sete Estados subscritores. A AR aprovou as alterações e Jorge Sampaio ratificou-as em 2000. Em 2004, os chefes de Estado e de Governo da CPLP decidiram que, passados 24 anos da assinatura formal, era melhor era baixar a fasquia, tendo em conta que o acordo ainda não havia entrado em vigor por não ter sido ratificado por todas as partes contratantes. Assim, para vigorar, o AO necessitaria “apenas” que três Estados depositassem a ratificação no Ministério dos Negócios Estrangeiros português. Mas continua por esclarecer se tal critério foi cumprido e, se foi, se não está manchado por alguma ilegalidade processual.
A ratificação expressa aconteceu apenas em Portugal e Cabo Verde. São Tomé terá finalizado o processo de ratificação em 2006, mas não é conhecido o depósito da ratificação. Questionado pelo Expresso, o MNE português afirma apenas que o AO “encontra-se em vigor em Portugal e também no Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe”. E que “Guiné-Bissau e Timor-Leste terminaram os respectivos processos internos de aprovação, embora ainda não tenham procedido ao depósito”.
(O kapo de serviço tem um discurso chapa 5, onde a mentira impera. Além de estar a prestar um péssimo serviço a Portugal está a enganar os Portugueses).
No Brasil, os problemas vêm de trás. O Congresso aprovou o tratado inicial em 1995, que não foi promulgado pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso. Em 2008, o “Diário Oficial” — equivalente do “Diário da República” — referia que quaisquer alterações ao AO teriam de ser alvo de intervenção do Congresso, mas o protocolo modificativo de 2004 só terá sido promulgado em 2008 por Lula da Silva sem discussão prévia na Câmara.
Christiana Martins
NOTA: transcrição integral de notícia e “caixa” publicadas no Expresso de 04 de Maio de 2019. Texto convertido para Português.
Fonte:
Um delicioso e escorreito texto em Bom Português de A M Pires Cabral, publicado no Facebook.
Sou das que tenho o dedo no ar.
Acordistas, aprendam, em Bom Português...
Texto de A M Pires Cabral
«Em 2011 publiquei na imprensa regional a crónica infra. Hoje calhou emergir lá das insondáveis profundezas do computador. Reli-a. Achei-lhe alguma piada. E republico-a, sacudido o pó de 7 anos, em fé de que não me rendi nem me renderei jamais ao AO90. Quem concorda comigo e também se recusa à rendição, que ponha o dedo no ar.
A SEMIRRETA
O “Expresso”, um dos primeiros jornais portugueses a avalizar a vergonhosa almoeda da nossa língua, adoptando pressurosamente o assim-chamado Acordo Ortográfico, distribuiu há tempos um cadernozinho dedicado ao enxalmo. Folheando-o em busca de um norte para o uso do hífen, descobri coisas mirabolantes. Descobri por exemplo que se deve escrever ‘bem-falante’ e ‘bem-visto’, mas ‘benfazejo’ e ‘benfeito’. Descobri que se deve escrever ‘cor de laranja’ (sem hífenes), mas ‘cor-de-rosa’ (com hífenes).
Procurava eu encontrar alguma réstia de lógica nisto, quando me cai debaixo dos olhos a palavra ‘semirreta’. Dou-lhes a minha palavra de honra: poucas vezes me tenho rido tanto como com o estafermo da ‘semirreta’. Entre gargalhadas quase espasmódicas, tive de pôr de lado a brochura, mas o riso continuou a visitar-me ao longo de todo o dia. Mesmo à noite, já à boca de dormir, lembrou-me outra vez a ‘semirreta’ e rompi a rir desabaladamente, causando não pequena perplexidade a minha Mulher, que, por contágio, acabou por rir também.
‘Semirreta’!
Aqueles fulanos nem as pensam. Geram assim mostrengos do calibre da ‘semirreta’ e não lhes dói a consciência nem lhes dá rebate o bom-senso nem o bom-gosto. De qualquer modo estou-lhes agradecido, pois, acabrunhado como ando com tantas más notícias e prenúncios de notícias ainda piores, proporcionaram-me um dia de desopilação do fígado por interposta ‘semirreta’.
Mas estou se calhar a ser injusto. Não se ouvem já por todos os areópagos internacionais hossanas e bem-hajas pela unificação ortográfica do Português? Os participantes em fóruns e congressos dão graças a Deus porque já não ficam confundidos por em Portugal se escrever ‘actor’ e no Brasil ‘ator’. (Não obstante este grande e notável avanço, continua a haver quem não perceba por que é que em Portugal se escreve ‘receção’ e no Brasil ‘recepção’. Mas nada é perfeito, não é verdade? Lá chegaremos.)
