Segunda-feira, 8 de Abril de 2024

Em Defesa da Ortografia (LXVII), por João Esperança Barroca

 

«Eu sou contra o Acordo Ortográfico. Por isso, até me prenderem ou me darem cacetadas, escrevo em português antigo. E mesmo depois de prenderem e de me darem cacetadas.»

 

Nuno Markl, Humorista, locutor e escritor

 

«O acordo ortográfico é uma merda. A Academia [Brasileira de Letras] é uma excrescência de velhos tempos

 

Millôr Fernandes, Humorista e escritor brasileiro

 

«A confusão entre gramática e convenção leva a muitos enganos — como defender o Acordo Ortográfico porque a língua muda (pois muda, mas a ortografia não tem de mudar à força) […]. O acordo ortográfico trouxe confusão à ortografia e, nesse ponto em particular, estamos pior do que estávamos há 10 ou 20 anos. É um dado objectivo, que pode ser atestado pelo número absurdo de “fatos” que aparecem no Diário da República.»

 

Marco Neves, Tradutor, escritor e professor universitário

 

 «Contrariamente ao muito que se diz por aí, as alterações que vão ser introduzidas são muito poucas e julgo que basta uma meia hora para os professores aprenderem as novas regras. E depois é aplicá-las.»

 

Paulo Feytor Pinto, presidente da Associação de Professores de Português (APP), 02-09-2009  Diário Digital.

 

Em escritos anteriores, temos chamado a atenção dos caros leitores para todo o tipo de aberrações que têm visto a luz do dia, à boleia do inadjectivável AO90. Não será por acaso, como já o dissemos anteriormente, que Millôr Fernandes, numa das citações em epígrafe, tenha optado por um substantivo em detrimento de um adjectivo quando o seu propósito era o de caracterizar negativamente o dito acordo.

 

Neste escrito de Março, a nossa pesquisa centrou-se essencialmente no termo contato, que a par de fato, é uma verdadeira pedra-de-toque da cacografia. Limitámos, desta vez, a nossa pesquisa a um único órgão de comunicação social, o jornal O Minho, contra o qual nada nos move. Apenas queremos, mais uma vez, denunciar o infindável sem-número de atropelos, decorrentes da aplicação do AO90. Acrescentamos ainda que a maior parte das citações e das imagens são relativamente recentes, comprovando que vieram para ficar. É ainda imperioso mencionar que este tipo de erros não existia antes da aplicação forçada do inaplicável AO90.

 

Vejamos, então, os resultados de uma breve pescaria numa tarde de fim-de-semana:

 

  1. «No dia da visita/teste à viatura o suspeito contata o legítimo proprietário, informando que não será ele a ver o veículo, mas sim outra pessoa, pedindo-lhe para não mencionar valores monetários. Após a visita efetuada, o suspeito informa o legítimo proprietário que quer comprar a viatura e que lhe irá efetuar uma transferência bancária, enviando-lhe um comprovativo de transferência bancária (não efetivada).» O Minho, 02-03-2024

 

  1. «“A ambição para o novo escritório de Braga não se limita às 100 pessoas que pretende contatar nos próximos 12 meses, tendo objetivos de crescimento para a cidade acima das 500 pessoas num horizonte de quatro anos”, referiu o comunicado, enviado às redações no mês de outubro de 2023.» O Minho, 23-02-2024

 

  1. «Os fundos esperam que os contatos para a venda comecem em breve, com o objetivo de finalizar a transação até (sic) o verão.

[…] As autoestradas geridas pela concessionária têm experimentado aumentos médios anuais no tráfego de 12% desde 2011, sendo impulsionadas pelo fato de servirem como uma alternativa ao congestionamento na VCI, no Porto.» O Minho, 22-02-2024

 

  1. «Para a distrital, esta é “uma forma diferente de fazer política, com o contato directo e permanente com as pessoas e garantindo que tudo será feito para ir além do resultado histórico nas próximas eleições, e levar André Ventura a ser o próximo Primeiro-Ministro de Portugal”. O Minho, 03-02-2024

 

  1. «Após vários contatos com diversas fontes, O MINHO sabe que tanto a comissão política distrital do Chega como a concelhia não confirmam Eduardo Teixeira a concorrer por aquele partido.» O Minho, 25-01-2024

 

  1. «“A ambição para o novo escritório de Braga não se limita às 100 pessoas que pretende contatar nos próximos 12 meses, tendo objetivos de crescimento para a cidade acima das 500 pessoas num horizonte de quatro anos”, refere o comunicado.» O Minho, 11-10-2023

    

  1. «Segundo a SIC Notícias, a jovem estava no festival pela Paz, que foi invadido pelas forças do grupo palestiniano no último sábado. A última vez que a mulher entrou em contato com a família foi ainda na sexta-feira. O Minho, 09-10-2023

 

  1. «O programa também alerta que entre as espécies de gelatinosos que ocorrem em Portugal, esta é a que exige maior cautela, devendo ser evitado qualquer contato com os seus tentáculos urticantes, capazes de provocar fortes queimaduras.» O Minho, 21-08-2023

 

Ah, repare na semelhança entre as citações números 2 e 6. O erro atrai o erro, não é?   Os revisores fazem falta, não é?

 

Ah, seguindo o conselho expresso na citação número 8, é de evitar o contacto com esses seres gelatinosos e com uma ortografia incoerente, ilógica, incongruente e desrespeitadora da sua etimologia.

 

Ah, quantas meias horas há em catorze anos?

 

Ah, além de se perceber que esta ortografia só pode ter tido origem em gente sem tacto, não podemos deixar de referir o fato que impulsiona aumentos de tráfego. Sabe o leitor onde se vendem tais fatos e semelhantes fatiotas? Que estes fatos custam caro, temos absoluta certeza!

 

João Esperança Barroca

 

J BARROCA 1.png

J BArroca 2.png

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 15:30

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Quinta-feira, 14 de Março de 2024

«Língua portuguesa e integração» ou uma aldrabice para enganar os estrangeiros?

 

Língua portuguesa e integração é o título de um artigo de opinião, da autoria do acordista Diogo Godinho, e publicado no passado dia 09 de Março, no Jornal “Observador”.

 

Diz o opinante que «O conhecimento e uso da língua portuguesa torna-se condição indispensável para a integração de cidadãos de origem estrangeira», o que é algo absolutamente correCto.

E acrescenta: «Conforme prevê a nossa Constituição, a língua oficial da República Portuguesa é o Português, sendo tarefa fundamental do Estado a sua defesa e a sua difusão (art.º 9º, al. f) e art.º 11º, nº3 da CRP). Porém, não bastando tal obviedade, o legislador português clarificou ainda explicitamente noutros diplomas legais que a língua portuguesa seria a língua usada nas tramitações administrativas e judiciais do Estado (cfr. arts.º 54º C.P. Administrativo; 133º C.P. Civil ; 92º, nº1 C.P. Penal).»



Neste último parágrafo é que a porca torce o rabo, porque a questão é:

1 - A que Português a Constituição da República Portuguesa (CRP) se refere?

 

A Constituição da República Portuguesa refere-se ao Português ainda em vigor em Portugal, através do Decreto 35.228, de 08 de Dezembro de 1945, que estabelece os princípios de fixação para a grafia da Língua Portuguesa, que entrou em vigor em 01 de Janeiro de 1946, e a qual ainda não foi revogada, por Lei alguma, e apenas uma LEI pode revogar outra Lei. Portanto, todos os que aplicam o chamado acordo ortográfico de 1990, desde o mais letrado ao mais ignorante, estão a infringir a Lei.

O próprio Estado Português, o próprio presidente da República Portuguesa, os governantes portugueses, os deputados da Nação, à excePção dos do Partido Comunista Português (PCP), que não se deixou deslumbrar pelo aceno dos milhões, estão a violar a Constituição da República Portuguesa, ao aplicarem um acordo ilegal e inconstitucional, segundo os pareceres, bem fundamentados juridicamente, de inúmeros juristas não-afectos ao regime, porque aos afectos ao regime, como os Profs. Jorge Miranda e Vital Moreira, parece-lhes que o AO90 é legal ainda que não ratificado, por todos os signatários, e, para tal, dão desculpas de mal pagador, que só convencem os ignorantes.

 

2 - Estará o Estado Português a cumprir a tarefa fundamental de defender e difundir o Português, de acordo com os artigos mencionados, no parágrafo referido mais acima?

Obviamente, NÃO está.

Neste artigo de Diogo Godinho, NÃO se fala da Língua Portuguesa, do Português, consignado na CRP. Fala-se do ACORDÊS, muitas vezes amixordizado, ou seja, a mistura da grafia portuguesa com a grafia brasileira, preconizada no mal engendrado AO90, que andam por aí a impingir aos estrangeiros, dizendo-lhes que é Português, enganando-os descaradamente. E isto devia ser tratado como crime.

