Sexta-feira, 5 de Junho de 2020

Portugal não é território brasileiro, tal como o Brasil já foi (mas já não é) território português, para termos de aceitar uma grafia que não nos pertence

 

Respondendo a um comentário que me deixou perplexa, pelo desaforo…

 

Walnice Nogueira Galvão.jpg

 

Comentário no post AO90: o maior erro histórico desde a fundação de Portugal, em 1139

 

Ficar de braços cruzados e ficar a destilar veneno na internet não adianta. Já se passaram dez anos e nada de Portugal voltar atrás com o AO90.O mundo está mudando e precisamos encontrar uma forma genérica para as duas variantes é uma desvantagem continuarmos assim no mercado de softwares. A maioria dos estrangeiros procuram o português brasileiro para aprender a falar. Os padres jesuítas que adaptaram o idioma depois que Marques de Pombal proibiu a pronunciação de qualquer outro idioma que não fosse o português. E anos mais tarde Getúlio Vargas proibiu que os imigrantes europeus e asiáticos famintos, depois da segunda grande guerra, falassem outro idioma além do português.Lembre-se: a língua é um organismo vivo em constante mudanças.

Laura Borelli Cabral 

 

***

Cara Laura Borelli Cabral,

 

Agradeço este seu comentário, porque me dá oportunidade de esclarecer o que não está claro para si.

 

Diz a Laura: «Ficar de braços cruzados e ficar a destilar veneno na internet não adianta».

 

Neste ponto quem pede esclarecimentos sou eu: quem “fica de braços cruzados”, e quem “fica a destilar veneno”??????

 

Diz a Laura: «Já se passaram dez anos e nada de Portugal voltar atrás com o AO90

 

Quer que eu lhe responda? Porque Portugal não tem gente suficientemente corajosa e lúcida para reconhecer o gravíssimo erro que foi embarcar na canoa furada que o Brasil lhe pôs à porta, e porque os políticos portugueses, tal como os políticos brasileiros, sofrem de um complexo de inferioridade tal, se bem que por motivos diferentes, que uns acham que têm de esmagar o ex-colonizador, através da Língua; os outros acham que como os ex-colonizados são milhões, a escrever uma língua que eles acham que é portuguesa, há que ser subserviente ao “gigante”.

 

E isto só diz da pequenez de espírito dos que assim pensam.

 

Diz a Laura: «O mundo está mudando e precisamos encontrar uma forma genérica para as duas variantes é uma desvantagem continuarmos assim no mercado de softwares».

 

De que “duas” VARIANTES está a falar a Laura? Uma variante eu sei que é o DIALECTO (= variante de uma língua que apresenta particularidades fonéticas, lexicais, morfológicas, sintácticas) BRASILEIRO, que é uma variante da Língua Portuguesa. Chegados aqui, qual é a outra variante? Que eu saiba, todos os outros países da CPLP mantiveram a Língua Portuguesa intacta, e foram enriquecendo-a com os próprios regionalismos. Qual o problema no mercado de software, se a língua do mercado do software é a INGLESA? Pretendem que digamos à brasileira “mercado logiciário ou mercado de suporte lógico”?  Mil vezes o anglicismo, porque a linguagem técnica não é traduzível, assim como não são traduzíveis os nomes próprios.  Ninguém diz João Lenão. Sabe quem é? Um cantor, dos mais badalados, já falecido, fundador da Banda mais famosa do mundo, cujo nome traduzido é um horror linguístico.

 

Diz a Laura: «A maioria dos estrangeiros procuram o português brasileiro para aprender a falar

 

A maioria dos estrangeiros procura (não procuram; consegue ver a diferença?) o português brasileiro (= dialecto brasileiro) para FALAR, comunicar, porém, quando querem aprender o IDIOMA PORTUGUÊS não é o “brasileiro” que eles procuram, mas sim o PORTUGUÊS, o original, o europeu, o que é da grande família indo-europeia. E isto é um facto, não é uma ideia. Contudo, agora, vêm-se aflitos por causa do mal-amanhado acordês. A Língua Portuguesa, tal como está, será uma Língua para esquecer. E isto é um facto. Não, uma ideia.

 

Diz a Laura: «Os padres jesuítas que adaptaram o idioma depois que Marques de Pombal proibiu a pronunciação de qualquer outro idioma que não fosse o português».


E o Marquês de Pombal estava no seu direito, uma vez que o Brasil, naquela época, era território português e em território português fala-se a Língua oficial, ou seja, o PORTUGUÊS. Com toda a lógica. E os padres jesuítas também fizeram bem em adaptar a Língua, uma vez que o objectivo deles era evangelizar, e não se pode evangelizar numa Língua que os indígenas não conhecem. E isto faz parte da História da época. Quer se goste, ou não se goste.

 

Ora acontece que, hoje, o Brasil é um país independente e Portugal NÃO É território brasileiro. Então, por alma de quem é que os PORTUGUESES têm de grafar à brasileira, se os brasileiros se recusaram a grafar à portuguesa?  Por serem milhões? A quantidade jamais foi bitola para esmagar a qualidade. Muito pelo contrário: quanto maior a quantidade, menor a qualidade. Isto acontece em tudo.   

