«Sou adepta de “acêntos”, “hí-fenes” e “trëmas”.
A nova ortografia não me representa.
A resistência é um dever.»
Rita Lee, cantora brasileira
«Que grande compreensão tem esta gente das regras do Acordo Ortográfico de 1990... Nem com mais vinte anos em cima vão dominar a nova ortografia. E isto com jornalistas, imagine-se agora com o falante comum.»
Helder Guégués, tradutor e revisor, 19-04-2023, no blogue O Linguagista
«Raios partam o Acordo e quem nada faz para o reverter! Raios partam os políticos que fazem proclamações de amor infinito à língua portuguesa e a maltratam todos os dias, e não piam quanto ao acordo cacográfico. A integridade linguística é prova de carácter, com "c" antes do "t"!»
Maria Rueff, com texto de Manuel Monteiro na TSF
A par de fatos, que não são para vestir, como se observou no escrito do mês de Abril, os contatos são a segunda marca indelével do AO90. Só a sua aparição e proliferação seria razão suficiente, como escreve Manuel Monteiro, para pôr cobro à sua aplicação. Acrescem ainda, entre outras, o fracasso da unificação e as frequentes incoerências.
Voltemos de novo aos contatos. Uma breve incursão por alguns órgãos de Comunicação Social traz-nos, entre outras pérolas:
1. «Com cerca de cem membros e mais de cinquenta pontos de contato, como é referido na sua página da Internet, esta organização reúne outras de todo o mundo, por forma a melhor combater a corrupção no desporto.»
Vítor Rosa, A Bola, 31-03-2023
2. «Depois de João Galamba ter, em conferência de imprensa no sábado, confirmado a tentativa de entrar em contato com Costa- “Estava, penso que a conduzir, e não atendeu”.»
Expresso, 01-05-2023
3. «Na sua mensagem de abertura da assembleia plenária da Conferência Episcopal Portuguesa, que se realiza esta semana, Ornelas revelou que este grupo deverá ter a “autonomia necessária para acolher e acompanhar as vítimas” e “assegurar o necessário apoio e a possível recuperação dos danos por estas sofridos”, dispondo de uma linha de atendimento e de “condições para o contato e acompanhamento pessoal».
Expresso, 17-04-23
4. «Até há pouco tempo, publicar um livro exigia do autor muito mais do que a já hercúlea habilidade de parir universos inteiros com as próprias mãos: sem oceanos de suor, alguma sorte e uma bela rede de contatos que garantisse os olhos de uma editora sobre o seu original, dificilmente o sucesso lhe bateria à porta.»
Observador, 11-04-2023
5. «O predador sexual, que já tinha sido condenado anteriormente por agressão, exposição indecente, indecência grosseira com crianças e crueldade animal, e que foi descrito pelo procurador como: «uma "suposta transgénero" que usou essa vertente de personalidade para ‘entrar em contato com pessoas vulneráveis’», aproveitou-se das políticas identitárias e mascarou-se com uma peruca, maquilhagem e soutiens com enchimento para se declarar mulher, ser preso na cela delas e continuar a violá-las.»
Sol, 30-03-2023
6. «Governo diz que CM de Setúbal não quis celebrar um protocolo com o Alto Comissariado para as Migrações.
Ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes, diz que a Câmara Municipal de Setúbal tem fugido aos contatos e a essa formalização de uma parceria com o Alto Comissariado.»
Observador, 10-05-2022
7. «Isabel Lima, professora de português do Colégio, diz que a atividade foi enriquecedora e que “o contato com o espaço físico é diferente da percepção que se tem dentro da sala de aula”. Para a docente, vivências como estas permitem que os jovens fiquem mais atentos às notícias e à desinformação.»
JN, 20-02-2023
8. «Este contato com os autarcas, e as autarquias, é muito importante. Tendo em conta que dos 10 municípios a visitar apenas 3 têm gestão social-democrata, há muito para aprender e, eventualmente, replicar as boas práticas.»
Manuel Portugal Lage, DN, 17-04-2023
9. «Acabei de entrar em contato com o comandante de uma das brigadas que defendem a cidade. Posso afirmar com confiança que as forças de defesa ucranianas controlam uma percentagem muito maior do território de Bakhmut", disse o porta-voz das forças ucranianas em declarações à CNN International.»
DN, 11-04-2023
10. «Verstappen defendeu que Lewis Hamilton não seguiu as regras da corrida ao ultrapassá-lo na primeira volta. "Da minha parte, apenas tentei evitar o contato, está bem claro nas regras o que é permitido fazer agora do lado de fora, mas claramente não é seguido", disse.”»
DN, 01-04-2023
O que acha desta pequena colecção, caro eleitor? Será isto um não-assunto, como dizem alguns que se julgam entendidos também em Linguística? Justifica-se que os responsáveis teçam rasgados elogios à língua no Dia Mundial da Língua Portuguesa e continuem a assobiar para o lado no resto do ano?
Ah, e como escrevemos em Abril, o nome dos meses, quando se refere uma efeméride ou um acontecimento histórico, deve ser grafado com maiúscula. Sempre!
João Esperança Barroca
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Uma vez que pergunta, caro João Esperança Barroca, e sendo eu sua leitora, digo-lhe que esta pequena colecção de contatos diz de um servilismo absolutamente bacoco, a juntar a uma ignorância optativa e ao DESPREZO que o presidente da República, o (des) governo português e os deputados da Nação (salvaguardando as raras excepções que pugnam pela NOSSA Língua Portuguesa), votam a Portugal, insultando os Portugueses Pensantes com essa atitude servil , anti-democrática [com hifene], ditatorial, ilegal e inconstitucional. E isto só acontece porque vivemos numa República DOS Bananas.