 

E o que é mais estranho é o absurdo silêncio da Academia das Ciências de Lisboa (que ao que parece, actualmente, é uma mera serviçal da Academia Brasileira de Letras, pois é esta última que dá cartas nesta “Questão da Língua Portuguesa”, que ficará para a História, como o acto mais infame, mais vergonhoso, mais servil, mais idiota perpetrado por governantes portugueses do pós 25 de Abril, bem identificados, os quais, por mais incrível que possa parecer, permitiram que Portugal se transformasse no albergue dos medíocres, dos incompetentes, dos analfabetizados, dos que não querem saber, dos sem-brio, dos apátridas, dos acordistas que não conseguem PENSAR a Língua de Portugal!

 

AO90.png

Liberdade de sermos portugueses.png

Isabel A. Ferreira

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 17:45

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Terça-feira, 27 de Fevereiro de 2024

(...) «E a campanha eleitoral continua a ignorar a questão da imposição política 'criminosa' do indefensável AO90 a Portugal! Democracia isto?! Com os tiques da ditadura e da censura?!...»

 

Por Maria José Abranches

 

Anteontem, 25/02/2024, no "Público", um surpreendente artigo (ver abaixo) do notável constitucionalista Jorge Miranda: "O uso e o não uso da língua", fazendo a apologia do AO90 (aliás, para o autor "AO91")! Espantoso como a nossa 'elite' intelectual se permite exibir a sua ignorância, sempre que é a nossa língua que está em causa! 

 

Permito-me citar esta passagem, chamando a vossa atenção para o que assinalei a negrito

 

«No século XIX, em Portugal houve um projeto de alterações que, no entanto, não teve seguimento. Seria, após a proclamação da República, que se faria um decreto a estabelecê-las. Como foi uma decisão unilateral, dele resultaram graves desentendimentos com o Brasil, que naturalmente não poderia aceitar essa decisão.»

 

Comparem-se estas afirmações, com estas outras, com que se inicia o Anexo II- Nota explicativa do AO90:

 

  «A existência de duas ortografias oficiais da língua portuguesa, a lusitana e a brasileira, tem sido considerada como largamente prejudicial para a unidade intercontinental do português e para o seu prestígio no Mundo.

 

Tal situação remonta, como é sabido, a 1911, em que foi adoptada em Portugal a primeira grande reforma ortográfica, mas que não foi extensiva ao Brasil. [...] com o objectivo de se minimizarem os inconvenientes desta situação, foi aprovado em 1931 o primeiro acordo ortográfico entre Portugal e o Brasil. Todavia, por razões que não importa agora mencionar, este acordo não produziu, afinal, a tão desejada unificação dos dois sistemas ortográficos, (...)»


A existência de duas ortografias, a portuguesa e a brasileira, que já vem de muito longe, não tem a mínima importância. Mas sempre que se reacende o anseio pela 'unificação' ortográfica, lá vem a acusação usual: a culpa é de Portugal!

 

Qual o objectivo desta insistência em responsabilizar a reforma ortográfica portuguesa de 1911 pela existência de duas ortografias, ignorando voluntariamente a reforma ortográfica brasileira de 1907? E qual é o significado de Portugal aparecer sempre como 'obrigado' a sujeitar-se aos desejos do Brasil, por estar em falta?!

 

No meu comentário ao artigo de Jorge Miranda, já publicado, procurei fazer um rápido historial deste 'romance' ortográfico interminável. Recolhi o essencial da minha informação, sobre este longo e tortuoso processo, num artigo excepcional que encontrei na 'net' (ver abaixo), dum professor brasileiro, da Universidade de São Paulo, Maurício Silva, que vos peço que leiam com a atenção que merece a seriedade e a profundidade com que esta questão aqui é tratada. 

 

Parêntese: E a campanha eleitoral continua a ignorar a questão da imposição política 'criminosa' do indefensável AO90 a Portugal! Democracia isto?! Com os tiques da ditadura e da censura?!...

 

Os meus comentários, já publicados:


«Fundamental: estamos, com a introdução do AO90 no ensino, em 2011, a destruir o esforço feito nas últimas décadas, para combater o nosso vergonhoso analfabetismo (1960: 33,1%; 1970: 25,7%; 2001: 9,0%; 2011: 5,2%); 2021: 3,1%)! Recapitulando: 1907- Academia Brasileira de Letras (ABL) reforma, simplificando-a, a ortografia brasileira, para a aproximar da fonética; 1911 - uma Comissão de filólogos notáveis é responsável pela Reforma Ortográfica da língua de Portugal; 1915: ABL resolve aplicar a reforma portuguesa; 1919: ABL revoga a resolução de 1915; 1931: Acordo Ortográfico Luso-Brasileiro; 1940: acordo respeitado no Vocabulário Ortográfico, português, organizado por Rebelo Gonçalves; 1943: Brasil publica Formulário Ortográfico da Língua Portuguesa, que diverge em vários aspectos; cont.»


«(cont.) É este Formulário de 1943 que tem regido a ortografia brasileira; 1945: Acordo Ortográfico Luso-Brasileiro -- no Brasil aprovado pelo Decreto-lei 8.286, mas não aceite, a própria Constituição de 1946 aplicando a grafia de 1943, e a Assembleia Legislativa acabando por revogar o anterior decreto-lei, com um novo Decreto-lei 2.623, de 21.10.1955. Os anseios de unificação mantêm-se - Acordo de 1986, não aprovado e agora este AO90! Querem unificar o quê? A língua evoluiu de modo diferente em Portugal -- falada por todos e escrita, há séculos -- e no Brasil, língua oficial desde 1758, país gigantesco, com população diversa, e com cerca de 210 idiomas ainda falados no país. Querem unificar o quê? Ou querem mesmo destruir a nossa língua, que aqui nasceu e espalhámos pelo mundo?! Vergonha!»

 

O artigo referido:

 

"Reforma Ortográfica e nacionalismo linguístico no Brasil", Maurício Silva (USP)

http://www.filologia.org.br/revista/15/07.pdf

 

Maria José Abranches

 

Acreditem nisto.png

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 15:56

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Terça-feira, 22 de Fevereiro de 2022

A ilegalidade do AO90: «Ainda que usado pelo Estado e outros órgãos privados, o AO90 não está - do ponto de vista jurídico - em vigor em Portugal»

 

Língua Portuguesa.jpg

Texto publicado por Para Português Ler

Aqui:

https://www.facebook.com/ParaPortuguesLer/photos/a.661589607209479/4824267814274950/

 

Língua Portuguesa (1).PNG

 

15 de Fevereiro de 1911 – O Governo português cria a Comissão para o Estudo da Reforma Ortográfica de 1911.  

 
Até ao início do século XX, tanto em Portugal como no Brasil, seguia-se uma ortografia que, por regra, se baseava nos étimos latino ou grego para escrever cada palavra — phosphoro (fósforo), lyrio (lírio), orthographia (ortografia), phleugma (fleuma), exhausto (exausto), estylo (estilo), prompto (pronto), diphthongo (ditongo), psalmo (salmo), etc..


Ao longo dos tempos, diversos estudiosos da língua apresentaram sucessivas propostas de simplificação da escrita, sem grande êxito.


Imediatamente depois da Implantação da República em Portugal, o novo governo, empenhado no alargamento da escolaridade e no combate ao analfabetismo, nomeou uma comissão — constituída por Gonçalves Viana, Carolina Michaëlis, Cândido de Figueiredo, Adolfo Coelho, Leite de Vasconcelos, Gonçalves Guimarães, Ribeiro de Vasconcelos, Júlio Gonçalves Moreira, José Joaquim Nunes, Borges Grainha e Augusto Epifânio da Silva Dias — para estabelecer uma ortografia simplificada a usar nas publicações oficiais e no ensino. As bases da Reforma Ortográfica, muito inspiradas nas propostas de 1885, foram oficializadas por portaria de 1 de Setembro de 1911, permitindo-se um período de transição de três anos.


Apesar de já existir há longo tempo no Brasil uma forte corrente foneticista, que se batia pela simplificação ortográfica, o não envolvimento brasileiro na reforma portuguesa teve o efeito contrário, ficando os dois países com ortografias completamente diferentes: Portugal com uma ortografia reformada, o Brasil com a velha ortografia de base etimológica.



Em 1924 a Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras começaram a procurar uma ortografia comum, firmando-se um acordo preliminar em 1931 que praticamente adoptava a ortografia portuguesa de 1911, iniciando-se um longo processo de convergência das ortografias dos dois países que dura até hoje.


O Acordo Ortográfico de 1945 é uma convenção ortográfica assinada em Lisboa em 6 de Outubro de 1945 entre a Academia de Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras. Este acordo estabelece as bases da ortografia portuguesa para todos os territórios portugueses (que à data do acordo e até 1975 eram Portugal e as colónias portuguesas - na Ásia e África) e o Brasil, que seguia o Formulário Ortográfico de 1943.