Mas não se trata apenas de uma questão de prestígio internacional. A coisa tem também implicações económicas e financeiras. Consta mesmo que a Moody’s, a Fitch e a Standard and Poor’s ponderam já subir numa data de níveis (supõe-se que para o ansiado Triplo A: Ah! Ah! Ah!) a notação de Portugal, considerados os grandes benefícios para a redução do défice que se espera venham a resultar da aplicação do acordo.
Então, senhores acordo-cépticos: valeu ou não valeu a pena haver uns quantos sujeitos que queimaram as pestanas para nos dar de presente este primor do acordo?
E volta-me à ideia o enxovedo da ‘semirreta’. Céus! O que eles fizeram da «nossa portuguesa casta linguagem» de que falava, se não erro, Cruz e Silva!
A M Pires Cabral
(***) A palavrinha “semirreta”, lê-se “semirrêta”, e quem a ler “semirréta” estará a ler incorreCtamente. E então já serão duas patacoadas: a escrever e a pronunciar.
Luso Productions entrevista Francisco Miguel Valada
(Os excertos a negrito são da responsabilidade da autora deste Blogue).
Francisco Miguel Valada, nasceu no Porto, em 1972. É licenciado em Tradução pela ESTG do Instituto Politécnico de Leiria, pós-graduado em Interpretação de Conferência pela Universidade do Minho e mestre em Linguística e Estudos Literários pela Universidade Livre de Bruxelas (VUB).
Foi professor assistente na ESTG do Instituto Politécnico de Leiria. É Intérprete de Conferência de língua portuguesa, tendo exercido durante três anos como intérprete residente da cabina portuguesa do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias no Luxemburgo. Exerce actualmente em regime de profissão liberal, domiciliado em Bruxelas.
“Demanda, Deriva, Desastre – Os três dês do Acordo Ortográfico”, Alcochete/Leiria, Textiverso, 2009, foi a sua primeira publicação em formato livro, apresentada sucessivamente em Leiria, Porto, Lisboa, Bruxelas e Luxemburgo.
Nesta entrevista, fala-nos da forma como vê, ainda hoje, a questão controversa do Acordo Ortográfico.
LusoProductions - Em 2009 publicou a obra "Demanda, Deriva, Desastre - os Três Dês do Acordo Ortográfico", onde criticava duramente o AO. Mantém hoje a mesma posição?
Francisco Miguel Valada - Digamos que mantenho a mesma posição, mas tecnicamente ainda mais fundamentada, pois entretanto também aprendi mais. Infelizmente, agora tenho exemplos concretos para apresentar, em vez de meras hipóteses, de meras simulações, como em 2009, uma vez que – na óptica do poder político – o Acordo Ortográfico de 1990 está em vigor. Logo, há muito material à disposição, não só para confirmar o desastre, mas também para demonstrá-lo a todos em geral e aos catequistas da nova ortografia em particular.
LP - Considera que a aplicação do Acordo Ortográfico continua ainda hoje a levantar problemas e a apresentar fragilidades ou é hoje já consensual o seu uso?
FMV - Basta consultar o Diário da República, para se ter uma ideia bem clara do caos a que isto chegou. No Diário da República, há ‘fatos’, há ‘contatos’, há ‘contatar’, há ‘contatado’ e, pior, há gente que envia para lá textos a achar que assim é que está bem, há outros que por lá andam e não corrigem, porque acham que está bem assim, e temos ainda outros que são responsáveis por isto tudo e que assobiam para o ar. Mas não é só no Diário da República. Qualquer jornal que adopte o AO90… Ia falar-lhe do Expresso, mas deixe-me dar-lhe um exemplo da imprensa regional, tão importante e tão pouco falada. Num dos últimos números do diário “As Beiras”, podemos ler “elementos fatuais” em vez de “elementos factuais”, numa entrevista a um professor, por acaso, defensor do AO90. Um leitor desse diário, um incauto que ache que o AO90 é criação de gente preparada, sábia, conhecedora e insuspeita, encontra “elementos fatuais”, acha que é muito giro, acredita na imensa sabedoria de quem produziu tal aberração e vai reproduzi-la, publicitá-la, divulgá-la e se calhar até defendê-la.
Portanto, respondendo à sua pergunta, o uso não é consensual e ainda bem. Se fosse, teríamos uma autêntica calamidade, em vez de um desastre. Posso acrescentar que, tendo em conta a proliferação de ‘fatos’, ‘fatuais’ e ‘contatos’, qualquer dia corremos o risco de alguém considerar que estas grafias são as correctas em português europeu, devido à frequência de uso, e decidir adoptá-las em conformidade, em vez de dar o braço a torcer e acabar com esta coisa duma vez por todas.