Isabel A. Ferreira
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«Para cúmulo da infelicidade, veio o Acordo Ortográfico de 1990 (AO90), de muito discutíveis méritos intrometer-se neste cenário. Trata-se de um produto mal-enjorcado, elaborado em cima do joelho, rejeitado por todas as entidades então consultadas.
[…] Daí que para nós, portugueses, seja tremendamente frustrante tentar convencer um brasileiro de que, na nossa fala, soam diferentes “coação” e “coacção”, “corretor” e “corrector”, “andamos” e “andámos”, “para” e “pára” e outros pares. O português europeu dispõe, na realidade, de mais sons distintivos, contrastivos, do que o brasileiro. Pois bem: tudo isso é negado, trucidado, por um Acordo tecnicamente inapresentável...»
Fernando Venâncio, linguista e escritor em O Português à Descoberta do Brasileiro
«Para baralhar ainda mais as almas, uma série de iluminados universitários, políticos decadentes e editoras que descobriram uma mina de ouro criou um Acordo Ortográfico que Portugal usa orgulhosamente só, enquanto cada ramo do português vai fazendo o seu caminho. No meio do caos todos os governantes assobiam para o ar.»
Fernando Sobral, jornalista, em 22 de Fevereiro no Jornal Económico
«Eu acho que esse acordo [ortográfico] foi mais uma “bobajada” dessas feitas ninguém sabe direito porquê nem para quê. Tiraram alguns acentos importantes […], então ainda acontecem frases que ficam ambíguas. Você não sabe se o “para” é preposição ou do verbo parar. Essas reformas, na minha opinião, significam pouco. Como escritora, zero, porque continuo escrevendo do modo que escrevia […].»
Lya Luft, escritora e tradutora brasileira
Quis o acaso que as duas citações que encimam o artigo deste mês de Abril (que, mesmo usando o nefasto AO90, deve ser grafado com maiúscula quando se refere ao 25 de Abril) se iniciasse com a preposição para. Com a aplicação do AO90, como estipula o ponto 9.º da Base IX: «Prescinde-se, quer do acento agudo, quer do circunflexo, para distinguir palavras paroxítonas que, tendo respectivamente vogal tónica / tônica aberta ou fechada, são homógrafas de palavras proclíticas. Assim, deixam de se distinguir pelo acento gráfico: para (á), flexão de parar, e para, preposição; […]
Exactamente. Deixam de se distinguir. E aqui o texto do AO90 foi algo premonitório. Dando uma rápida vista de olhos por alguns jornais (digitais) dos últimos tempos, tropeçamos e respigamos títulos ou frases como: Quem pára Mbappé? (A Bola, 22/03/22); Bagaço a mais pára lagares no Alentejo (Correio da Manhã, 17/12/21); Magnus Andersson pára o jogo (O Jogo, 18/11/21); Simeone pára o treino do Atlético Madrid… (Record, 11/08/21); Travante Williams pára seis semanas (A Bola, 19/03/22); Condutor de carrinha com seis ucranianos não pára na fronteira da Roménia (Correio da Manhã, 17/03/22); Florian Wirtz pára sete meses (Record, 14/03/22); José Mourinho não pára de me surpreender (A Bola, 18/03/22); Renato Sanches pára três semanas por lesão (Record, 12/03/22); Dário Essugo: o clone de Palhinha que não pára de fazer história (Record, 06/03/22); O guarda-redes do Benfica pára um remate perigosíssimo de longe (Record, 06/03/22); Elina Svitolina escreve emocionada carta à Ucrânia: O meu coração não pára de sangrar.” (Record, 27/02/22); Na casa gilista o trabalho não pára (A Bola, 22/03/22); É certo que o campeonato agora pára (A Bola, 22/03/22); Brest não sabe onde pára o argelino (A Bola, 01/04/22); Alto e pára o carro! (Nascer do Sol, 02/04/22). Que fizeram os jornalistas na redacção de todas estas notícias? Mandaram, adrede (olá, Manuel Monteiro!), o AO90 às urtigas e optaram pela grafia que torna todas estas frases inteligíveis. Isto é: errando, acertam.
Mas o COEC (Caos Ortográfico Em Curso) presenteia-nos ainda amiúde com pérolas como: Kaio Jorge para 4 semanas (A Bola, 23/08/21); Ritual indonésio para a chuva (Record, 20/03/22); O onze do Sporting para o jogo com o Marítimo (Record, 26/02/22); Conceição para a história (Record, 29/03/22). Aqui, os jornalistas seguiram à risca o AO90 e criaram frases dúbias. Kaio Jorge pára 4 semanas ou está apto durante esse período de tempo? O ritual indonésio é para que chova ou para que pare de chover? O onze do Sporting decide parar o jogo ou é o que está escalado para esse jogo? Conceição pára a história ou entra nela?
Quando confrontados com estas e outras aberrações como as que se seguem: para-brisas; para-choque; para-chuva; para-águas; para-fogo; para-vento; paraquedas; para-arranca, os acordistas assobiam para o lado ou remetem-se ao silêncio. O silêncio dos coniventes.
João Esperança Barroca
TRAVANTE WILLIAMS PÁRA SEIS SEMANAS
BASQUETEBOL 19-03-2022 14:25
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