Na tentativa de pôr cobro às profundas diferenças ortográficas entre Portugal e o Brasil, como resultado da adopção em Portugal da Reforma Ortográfica de 1911, tiveram lugar diversos encontros entre as Academias dos dois países, dos quais resultou um acordo preliminar assinado em 1931. No entanto, como os vocabulários que se publicaram, em 1940 (pela Academia das Ciências de Lisboa) e em 1943 (pela Academia Brasileira de Letras), continham ainda algumas divergências, houve necessidade de novas reuniões, em Lisboa, que deram origem ao Acordo Ortográfico de 1945.


O Acordo Ortográfico de 1990 — que propõe uma significativa redução das diferenças de grafia entre o português europeu e o português brasileiro —, tem como objectivo substituir inteiramente o Acordo Ortográfico de 1945. Do ponto de vista legal, em Portugal o Acordo Ortográfico de 1990, apesar de a portaria de 13 de Maio de 2009, onde se estabelece um período de transição de seis anos, durante o qual ambas as ortografias seriam válidas, não entrou em vigor. De acordo com a Constituição da República Portuguesa - artigo 112.º n.1 - só são actos legislativos Leis, Decretos-Lei e Decretos Legislativos Regionais. Ora ainda não foi produzida nenhuma Lei ou Decreto-Lei que vise implementar o AO90. Assim sendo, as Portarias e Resoluções dos Ministérios não têm força jurídica para revogar a ortografia vigente em Portugal que é a que consta do Acordo Ortográfico de 1945, uma vez que este produz efeitos com base num Decreto-Lei. Ainda que usado pelo Estado e outros órgãos privados, o AO90 não está - do ponto de vista jurídico - em vigor em Portugal.

 

AO90 Ilegal (1).PNG

Ao90 ilegal.PNG

DESENRAIZAMENTO DO AO90.PNG

 

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 17:01

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Segunda-feira, 25 de Outubro de 2021

Que utilidade prática poderá ter o AO90, depois de a inclusão linguística e diversidade do Português terem sido defendidas por lusófonos nos EUA, em 22/10/2021?

 

 

Três escritores do Brasil [João Almino], Cabo Verde [Maria Augusta Teixeira] e Portugal [Lídia Jorge] destacaram que devem ser aceites e incluídas as diferenças da Língua Portuguesa em diversas partes do mundo, de acordo com a identidade dos povos que a falam.

 

Espero que isto valha para Portugal, berço da Língua Portuguesa, o país lusófono onde a aplicação do AO90 foi mais destruidora, e continua a ser absolutamente cada vez mais caótica. Uma autêntica tragédia portuguesa.

 

Mas vejamos o que nos dizem os escritores citados, e também o Luciano de Queiroz, com o qual concordo inteiramente.

 

Luciano de Queiroz.png

 

Especialmente promovida para uma audiência lusófona nos Estados Unidos da América (EUA), a décima Conferência de Literatura em Língua Portuguesa decorreu de forma virtual, com o título "Em que português nos entendemos?" e foi organizada pela Coordenação do Ensino Português nos EUA (CEPE-EUA) e pelo Centro de Língua Camões na Universidade de Massachusetts, na cidade norte-americana de Boston.

 

A diversidade é fonte de "dinâmica", disse o escritor brasileiro e diplomata João Almino, membro da Academia Brasileira de Letras, acrescentando que todos podem "enriquecer" com o diálogo entre as diferenças e sublinhando que "o que ameaça a língua é a paralisia".

 

Professor universitário e autor de diversos romances e volumes de ensaios sobre literatura e sobre história e filosofia política, João Almino disse que o português "é muito diverso de um lugar para outro e nós devemos respeitar essas diferenças, reconhecê-las e aceitá-las do ponto de vista gramatical ou sintáctico".

 

Defendendo que os escritores, originários de qualquer parte do mundo, devem ter "liberdade" para "incorporar" as suas vivências e cultura na mesma língua portuguesa, João Almino acrescentou: "E quando eu leio, por exemplo, um escritor africano, eu quero sentir o sabor da língua da África, daquele lugar".

 

A escritora cabo-verdiana Maria Augusta Teixeira, também conhecida como Mana Guta, defendeu que é da responsabilidade e da "militância" dos escritores, que são os que "estão sempre na vanguarda" de soluções, "recuperar a memória oral" cultural de cada país para uma "forma perene", com a transcrição das histórias para livros.

 

A presidente da Assembleia Geral da Sociedade Cabo-verdiana de Autores e vice-presidente da Autoridade Reguladora para a Comunicação Social considerou estar numa posição, em Cabo Verde, de "juntar as pontas soltas" das duas línguas no país insular, português e cabo-verdiano ou crioulo.

 

Mana Guta, também gestora pública e professora universitária, defendeu "sair da dicotomia: porque nós temos crioulistas e lusofonistas em Cabo Verde. A minha postura é juntar as pontas soltas, precisamos das duas línguas".

 

Para Lídia Jorge, autora portuguesa de 26 obras e distinguida com numerosos prémios portugueses e internacionais, mais do que diferenças, as identidades são também formadas por contrastes, inclusive em Portugal.

 

"Eu fiquei profundamente marcada por um país que era pobre, de estender a mão, mas que queria ser ao mesmo tempo um país que dominava uma vasta zona do mundo", disse a professora, que já ensinou em Portugal, Angola e Moçambique e é membro do Conselho de Estado, órgão político de consulta presidencial.

 

Entre outros assuntos, foram discutidos o "impasse" do acordo ortográfico e as abordagens sobre o "fim do mundo" na literatura, com os três autores a concordarem que, de uma maneira ou outra, o mundo está "num momento de transição" ou de "quase fim do mundo", por causa da crise sanitária mundial provocada pela pandemia de covid-19 desde início do ano passado.

 

Na apresentação da conferência, o cônsul-geral de Cabo Verde em Boston, Hermínio Moniz sublinhou que "mais do que nunca, precisamos de inclusão linguística, porque a língua é uma arma muito poderosa".

 

O tema da língua e construção de identidades é, para o cônsul-geral do Brasil em Boston, Benedicto Fonseca Filho, "vastíssimo" e "abre tantas possibilidades (...), como relações de poder ou papel das migrações".

 

João Pedro Fins do Lago, cônsul-geral de Portugal em Boston, destacou que a conferência "tripartida" e multicultural, no seu décimo aniversário, decorreu numa nota "positiva de inclusão e de reconhecimento do papel da mulher na literatura", com a atribuição do Prémio Camões à escritora moçambicana Paulina Chiziane.

 

"É com imensa satisfação e com imenso orgulho que vimos um prémio tão importante ser atribuído a uma mulher, a uma mulher africana, a um vulto da literatura lusófona, que há muito merecia esse reconhecimento", declarou o cônsul português.

 

A conferência, inicialmente apresentada em inglês e em português, teve a assistência `online` de dezenas de pessoas e pelo menos duas turmas de estudantes nos Estados Unidos.

 

Entre as entidades envolvidas na promoção da Conferência de Literatura Portuguesa destacam-se o Camões - Instituto da Cooperação e da Língua, a Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento e da Universidade de Massachusetts de Boston.

 

Fonte:

https://www.rtp.pt/noticias/cultura/inclusao-linguistica-e-diversidade-do-portugues-defendida-por-lusofonos-nos-eua_n1357880

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 16:46

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Sexta-feira, 29 de Janeiro de 2021

«Originada na Península Ibérica, a língua brasileira cada vez mais se impõe no planeta…» quem o diz é o escritor brasileiro Ray Cunha

 

Ray Cunha nasceu em Macapá, à margem esquerda do rio Amazonas, na confluência com a Linha Imaginária do Equador, estado do Amapá, Amazónia Caribenha. É autor de: A Casa Amarela; Fogo No Coração; Jambu; De Tão Azul Sangra.

 

Ray Cunha publicou um texto, no Diário Carioca, no passado dia 25 de Janeiro (2021) e cuja leitura recomendo vivamente, porque nele está bem explícito os dois aspectos fundamentais desta questão, que, para os nossos governantes, é uma não-questão:

 

- Ao que veio o AO90;

 

-  E o grande e grave erro em que Augusto Santos Silva (o dono da Língua), Marcelo Rebelo de Sousa (o brasileiro) e António Costa (o bem-mandado), não tendo dotes de timoneiros, insistem em manter (pois não é de bons líderes manter um tão grosso e grosseiro erro).

 

Diz Ray Cunha:

«A célebre frase literária se ajusta à nomenklatura lulapetista, embora o destino do Brasil, a província agrícola, florestal e mineral mais rica do planeta, é o de ser uma potência mundial, o que só poderá conquistar por meio da democracia. Só então a língua brasileira será respeitada, procurada e aprendida.»  

***

Não há qualquer dúvidaois píses duas línguas. A nossa colonização, através da Língua, já está em curso há muito, e também há muito vem sendo anunciada e denunciada neste Blogue. Porém, desta vez, não sou eu que o digo.    

 

(Os excertos a negrito são da minha responsabilidade).