 

Dia a Laura: « E anos mais tarde Getúlio Vargas proibiu que os imigrantes europeus e asiáticos famintos, depois da segunda grande guerra, falassem outro idioma além do português


E Getúlio Vargas fez muito bem em proibir as “outras falas” que não a brasileira. Se assim não fosse o Brasil viraria uma BABEL. E não sei se sabe que para se ter uma determinada NACIONALIDADE um dos requisitos é saber falar a língua do país, e em Portugal, fala-se Português, não, Brasileiro.

 

E por fim a Laura diz algo muito estranho: «Lembre-se: a língua é um organismo vivo em constante mudanças

 

É verdade que a Língua é um organismo vivo em constantes mudanças (plural). Mas não é verdade que nessas constantes mudanças a Língua tenha de sofrer mutilações e reduzir-se ao dialecto (= variante) de uma ex-colónia.

As mudanças sempre se fizeram com fito no AVANÇO, não, no RECUO.
E o AO90, impingido a Portugal ilegalmente, constitui um monumental recuo, um retrocesso único no mundo: fazer regressar uma Língua, que deixou de ser um dialecto do Latim, para se tornar numa Língua Independente e Íntegra, a um dialecto oriundo dessa mesma Língua, que uma ex-colónia adoptou, com a agravante de se ter tornado numa “coisa” que nem é português, nem brasileiro; mas simplesmente numa mixórdia ortográfica que põe Portugal fora da família linguística indo-europeia.


E isto não é algo que os Portugueses dotados de espinha dorsal possam aceitar de ânimo leve.



Daí que, cara Laura Borelli Cabral, não venha para aqui tentar que atiremos fora a Cultura de um dos países mais antigos da Europa, que tem uma das também mais antigas Línguas da Europa, só por causa da desvantagem no mercado do software, que não é por acaso que se serve da Língua Inglesa para comunicar. Ou os Brasileiros não são capazes de escrever em Inglês, os vocábulos próprios da tecnologia informática, por terem muitas consoantes não-pronunciáveis, e querem reduzi-la ao básico e traduzi-la inabilmente?

 

Isabel A. Ferreira

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 16:47

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comentários:
De Sarin a 5 de Junho de 2020 às 19:32
Boa tarde, Isabel.
Li o comentário e não o entendi assim ofensivo, mas reconheço que as sensibilidades são distintas.
Não sei a que galicismos a Isabel se refere; parece-me que, e atendendo à motivação invocada para o AO90, serão antes anglicismos. Desnecessários, uma vez que muito poucos são específicos da área informática.
Surpreendeu-me ler-lhe o "jogar fora" sem itálico, pelo que presumo ter sido usado natural e inconscientemente - o que é de estranhar em quem defende a Língua Portuguesa contra uma eventual colonização pelo dialecto brasileiro. Porque não deitar fora ou descartar? Contrariamente à Isabel, nada tenho contra as variantes do Português e acho que cabem todas nesta nossa Língua que volta e meia é aviltada por portugueses com acordos estranhos. Por portugueses, Isabel, pois foram portugueses que assinaram e ratificaram o AO90 - e ninguém lhes impôs fosse o que fosse.

"Ou os Brasileiros não são capazes de escrever em Inglês, os vocábulos próprios da tecnologia informática, por ter muitas consoantes não-pronunciáveis, e querem reduzi-la ao básico e traduzi-la inabilmente?"
Isto, sim, é um desaforo, Isabel! Porquê generalizar quando sabemos que, também lá, muitos discordam desta solução? E porque não traduzir o que for traduzível? Cf. escrevi acima, muito poucos vocábulos do jargão são neologismos. Já agora, e uma vez que é tão zelosa na correcção de gralhas, reveja a frase - ou os artigos concordam com o Inglês, ou muda para Língua Inglesa ;)
Cumprimentos
De Isabel A. Ferreira a 5 de Junho de 2020 às 20:13
Boa tarde Sarin,
Agradeço o seu comentário e as suas pertinentes correcções. A pressa é inimiga da perfeição, e eis a prova provada. Fico-lhe muito grata. Muito obrigada.

Corrigidas as faltas (o jogar fora é um eco brasileiro – como sabe, aprendi a ler e a escrever no Brasil, e há coisas que ficam e ainda não se foram), mas prefiro ATIRAR fora do que deitar fora ou descartar). E sim, queria dizer anglicismos. Gralhas corrigidas.

Não sei de onde tirou que sou CONTRA as variantes. Não sou nada contra as variantes.
O que sou é CONTRA transformar a Língua Portuguesa numa variante dela própria, e obrigarem-nos a aplicá-la.

As variantes enriquecem a Língua Mãe. A Língua Mãe não pode jamais ser uma variante dela própria. Não sei se me fiz entender. E é isto que não aceito.

Foram portugueses que assinaram o acordo e todos os outros da CPLP. Só os parvos dos portugueses é que o aplicam. E aqui aproveito para dizer-lhe quando se fala em brasileiros ou portugueses não significa que se generalize. É óbvio que há excepções. É óbvio que nem a todos cabe a carapuça. E também é óbvio que quando se diz que os portugueses são um povo amorfo, eu não me melindro, porque não é de mim que se fala, porque não me encaixo nos amorfos. Simplesmente isto.

Por que não traduzir o que é traduzível? Sim, mas falo de termos técnicos, que são difíceis de traduzir, e são UNIVERSAIS. Fala-se em software e em todo o mundo se sabe o que isso é. Não é preciso traduzir, criando abortinhos ortográficos de fugir.

Continuação de uma boa tarde, e uma vez mais, muito obrigada.

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