«O Acordo Ortográfico está a criar imensa confusão e novos erros, como a troca de “recessão” por “receção” ou de “conceção” por “concessão”. Também no Diário da República tiram consoantes a mais, como “união de facto” que lá aparece “união de fato”. O acordo tinha o argumento político e económico, mas só três países é que o aplicam e a circulação de livros entre o Brasil e Portugal não ocorreu.
É complicado voltar atrás e recompor livros e manuais escolares, mas antes mudar do que perpetuar alguns erros. As línguas devem ser deixadas em paz e o Brasil fará sempre o que bem lhe apetecer com a criatividade que tem em relação à língua.»
Luísa Schmidt, Socióloga
«Os defensores do Acordo Ortográfico de 1990 recorrem a um argumento de uniformidade que é simplesmente aporético. Essa uniformidade nunca existirá. Nenhum decreto poderá travar a progressiva diversidade inerente a uma língua partilhada por tantas culturas diferentes. Essa diversidade é um facto. E não tem de ser vista como um factor de separação ou empobrecimento; bem pelo contrário, é algo que enriquece a língua — e nos enriquece a todos.»
Rosa Maria Martelo, Escritora e professora da Faculdade de Letras do Porto
«Uma língua não é do Estado, uma língua é de uma nação. O caso do português, é de mais do que uma nação, estamos a falar da 5.ª língua nativa do mundo. E o que nós temos neste momento é uma desordem ortográfica imprópria de uma língua destas. Acho que ainda estamos a tempo de impedir este equívoco e de não sermos meros “espetadores”, quer dizer, “espectadores”.»
Bagão Félix, Político e economista
O nosso escrito do mês de Setembro contém, tal como o anterior, três citações.
A primeira delas aborda uma questão do maior interesse. Ao contrário do que foi afirmado pelos seus defensores, o Acordo Ortográfico de 1990 interferiu com a pronúncia. Com a remoção das consoantes ditas mudas, o falante tem tendência para fechar a vogal anterior, átona, como era expectável. É assaz curioso, para não dizer outra coisa, que Malaca Casteleiro, a par de Houäiss e Bechara, um dos pais do Acordo Ortográfico de 1990, tenha manifestado a sua preocupação com o fechamento das vogais no português europeu quando esse acordo contribui decisivamente para essa situação. Esta citação rebate ainda o argumento dos custos, usado para manter o AO90 em vigor. Os custos serão exactamente iguais aos da aplicação do acordo, custos esses que nunca foram contabilizados.
A segunda citação contraria a tese da uniformidade ou da aproximação entre as variantes das línguas. Se elas se vêm afastando há séculos, por que carga de água haveriam de se aproximar agora. Por decreto?
A última citação trata do caos ortográfico, que também é ilustrado pelas imagens que acompanham este escrito, exemplificativas das ortografias com que convivemos hoje: a de 1945, que se mantêm mesmo em órgãos que aplicam o acordo, a do AO90 e uma terceira onde cabe tudo, inclusive as maiores barbaridades.
Repare, agora, o leitor, baseando-nos num texto de José Carlos Fernandes, publicado no jornal Observador, nos procedimentos de duas línguas pouco dadas a malaquices, perdão, maluquices.
No inglês, no século XVII, com base nos étimos latinos foram reintroduzidas inúmeras consoantes, como, por exemplo: aventure passou a escrever-se adventure; dette passou a debt; doute tornou-se doubt; iland ganhou um “s” e ficou island; perfet recebeu um “c” e transformou-se em perfect; receit tornou-se receipt e verdit deu lugar a verdict. Repare o leitor que este último termo em português consta como sendo um dos casos de dupla grafia: veredito e veredicto. Não consta que as crianças inglesas tenham mais dificuldades por terem de escrever grafemas que não são pronunciados, como acontece em island.
No francês, se aparecesse a ideia peregrina de privilegiar o critério da pronúncia, a palavra femme escrever-se-ia fame; fille, fie; endroit, andruá; et, ê; voilá, vualá; salut, saliu; bisou, bisu; pendre, pandre. Isto permitiria, na perspectiva do jornal Expresso, uma considerável poupança.
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