 

Isabel A. Ferreira

 

Ray Cunha.png

 

Por Ray Cunha

 

«O português falado e escrito no Brasil tem alegria, sons, cheiros, sol, mar e democracia que nenhum decreto ortográfico de Lula poderá mudar»

 

RAY CUNHA, DE BRASÍLIA – O ex-presidente e ex-presidiário Luiz Inácio Lula da Silva, presidente de honra do PT (Partido dos Trabalhadores), assinou, em 29 de setembro de 2008, na Academia Brasileira de Letras (ABL), no Rio de Janeiro, quatro decretos de promulgação do novo Acordo Ortográfico no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), em homenagem ao escritor Machado de Assis, que completava cem anos de morto (1839-1908).

 

“Com esses atos, Machado de Assis será duplamente exaltado: de um lado, a Academia lhe rende a mais expressiva homenagem neste ano em que celebramos o centenário de sua morte. E, de outro, a assinatura pelo presidente Lula dos decretos que promulgam o Acordo Ortográfico dos sete países lusófonos” – declarou, então, o presidente da ABL, Cícero Sandroni.

 

Segundo Cícero Sandroni, a promulgação do Acordo Ortográfico concretizava uma antiga aspiração de Machado de Assis, manifestada em um de seus discursos, em 1897. “A Academia buscará ser a guardiã de nosso idioma, fundado em suas legítimas fontes – o povo e os escritores, todos os falantes de língua portuguesa” – disse, na altura, o autor de Memórias Póstumas de Brás Cubas. 

 

O argumento para mudanças ortográficas na língua portuguesa é que a alegada unificação da escrita no Brasil e em Portugal tornaria o português língua oficial da Organização das Nações Unidas (ONU). Supondo-se que fosse possível unificar a escrita das duas variações linguísticas, mesmo frases burocráticas, de documentos, são marcadas pela sintaxe, pelo estilo oriundo da cultura de cada um dos dois países.

 

O fato é que o novo Acordo Ortográfico não unifica o português de Portugal e o português do Brasil, mesmo que se trate de escrita burocrática. Qualquer tradutor na ONU terá que ser bom de ouvido, tanto para o falar lusitano, típico dos países de clima frio, como para o falar brasileiro, tropical, aberto. Isso, sem mencionar a linguagem crioula.

 

A pergunta que lateja é: A “unificação” da língua portuguesa escrita no Brasil com o português grafado em Portugal tem alguma utilidade? No caso do Brasil, não seria melhor investir maciçamente no ensino básico? E, depois, o Brasil tem mais com que se preocupar.

 

Enquanto Lula levava seu palanque para a Academia Brasileira de Letras, o Correio Braziliense, maior jornal da capital do país, publicava uma série de reportagens sobre crianças, meninas e meninos, que embarcavam em carros de luxo, no coração de Brasília, para serem estuprados a troco de comida.

 

A propósito, exploração sexual de crianças e escravidão sexual são comuns na província potencialmente mais rica do planeta, mas onde a miséria humana, a escravidão, o assassinato, campeiam. Enquanto Lula decretava uma escrita comum entre Brasil e Portugal, a tragédia se abatia na escola pública, por meio da qual universitários semialfabetizados, como Lula, se diplomam.

 

Não demorou, porém, para que se percebesse a que viera o novo Acordo Ortográfico. Foi para beneficiar editoras, principalmente as que integravam a panelinha do Ministério da Educação. A perspectiva era de faturar bilhões.

 

Creio que seria mais produtivo criar o Instituto Machado de Assis e, por meio dele, difundir mundialmente a língua portuguesa escrita e falada no Brasil. Os grandes escritores deste continente chamado Brasil são tradutores da nossa mestiçagem mulata, cafuza e mameluca, das nossas cores, cheiros e alegria. Quanto à CPLP, pode e deve influenciar a democracia, que vem sendo defendida com unhas e dentes pelo presidente Jair Bolsonaro, e se aperfeiçoar como bloco econômico. 

 

Considerando-se o Brasil isoladamente, passamos à frente de Portugal, como os Estados Unidos superaram a Inglaterra. No nosso caso linguístico, enquanto o português lusitano se esgotou, o português brasileiro é uma língua jovem, enriquecida por idiomas africanos, pelo tupi-guarani, por estrangeirismos e pelo calor, cores, aromas, sabores e contexturas dos trópicos e da Amazônia. 

 

Cada vez mais o Acordo Ortográfico se assemelha mais a uma peça de marketing do governo lulapetista, em um país de esmagadora maioria de alfabetizados funcionais – que leem mas não entendem o que leem –, com pelo menos 20 milhões de pessoas que vivem na Idade da Pedra – não sabem ler e, muitíssimos deles, não têm sequer certidão de nascimento; outros, são escravos mesmo, principalmente nos medievais estados da Amazônia. 

 

No Brasil, nós não precisávamos de reforma ortográfica. Precisamos de reforma política, de reforma fiscal, de reforma educacional, de reforma do Judiciário, de reforma administrativa, de pacto federativo, e, sobretudo, de jogar os ladrões de colarinho branco na cadeia e fazê-los pagar tudo o que roubaram, mesmo que para isso seja preciso fazê-los trabalhar de sol a sol. É preciso acabar com a indecência da imunidade parlamentar, com a ditadura dos urubus, a quem só interessa carniça; faz-se necessário passar a limpo o Brasil corrupto.

 

Originada na Península Ibérica, a língua brasileira cada vez mais se impõe no planeta, levando para as regiões frias, que antes sediavam a metrópole, a riqueza cultural e a alegria dos trópicos, por meio da literatura, da tecnologia e do trabalho. Segundo arqueólogos e historiadores, tudo começou na região ocidental da Península Ibérica, há 300 anos Antes de Cristo, com soldados romanos e seu latim vulgar.

 

Oitocentos anos depois, o Império Romano começou a desabar, mas deixava, firmes, várias línguas, variantes do latim. O português escrito começou a ser utilizado, em documentos, no século IX, e, no século XV, já se tornara língua literária. Desde os romanos, havia duas províncias na região em que se formou a língua portuguesa: Lusitânia, hoje Portugal, e Galécia, ou Galícia para nós, brasileiros, ao norte.

 

O Império Romano conquistara a região ocidental da Península Ibérica, criando as províncias da Lusitânia e da Galécia, equivalentes, hoje, ao centro-norte de Portugal e à província espanhola da Galícia, a noroeste da Espanha, nas quais se começou a falar latim vulgar, do qual nasceram as línguas neolatinas e 90% do léxico, ou dicionário, do português. Os únicos vestígios das línguas nativas dessa região dormem na toponímia da Galícia e de Portugal.

 

Entre 409 e 711, depois de Cristo, o Império Romano entrava em colapso e a Península Ibérica era novamente invadida, agora por povos de origem alemã – suevos e visigodos –, que os romanos chamavam de bárbaros. Entretanto, os novos invasores absorveram a língua romana da península. Como cada tribo bárbara falava latim à sua maneira, o resultado foi a formação do galaico-português ou português medieval, espanhol e catalão.

 

Os estudiosos acreditam que foram os suevos os responsáveis pela diferenciação linguística dos portugueses e galegos quando comparados aos castelhanos. Durante o reinado suevo, palavras guerreiras foram impostas em línguas germânicas, tal como “guerra”.

 

Em 711, depois de Cristo, a península foi invadida pelos mouros, de língua árabe, oriundos do norte da África. O árabe foi utilizado, nessa época, como língua administrativa nas regiões conquistadas, mas a população continuou a falar latim vulgar.

 

Em 1249, os mouros foram expulsos, mas deixaram grande número de palavras árabes, especialmente relacionadas à culinária e à agricultura, sem equivalente nas demais línguas neolatinas, além de nomes de locais no sul de Portugal, como Algarve e Alcácer do Sal. Muitas palavras portuguesas que começam por “al” são de origem árabe.

 

O mais antigo documento latino-português de que se tem conhecimento é a Carta de Fundação e Dotação da Igreja de S. Miguel de Lardosa, datada de 882, depois de Cristo. O Testamento de Afonso II, de 1214, é o texto em escrita portuguesa considerado mais antigo. Esses documentos estão guardados no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, em Lisboa.

 

O vernáculo escrito passou, gradualmente, para uso geral a partir do fim do século XIII. Portugal se tornou país independente em 1143, com o rei Dom Afonso I. Em 1290, o rei Dom Dinis criava a primeira universidade portuguesa em Lisboa – Estudo Geral – e decretou que o português, então chamado “linguagem”, substituísse o latim no contexto administrativo.

 

Em 1296, o português foi adotado pela Chancelaria Real. A partir daí, a língua galego-portuguesa passou a ser utilizada também na poesia. Já em meados do século XIV, o português alcançara tradição literária. Nessa época, os nativos da Galícia começaram a ser influenciados pelo castelhano, base do espanhol moderno. Entre os séculos XIV e XVI, com as grandes navegações, a língua portuguesa é difundida na Ásia, África e América.

 

Na Renascença, aumenta o número de palavras eruditas do latim clássico e do grego arcaico, ampliando a complexidade do português. O fim do português arcaico é marcado pela publicação do Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, em 1516.