LP - Como vê o facto de a maioria dos países da CPLP não estar a respeitar a aplicação do AO?
FMV - Devo confessar-lhe que não me interessa por aí além aquilo que outros fazem em termos de adopção do AO90. Aquilo que me preocupa é Portugal querer à força toda adoptar o AO90, independentemente da realidade. Preocupar-me-ia imenso que Portugal deixasse de adoptar o AO90 porque outros não adoptam, em vez de deixar de adoptar o AO90 pelo motivo mais natural de todos: porque é inadequado para a norma portuguesa europeia. Preocupar-me-ia, repito. Todavia, considerando um certo historial, não me admiraria nada que fosse esse o caminho. Mas tendo em conta que actualmente há indivíduos que votaram contra o AO90 e adoptam o AO90 (ou permitem que lhes alterem a grafia original, o que se calhar até é pior) em publicações onde até se lhes permite a aplicação da norma de 1945, creio que temos aqui um problema mais grave, mais profundo, que vai além da distracção crónica.
LP - Não lhe parece que a unificação ortográfica entre os países da CPLP poderia constituir um motivo de agregação e de consolidação da identidade da língua portuguesa, para além, claro, de ser facilitadora da comunicação?
FMV - Nessa entrevista de que há pouco falava, o autor do texto produziu grafias como ‘perspetiva’, ‘conceção’ e ‘aspetos’. Estas palavras foram criadas pelo AO90 exclusivamente para fora do Brasil. Em Portugal, tais grafias são adoptadas por quem quer respeitar o AO90, mas são desconhecidas no Brasil, onde se mantêm a ‘perspectiva’, a ‘concepção’ e os ‘aspectos’. Se procura unificação ortográfica, recomendo-lhe que tente noutro sítio. Respondendo à sua pergunta: com este Acordo Ortográfico de 1990, tal fito é impossível. Andaram a vender essa ideia aos políticos que a aceitaram, a assinaram de cruz e andaram a pregá-la. Além disso, mesmo que tal objectivo fosse possível, seria indesejável, uma vez que perturba a qualidade ortográfica do português europeu. A procura dessa agregação e dessa consolidação só trouxe caos e confusão. A identidade da língua de que fala é constituída pelos hábitos linguísticos dos falantes dessa língua. Ora, o português dos falantes de cada um dos países com língua oficial portuguesa é necessariamente diferente e é um mundo interessante que deve ser estudado e explorado.
LP - Tendo em conta que os alunos nas escolas já aprendem a ler e a escrever segundo as regras do AO, julga que ainda seria possível reverter a aplicação do AO?
FMV - Uma professora de Português, defensora do AO90, formadora do AO90 e com responsabilidades associativas, disse publicamente há uns tempos que a palavra Egipto podia ser grafada com ou sem pê. Basta ler o AO90 (etapa essencial para se pronunciar sobre ele com alguma, digamos, dignidade) para perceber que esta afirmação é uma falsidade e a sua divulgação um perigo. Tendo em conta a qualidade do ensino do AO90, perfeitamente patente na resposta desta formadora, professora, etc., é pelo menos desejável que se deixe de ensinar o AO90. Se é possível voltar atrás? Claro que é possível.
Quanto a esse argumento, deixe-me fazer-lhe uma sugestão: pergunte a quem, actualmente, ao que parece, se preocupa com as crianças que aprenderam as regras do AO90 – e que, coitadinhas, agora vai ser um problema se tiverem de aprender as regras de 1945 – onde estava no momento em que o AO90 começou a ser ensinado nas escolas a crianças que tinham aprendido as regras de 1945. Nessa altura, ouviu ou leu as preocupações dessas pessoas com as desgraçadas das crianças que tinham aprendido as regras de 1945 e que agora eram obrigadas a aprender as regras de 1990? Já para não falar nos desgraçados dos adultos, mas não quero fugir à sua pergunta. É claro que não encontrará qualquer vestígio de preocupação dessas pessoas com esses alunos, porque esse argumento dos pobres dos alunos, coitados dos alunos, desgraçados dos alunos é servido instrumentalmente, num mero exercício retórico, tentando-se (e muitas vezes conseguindo-se) validar emotivamente aquilo que foi chumbado tecnicamente. No entanto, admito que é mais fácil aduzir argumentos desses do que estudar a matéria em apreço. Aliás a adução (com ‘u’, veja lá, não se engane, não escreva ‘adopção’ sem pê) de argumentos desses dispensa a leitura seja do que for. Não recomendo.
Fonte:
https://www.luso.eu/entrevistas/1554-francisco-e-a-questao-controversa-do-acordo-ortografico.html
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