 

Hoje, fala-se oficialmente português nos oito países que integram a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP): Angola (África), Brasil (América do Sul), Cabo Verde (África), Guiné-Bissau (África), Moçambique (África), Portugal (Europa), São Tomé e Príncipe (África), e Timor-Leste (Ásia). Mas em cada uma das ex-colônias portuguesas falam-se, na verdade, variantes do português de Portugal.

 

Também se fala variantes de português nas seguintes regiões: Galícia (província da Espanha, Europa); Goa, Diu e Damão (Índia, Ásia); Macau (China, Ásia), Málaca (Malásia, Ásia) e Zanzibar (Tanzânia, África).

 

A escrita da língua portuguesa é semelhante em todos os países da CPLP, com poucas variações gramaticais. O que muda, de forma mais evidente, além da grafia de um certo número de palavras, é o significado de outras tantas palavras, com conotações diferentes de região para região; o modo de se utilizar formas verbais; e o estilo erudito, isto é, o modo de se construir frases e contextos literários.

 

Quanto ao falar, um brasiliense só se entenderá com um lisboeta, por exemplo, se ambos conversarem vagarosamente e pronunciarem claramente as sílabas das palavras.

 

Contudo, trata-se da quinta língua mais falada no planeta, por cerca de 240 milhões de pessoas, em quatro continentes. Se Portugal é o portão de entrada da lusofonia no Velho Continente – a Europa –, o Brasil é o gigante do bloco. No Brasil, a língua portuguesa sofreu influências do tupi-guarani – tronco linguístico dos índios da América do Sul – e de várias línguas africanas.

 

Desde o início do século XX, Portugal e Brasil buscam a unificação da língua portuguesa escrita em ambos os países, para chegar, pelo menos, ao consenso de um texto burocrático, que possa reforçar o idioma na Organização das Nações Unidas (ONU). Mas a verdade não pode ser mudada. O português de Portugal se esgotou, enquanto o português do Brasil foi enriquecido pelo índio, pela África e pelo trópico, e é aberto.

 

A reforma ortográfica tudo muda para nada mudar, como diz uma personagem do romance O Leopardo, de Giuseppe Tomasi Di Lampedusa, referindo-se à monarquia italiana, então com as ventosas no erário, como ocorre no Brasil de Lula e do patrimonialismo de Sarney, levado à loucura.

 

A célebre frase literária se ajusta à nomenklatura lulapetista, embora o destino do Brasil, a província agrícola, florestal e mineral mais rica do planeta, é o de ser uma potência mundial, o que só poderá conquistar por meio da democracia. Só então a língua brasileira será respeitada, procurada e aprendida.»

 

Fonte:

https://diariocarioca.com/pop-e-cult/livros/noticia/2021/01/25/o-portugues-falado-e-escrito-no-brasil-tem-alegria-sons-cheiros-sol-mar-e-democracia-que-nenhum-decreto-ortografico-de-lula-podera-mudar/10214581.carioca-rj.html

 

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 16:49

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Terça-feira, 23 de Junho de 2020

«Abraços do Brasil sem excePtuar ninguém…» vs. «Abraços de Portugal (também) sem “excetuar” ninguém…»

 

Resposta a um comentário que recebi de um brasileiro, que me deu oportunidade de esclarecer o que parece não estar ainda esclarecido: nem lá, nem cá.

 

Brasil Portugal.jpg

Origem da imagem (abram o link e leiam o texto)

https://nacionalidadeportuguesa.com.br/2019/11/08/diferencas-de-morar-em-portugal-e-no-brasil/

 

Comentário no post Eliminação das consoantes mudas é fruto de uma descomunal ignorância da Língua Portuguesa

 

Como brasileiro, sou contra ao AO90 por tantos males que ele tem dado à língua portuguesa. Concordo plenamente que as consoantes mudas devem persistir na língua por direito, coesão e etimologia, porém há um ponto que penso eu, admito, leigo, porém apaixonado em linguagens, sobretudo a lusófona, que seja demasiadamente ab-rupto culpar friamente o Brasil por tanta coisa e implicar a forma como nós outros, brasileiros, usamos a lingua portuguesa gráfica mente, conseqüência isso das incansáveis reformulações ortográficas desde o começo do século XX, as quais foram propostas principalmente por quem? Portugal.... Tantas mesquices, besteiras que foram alteradas inúmeras e inúmeras vezes que só feriram as raizes lusitanas e americanas e ainda não chegaram a lugar nenhum =D. O Brasil já é mais do que cansado de sofrer penas de um velho colonizador, não mais por terras, mas por linguas. Sei bem que as mudanças foram tamanhas nas grafia portuguesa aí para o lado dos lusiadas, mas não vás pensando que para cá as coisas foram fáceis assim. Mudanças aqui que há mais de décadas já haviam se extinguido de Portugal, mas que conservava-se aqui por haver sentido para nós outros, brasileiros. Quedas de acentos, caos nós hifens... Isto afecta sim o Brasil até hoje, inclusive. Adoro os meus amigos portugueses, com eles a lingua é mais que uma união, mas se o rancor for grande demais, sinceramente, grande parte dos Brasileiros também assumem a sua língua, inclusive, quando escutamos um galego falando, é mais famíliar do que um português, mas não quero ofender a ninguém! Abraços do Brasil sem excePtuar ninguém... 😉😉😉

Pedro Braga

 

***

Caro Pedro Braga, começo por agradecer este seu comentário.

 

E agora vamos lá por partes, mas antes devo frisar o seguinte: li algures que quanto mais ignorantes são os povos, de mais acordos ortográficos precisam. E isto não sou eu que digo. E se reparar, apenas o Brasil e Portugal, de todos os países do mundo (e arredores) são os povos que mais fizeram (des)acordos ortográficos. E a palavra certa é desacordos, porque o Brasil nunca cumpriu os acordos que assinou com Portugal, no que à Língua diz respeito.

 

A Língua Portuguesa, como qualquer outra Língua do mundo, não é fácil. Mas nenhuma Língua tem de ser fácil ou tem de ser simplificada para que possa ser aprendida e aplicada com rigor e exactidão pelos seus utilizadores. Isso já é amesquinhar o povo.

 

Posto isto, vamos ao seu comentário:

 

1 -  Ninguém culpa, muito menos, friamente, o Brasil de coisa nenhuma.  O Brasil desde 7 de Setembro de 1822 desvinculou-se do colonizador, e consequentemente poderia ter se desvinculado também da Língua que eles já falavam “agalegadamente”, e não o fez. Depois da independência, nenhum português tinha (tem) mais o direito de dizer o que quer que seja do modo como os Brasileiros usam a Língua que herdaram e simplificaram por  pretenderem diminuir o elevado índice de analfabetismo que então (como aliás ainda hoje) grassa no Brasil.  Até 1911, o Brasil (livre), Portugal e as restantes ainda colónias portuguesas tinham a Língua Portuguesa como Língua comum. Difícil, cheia de consoantes duplas (p. ex.: ella), ou fonemas gregos (p. ex.: PHarmacia): ou ainda caracteres gregos (p. ex.: lyrio) com correspondência no alfabeto LATINO, que era o nosso.

 

Em 1910, com a Implantação da República em Portugal, e para combater o analfabetismo, que também grassava no nosso país, um grupo de estudiosos da Língua (não políticos ou linguistas vendidos à política) estabeleceram uma ortografia mais simplificada, ficando o Brasil com a ortografia antiga, e Portugal com uma ortografia, em que as principais alterações introduzidas foram:

 

- Eliminação de todos os dígrafos de origem grega com substituição por grafemas simples: th (substituído por t), ph (substituído por f), ch (com valor de [k], substituído por c ou qu de acordo com o contexto) e rh (substituído por r ou rr de acordo com o contexto);

- Eliminação de y (substituído por i);

- Redução das consoantes dobradas (ou geminadas) a singelas, com excePção de rr e ss mediais de origem latina, que têm valores específicos em Português;

- Eliminação de algumas consoantes não-pronunciadas em final de sílaba gráfica, QUANDO NÃO AFECTAVAM A PRONUNCIA DA VOGAL QUE AS PRECEDIA (p. ex.: afecto (que sem o cê, se lê “âfêtu”)

- Introdução de numerosa acentuação gráfica, nomeadamente nas palavras proparoxítonas.

 

O Brasil opôs-se inicialmente, mas como o analfabetismo era elevadíssimo no Brasil, a Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras uniram-se para  encontrar as bases de uma ortografia comum e firmaram o  primeiro Acordo Ortográfico Luso-Brasileiro, em 30 de Abril de 1931 que praticamente adoPtou a ortografia portuguesa de 1911.



Porém, com todas estas simplificações, o índice de analfabetismo não baixava, no Brasil. Foi então que em 1943 a Academia Brasileira de Letras estabeleceu o Formulário Ortográfico de 1943, com as alterações que são a base do Acordo Ortográfico de 1990, à excePção de alguns acentos e hífenes. De resto a GRAFIA imposta pelo AO90, em Portugal é assente na GRAFIA deste FORMULÁRIO ORTOGRÁFICO BRASILEIRO de 1943.

 

Em 1945, grassava no Brasil e Portugal ainda um elevado índice de analfabetismo, e foi preciso fazer uma outra reforma (repare o Pedro Braga, que na base destes “acordos” ortográficos está o analfabetismo que não havia meio [e ainda  não há] de diminuir.

 

Desta vez, foi assinada em Lisboa em 6 de Outubro de 1945, a Formulário Ortográfico de 1943, pela Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras. Este acordo, ligeiramente alterado pelo decreto-lei n.º 32/73, de 6 de Fevereiro, estabeleceu as bases da ortografia portuguesa para todos os territórios portugueses (que à data do acordo e até 1975 compreendiam o território europeu de Portugal e as províncias ultramarinas portuguesas - na Ásia e África). No Brasil, o Acordo Ortográfico de 1945 foi aprovado pelo decreto-lei 8.286 de 5 de Dezembro de 1945. Entretanto, o texto nunca foi ratificado pelo Congresso Nacional, continuando os brasileiros a regular-se pela ortografia do Formulário Ortográfico de 1943, que é “ipsis verbis” a ortografia do Acordo Ortográfico de 1990, à excePção da retirada do bendito trema, e de alguns acentos como pára/para, e hífenes, como em fim-de-semana para Portugal (no Brasil já era fim de semana), que de um nome masculino que significa período composto pelos dias de sábado e domingo, e que se opõe aos dias úteis, passou a FIM (nome masculino = termo), DE (preposição que une ao nome o seu complemento) SEMANA (que pode ser uma série de sete dias consecutivos a partir do domingo, ou série de sete dias consecutivos. E lá se vai o sentido do período composto pelos dias de sábado e domingo.



Toda esta alucinação de unificar o que jamais poderá ser unificado, até porque ou o Brasil começava a escrever António, ou Portugal começava a escrever Antônio, e isto só para apresentar um pequeníssimo exemplo, porque teria de estar aqui até ao fim do mês, para lhe mostrar as inúmeras diferenças entre a VARIANTE que o Brasil gerou a partir da Língua Portuguesa (e fez muito bem, e que lhe chamem Língua Brasileira, que a será mais dia, menos dia), e a Língua Mãe, a Portuguesa, mas estava eu a dizer, toda esta alucinação começou com Antônio Houaiss, um libanês/brasdileiro que mal sabia Português, o que lhe interessava era o negócio, consulte, por favor, este texto «O Negócio do Acordo Ortográfico de 1990» neste link:


https://olugardalinguaportuguesa.blogs.sapo.pt/o-negocio-do-acordo-ortografico-172469

e veja como tudo isto começou. Portugal estava muito bem, com a sua ortografia de 1945. Não pediu nenhum acordo. Porém, políticos esquerdistas brasileiros e políticos portugueses, uns esquerdistas, outros, não, mal informados, mal formados, gananciosos, ignorantes e corruptos uniram-se para destruir o Património Cultural Imaterial de Portugal mais precioso -  a sua Língua, e, com isso, destruir também sua identidade Linguística e Cultural.


 2 – Posto isto, caro Pedro Braga, as mudanças no Brasil, foram mínimas. Em Portugal foram devastadoras, porque não só mexeu com a grafia, como também com a pronúncia, e hoje, os que que se renderam à grafia demasiado simplista, de uma lógica extremamente simples, básica, não só escrevem incorreCtamente, como pronunciam também incorreCtamente as palavras grafadas à brasileira, porque no Brasil abrem as vogais, à moda galega. Os Brasileiros continuaram a pronunciar à galega, quando os Portugueses já tinham a sua própria pronúncia.

 

Portanto, o que se escreve e fala no Brasil, já não é Português, mas sim uma VARIANTE do Português, ou seja, um dialeCto.

 

Meu caro, eu também adoro os meus amigos e a minha família brasileira, que já vai na quarta geração. Com eles partilho, não a Língua, mas a VARIANTE da Língua Portuguesa, porque não falo nem escrevo como eles. Não é a Língua que nos une, mas sim os afeCtos, que eu, como portuguesa, escrevo com CÊ, e eles, como brasileiros, escrevem sem CÊ.



O Pedro Braga usou a palavra RANCOR, uma palavra muito feia, e que eu abomino, porque rancor sentem os desalmados. Não, quem é de bem e do bem. Nenhum português sente rancor pelo Brasil ou pelos Brasileiros. O que talvez sintam, e falo por mim, que aprendi a ler e a escrever no Brasil, segundo a cartilha do AO90, e metade da minha vida foi vivida no Brasil, da minha Cultura também faz parte a riquíssima Cultura Brasileira, o que sinto é uma imensa tristeza por termos uma Língua da família linguística Indo-Europeia reduzida a uma Variante, que será Língua no Brasil, mas não em Portugal. Nós somos europeus. Vocês são sul-americanos e um País livre. Por que haveríamos, nós, um País livre também (agora nem tanto) de trocar a nossa grafia, pela grafia de uma ex-colónia? Porque haveríamos de andar para trás como o caranguejo? Há quem diga que o intuito dos esquerdistas brasileiros é colonizar o ex-colonizador através da Língua, e que o intuito dos esquerdistas portugueses que estão agora no Poder, é rastejar aos pés do Gigante, para se tornarem visíveis no mundo.  E se assim é, estão a conseguir, mas pela negativa.

 

A Língua Portuguesa está, cada vez mais, a perder prestígio no mundo, e acabará por se extinguir. Isso se nós, os que defendemos a nossa Língua (como os Brasileiros defendem a deles) deixarmos.

 

Para terminar, envio igualmente um abraço português, sem também “excetuar” (isto nem é português, nem brasileiro) ninguém, mas escrito na mixórdia em que se transformou a Língua Portuguesa, em Portugal, com a aplicação do AO90, projecto, nascido da cabeça do intelectual esquerdista brasileiro Antônio Houaiss, [que] foi desde o início um empreendimento com fins lucrativos, apoiado por uma poderosa máquina política e comercial com ramificações em Portugal.

 

E esta é a verdade verdadeira sobre um “acordo” que nunca foi e jamais será um acordo.

 

Isabel A. Ferreira

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 17:32

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Sexta-feira, 7 de Fevereiro de 2020

AO90: «Anatomia de uma fraude com duas palavras picantes como condimento»

 

«Diz-se que o VOC é “o recurso oficial de referência para a escrita do português”, elaborado por “um vasto corpo de especialistas de diferentes países.” Coisa séria? Não, é truque(Nuno Pacheco)

 

E que truque! E que fraude! E que vergonha! E que irresponsabilidade! E que desrespeito pelos escreventes de Língua Portuguesa! E que prepotência! E que tirania!  E que falta de lucidez, de sensibilidade e de bom senso!

 

Novo  texto de Nuno Pacheco, publicado no Jornal Público, que denuncia os podres que envolvem esta negociata de beira de esquina, de fundo de beco, de subterrâneo desalumiado, mais conhecida por Acordo Ortográfico de 1990.

 

Isabel A. Ferreira

 

Nuno Pacheco.jpg

Texto por Nuno Pacheco

 

6 de Fevereiro de 2020, 7:30

 

«O exercício é penoso, mas instrutivo. Percorrer, com tempo, o Vocabulário Ortográfico Comum da Língua Portuguesa (dito VOC), instrumento oficial do Acordo Ortográfico de 1990 (AO) e alojado no sítio do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), é entrar num universo surreal, onde cada novo absurdo parece suplantar o anterior. O que justifica tal atenção? Isto: esteve “morto” durante 14 dias, “ressuscitou” sem uma explicação em apenas quatro horas (bastou escrever “o VOC vai morto”) e regressou tal qual desaparecera: péssimo.

 

Na entrada, com nove bandeirinhas coloridas, diz-se que o VOC é “o recurso oficial de referência para a escrita do português”, elaborado por “um vasto corpo de especialistas de diferentes países.” Coisa séria? Não, é truque. Leia-se esta conversa, logo na apresentação:

 

“Apesar de ser um instrumento uno, um único vocabulário, o VOC procura representar o léxico em uso em cada país e as suas especificidades. Seguindo uma metodologia comum e princípios compatíveis, uma instituição nomeada em cada país cria e gere o vocabulário nacional (VON) representativo da sua variedade, que quando inserido na base de dados do VOC permite gerar um todo único (o VOC) que consolida tanto o léxico comum quanto as especificidades de cada país. O inventário de formas validadas para cada país pode ser consultado clicando na sua bandeira; o todo pode ser obtido através do logo do IILP.”

 

Já se disse aqui, na semana passada, que os ditos vocabulários nacionais são decalcados de uma mesma base, praticamente igual para Portugal, Brasil, Cabo Verde, Moçambique e Timor-Leste, os únicos existentes (Angola, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe faltam). O truque, diz-se na introdução, é olhar os sinais: se uma palavra tiver um quadradinho azul a antecedê-la, está “atestada” nesse país; se não tiver, pode ser usada na mesma (porque “nada desaconselha ao seu uso”); e se a busca não der nada, é porque não é válida.

 

Vamos experimentar. Procuremos “machimbombo”. Está em todos os vocabulários nacionais (VON). E o quadradinho azul? É preciso clicar em Vocabulário e folhear os VON. Aí está: na sexta folha de cada um (e cada folha tem 100 palavras), há quadradinho azul em Moçambique e no Brasil, não há nos restantes. Mas no de Moçambique, e bem perto de “machimbombo”, há três outras palavras que chamam a atenção e não têm quadradinho: Machimano, Machindo, Machine. Serão de que país, adivinham? Moçambique. Localidades. Mas, mal se clica nelas, vamos parar a um mundo ainda mais estranho: o da Toponímia. Onde, para “engordar” os vocabulários, todos os topónimos inventariados integram também todos os VON e o VOC.

 

E isto dá coisas bem curiosas. “Aeroporto”, por exemplo. Há seis, dados como “localidades”, “lugares” ou “bairros”. Dois de São Tomé, dois de Portugal (Lisboa e Açores, o de Santa Maria), um de Moçambique (Chamanculo, que está duplicado numa entrada própria) e um de Cabo Verde (Fogo). Nenhum do Brasil, que tem largas dezenas. Não devem ser “lugares”.

 

Estranharam? Há melhor: “Urbanização”. Aparecem duas, uma em Murça (como “local”), outra em Maxaquene, Moçambique (como “bairro”). Só duas, em todo o espaço lusófono? É problema que não têm “topónimos” como “Aldeia”, “Estrada”, “Rua”, estas às dezenas e atribuídas às mais variadas localidades. Com uma particularidade curiosa: multiplicam-se. “Rua”, atribuída a Ponte de Lima, tem 5 entradas iguais, seguidas; “Aldeia”, atribuída a Barcelos, tem 6, também seguidas; “Taberna”, dado como lugar de Santiago, Cabo Verde, tem nada menos do que 8 entradas, absolutamente iguais, e em linhas consecutivas! Com tão “vasto corpo de especialistas”, devem ter-se esquecido de contratar um simples revisor…

 

Mas não se esqueceram do Condomínio Colmeia Village! Vá-se lá saber porquê, é o único condomínio registado no VOC e na Toponímia em todo o espaço lusófono, onde há uns larguíssimos milhares deles. Não aparece à primeira, é preciso escrever “condomínio” no espaço de busca e, na caixa à esquerda, escolher “começa com” (não “igual a”). Também há aldeamentos: 16, no total, dois são-tomenses e 14 portugueses. Só falta a carta turística.

 

Exemplos destes há às centenas. A base de tudo isto? Um palpite: o Houaiss antigo ou o Vocabulário da Academia Brasileira de Letras (ABL). Foram os únicos onde encontrei – e agora chegamos às palavras picantes – “manusturbação”, que por “acaso” consta de todos os VON e do VOC, mas não vi em mais nenhum dicionário ou vocabulário (Porto Editora, José Pedro Machado, Rebelo Gonçalves, Priberam, ACL, ILTEC, nem no Houaiss ATUAL, já com o acordo de 1990!). Com uma curiosidade: o Houaiss diz que é uma palavra “formada sobre uma etimologia equivocada”, de uso desaconselhado (a correcta será “masturbação”), mas nos VON e no VOC, ignorando tal aviso, até lhe atribuem plural (“manusturbações”)!

 

Outra palavra picante: “cacto”. Foi varrida de todos os VON e substituída por “cato”, menos no do Brasil e no VOC, onde até lhe arranjaram o insólito feminino “cacta”, quando até a ABL regista apenas “cactal”! Mas as palavras “cactáceo”, “cactáceas”, “cactiforme” ou “cactoide” (agora sem acento, era “cactóide”) lá estão, em todos, como derivadas de “cacto” (Brasil) ou de… “cato” nos outros todos. Não é mesmo uma maravilha, esta fraude geral?»

 

Fonte:

https://www.publico.pt/2020/02/06/culturaipsilon/opiniao/anatomia-fraude-duas-palavras-picantes-condimento-1902913

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 11:38

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Terça-feira, 4 de Fevereiro de 2020

E assim vai o ensino da Língua Portuguesa, em Portugal...

 

Um excelente texto da Escritora e Professora Catedrática Teolinda Gersão,  publicado no Facebook em 06 de Abril de 2018.

 

Se fosse escrito hoje, o ensino da Língua Portuguesa, que neste texto foi exposto como sendo mau, teria de ser revisto e qualificado de péssimo, porque, entretanto, as coisas degradaram-se de tal modo, que até os professores (salvo raras excePções) já não sabem ensinar ou sequer escrever correCtamente a Língua que, oficialmente, continua a ser a Portuguesa, assente na grafia proposta pela Convenção Ortográfica Luso-Brasileira de 1945 (*), que entrou em vigor no nosso país através do Decreto N.º 35 228, de 8 de Dezembro de 1945, o qual não foi revogado, logo, continua em vigor. Regra básica que qualquer estudante de Direito, do primeiro ano, sabe, e o cidadão comum, mais informado, também sabe.

 

E é este Decreto que dá validade jurídica ao facto de o Ensino da Língua Portuguesa dever ser efectuado segundo a grafia de 1945, delegando, assim, para a ilegalidade, a aplicação do AO90, em Portugal.  

 

LÍNGUA PORTUGUESA.png

 

«VOU CHUMBAR A LÍNGUA PORTUGUESA»…

 

Este texto é da autoria de Teolinda Gersão

 

Escritora, Professora Catedrática aposentada da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

(Escreveu-o depois de ajudar os netos a estudar Português, e colocou-o no Facebook).

 

"Vou chumbar a Língua Portuguesa, quase toda a turma vai chumbar, mas a gente está tão farta que já nem se importa. As aulas de português são um massacre. A professora? Coitada, até é simpática, o que a mandam ensinar é que não se aguenta. Por exemplo, isto: No ano passado, quando se dizia “ele está em casa”, “em casa” era o complemento circunstancial de lugar. Agora é o predicativo do sujeito. “O Quim está na retrete”: “na retrete” é o predicativo do sujeito, tal e qual como se disséssemos “ela é bonita”. Bonita é uma característica dela, mas “na retrete” é característica dele? Meu Deus, a setôra também acha que não, mas passou a predicativo do sujeito, e agora o Quim que se dane, com a retrete colada ao rabo.

 

No ano passado havia complementos circunstanciais de tempo, modo, lugar etc., conforme se precisava. Mas agora desapareceram e só há o desgraçado de um “complemento oblíquo”. Julgávamos que era o simplex a funcionar: Pronto, é tudo “complemento oblíquo”, já está. Simples, não é? Mas qual, não há simplex nenhum, o que há é um complicómetro a complicar tudo de uma ponta a outra: há por exemplo verbos transitivos directos e indirectos, ou directos e indirectos ao mesmo tempo, há verbos de estado e verbos de evento, e os verbos de evento podem ser instantâneos ou prolongados; almoçar por exemplo é um verbo de evento prolongado (um bom almoço deve ter aperitivos, vários pratos e muitas sobremesas). E há verbos epistémicos, perceptivos, psicológicos e outros, há o tema e o rema, e deve haver coerência e relevância do tema com o rema; há o determinante e o modificador, o determinante possessivo pode ocorrer no modificador apositivo e as locuções coordenativas podem ocorrer em locuções contínuas correlativas. Estão a ver? E isto é só o princípio. Se eu disser: Algumas árvores secaram, “algumas” é um quantificativo existencial, e a progressão temática de um texto pode ocorrer pela conversão do rema em tema do enunciado seguinte e assim sucessivamente.

 

No ano passado se disséssemos “O Zé não foi ao Porto”, era uma frase declarativa negativa. Agora a predicação apresenta um elemento de polaridade, e o enunciado é de polaridade negativa. No ano passado, se disséssemos “A rapariga entrou em casa. Abriu a janela”, o sujeito de “abriu a janela” era ela, subentendido. Agora o sujeito é nulo. Porquê, se sabemos que continua a ser ela? Que aconteceu à pobre da rapariga? Evaporou-se no espaço?

 

A professora também anda aflita. Pelo visto, no ano passado ensinou coisas erradas, mas não foi culpa dela se agora mudaram tudo, embora a autora da gramática deste ano seja a mesma que fez a gramática do ano passado. Mas quem faz as gramáticas pode dizer ou desdizer o que quiser, quem chumba nos exames somos nós. É uma chatice. Ainda só estou no sétimo ano, sou bom aluno em tudo excepto em português, que odeio, vou ser cientista e astronauta, e tenho de gramar até ao 12º estas coisas que me recuso a aprender, porque as acho demasiado parvas. Por exemplo, o que acham de adjectivalização deverbal e deadjectival, pronomes com valor anafórico, catafórico ou deítico, classes e subclasses do modificador, signo linguístico, hiperonímia, hiponímia, holonímia, meronímia, modalidade epistémica, apreciativa e deôntica, discurso e interdiscurso, texto, cotexto, intertexto, hipotexto, metatatexto, prototexto, macroestruturas e microestruturas textuais, implicação e implicaturas conversacionais? Pois vou ter de decorar um dicionário inteirinho de palavrões assim. Palavrões por palavrões, eu sei dos bons, dos que ajudam a cuspir a raiva. Mas estes palavrões só são para esquecer, dão um trabalhão e depois não servem para nada, é sempre a mesma tralha, para não dizer outra palavra (a começar por t, com 6 letras e a acabar em “ampa”, isso mesmo, claro.)

 

Mas eu estou farto. Farto até de dar erros, porque me põem na frente frases cheias deles, excepto uma, para eu escolher a que está certa. Mesmo sem querer, às vezes memorizo com os olhos o que está errado, por exemplo: haviam duas flores no jardim. Ou: a gente vamos à rua. Puseram-me erros desses na frente tantas vezes que já quase me parecem certos. Deve ser por isso que os ministros também os dizem na televisão. E também já não suporto respostas de cruzinhas, parece o totoloto. Embora às vezes até se acerte ao calhas. Livros não se lê nenhum, só nos dão notícias de jornais e reportagens, ou pedaços de novelas. Estou careca de saber o que é o lead, parem de nos chatear. Nascemos curiosos e inteligentes, mas conseguem pôr-nos a detestar ler, detestar livros, detestar tudo. As redacções também são sempre sobre temas chatos, com um certo formato e um número certo de palavras. Só agora é que estou a escrever o que me apetece, porque já sei que de qualquer maneira vou ter zero.

 

E pronto, que se lixe, acabei a redacção - agora parece que se escreve redação. O meu pai diz que é um disparate, e que o Brasil não tem culpa nenhuma, não nos quer impor a sua norma nem tem sentimentos de superioridade em relação a nós, só porque é grande e nós somos pequenos. A culpa é toda nossa, diz o meu pai, somos muito burros e julgamos que se escrevermos ação e redação nos tornamos logo do tamanho do Brasil, como se nos puséssemos em cima de sapatos altos. Mas, como os sapatos não são nossos nem nos servem, andamos por aí aos trambolhões, a entortar os pés e a manquejar. E é bem feita, para não sermos burros.

 

E agora é mesmo o fim. Vou deitar a gramática na retrete, e quando a setôra me perguntar: Ó João, onde está a tua gramática?

Respondo: «Está nula e subentendida na retrete, setôra, enfiei-a no predicativo do sujeito».

 

João Abelhudo, 8º ano, setôra, sem ofensa para si, que até é simpática

 

Fonte:

https://www.facebook.com/pedrovalcerto/posts/1826140224076035

 

***

(*) A Convenção Ortográfica Luso-Brasileira de 1945 (Acordo Ortográfico de 1945) foi assinada em Lisboa em 6 de Outubro de 1945, entre a Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras. Este acordo, ligeiramente alterado pelo decreto-lei n.º 32/73, de 6 de Fevereiro, estabeleceu as bases da ortografia portuguesa para todos os territórios portugueses (que à data do acordo e até 1975 compreendiam o território europeu de Portugal e as províncias ultramarinas portuguesas - na Ásia e África), e que até aos dias de hoje está em vigor.  No Brasil, o Acordo Ortográfico de 1945 foi aprovado pelo decreto-lei 8.286 de 5 de Dezembro de 1945, contudo, o texto nunca foi ratificado pelo Congresso Nacional, e os Brasileiros logo o abandonaram para continuar a regular-se pela ortografia do Formulário Ortográfico de 1943. O texto foi posteriormente revogado pela lei 2.623, de 21 de Outubro de 1955, passados 10 anos.

 

Portugal anda vai muito a tempo de dar o dito pelo não dito (como o fez o Brasil, com o AO45), reconhecer o gravíssimo erro que foi adoPtar a grafia da ex-colónia sul-americana, e mandar repor a grafia portuguesa, nas Escolas portuguesas, e em todas as instituições estatais e privadas, fazendo, desde modo, cumprir a LEI VIGENTE.

***

Para complementar o que aqui foi dito, aconselho a leitura deste texto:

 E assim, vai o inadmissível e arruinado ensino, em Portugal...

 

Isabel A. Ferreira

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 15:40

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Quinta-feira, 12 de Dezembro de 2019

«Um bom exemplo brasileiro e mais datas para duvidar da validade do Acordo Ortográfico»

 

«O bom exemplo é a recente edição de Grande Sertão: Veredas. O mau exemplo é antigo e vem de Lula da Silva, quando foi Presidente do Brasil: num só dia assinou quatro decretos sobre o Acordo Ortográfico, e nenhuma das datas que refere batem certo com as do MNE português.»

 

Quem o diz é Nuno Pacheco, num excelente artigo no Jornal Público, que aqui se transcreve.

 

Nuno pacheco.jpg

 

Se há obras que transcendem o seu estatuto fundador e são já património universal, Grande Sertão: Veredas é uma delas. O seu autor, João Guimarães Rosa (Brasil, 1908-1967), era obcecado “pela integridade textual dos seus livros”, como recorda a editora Companhia das Letras, que acaba de lançar em Portugal nova edição desta obra. Por isso, resolveu adoptar (e di-lo na nota introdutória) “como referência a segunda edição [Agosto de 1958] com a rubrica ‘texto definitivo’”, respeitando “o critério básico de diminuir ao máximo as diferenças com a segunda edição de 1958, quando se fixou a fisionomia textual do romance.”

 

Explicando melhor: “O texto foi estabelecido de modo a preservar a expressividade de sinais diacríticos, hifenização e outros pormenores morfológicos e ortográficos na aparência desimportantes, mas que se destacam no sistema polifónico do livro.” Daí que, embora “êle” tenha passado com os tempos (e também no livro) a “ele”, “vôo” a “voo” ou “idéia” a “ideia”, se tenham mantido grafias como “gemêsse”, “umbùzeiro”, “urubú” ou “buritís”. Registe-se que, sendo a edição feita em Portugal (da editora brasileira aqui sediada), tanto a nota introdutória como a longa cronologia que fecha o livro e a respectiva lista de fontes respeitam a ortografia portuguesa de 1945 (ainda em vigor por lei). Que diferença com a recente edição d’A Menina do Mar, “atualizando” à força o texto de Sophia!

 

Já que falamos no Brasil, e no Acordo Ortográfico (que tenham paciência, ou virem a página, os que já dão este assunto por encerrado), é bom recordar que no Brasil sempre houve, e há ainda, resistência ao dito “acordo”. Manifestaram-se contra ele, a seu tempo, figuras como André Nogueira, Caetano Veloso, Carlos Heitor Cony, Ferreira Gullar, Gregório Duvivier, Hélio Schwartsman, Ivan Lins, João Paes Loureiro, João Ubaldo Ribeiro, Jorge Amado, Maria Lúcia Lepecki, Millôr Fernandes, Nei Leandro de Castro, Paulo Franchetti, Pasquale Cipro Neto, Sérgio de Carvalho Pachá, Sidney Silveira ou Walnice Nogueira Galvão. Ainda há pouco, no Observador (de 22/9), o jornalista brasileiro José Augusto Filho escreveu: “O Acordo Ortográfico de 1990 [que ele atribui ao “lulopetismo” – de Lula e do PT] é um falhanço total. Ele em nada tem facilitado a integração política e económica entre os estados membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Bem ao contrário, tem antes servido a alimentar nacionalismos e ressentimentos. […] Da forma que foi conduzido, o Acordo serve antes para enfraquecer a língua de Camões do que para disseminá-la. Quanto aos ganhos políticos e económicos decorrentes, foram até agora praticamente nulos.”

 

Em artigo anterior (“Querem datas giras para duvidar da validade do Acordo Ortográfico? Aqui vão algumas”, 8/8/19) já tínhamos visto que as datas apresentadas para sancionar a dita “legalização” do AO90 em Portugal, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe não batem certo nos documentos que as registam (enquanto os depósitos no MNE português não forem vistos por uma entidade independente, permanece a dúvida: houve ou não manipulação de dados?).

 

Ora o mesmo sucede com o Brasil, a maior potência envolvida neste duvidoso negócio. O Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) português, tutelado por Augusto Santos Silva, deu publicamente, num Direito de Resposta enviado ao PÚBLICO (e publicado em 28/7), as seguintes datas (sic): “O Brasil depositou o instrumento de ratificação do Acordo Ortográfico a 30 de abril de 1996, o instrumento de ratificação do Protocolo Modificativo a 15 de agosto de 2002 e o instrumento de ratificação do Acordo do Segundo Protocolo Modificativo a 12 de junho de 2006.” Do lado brasileiro, o que temos? O texto do AO (de 1990) foi aprovado no Congresso Nacional como “projecto de decreto legislativo” em 1992 (mas só publicado no Diário do Congresso em Setembro de 1993); já como Decreto Legislativo n.º 54, o Congresso aprova-o em 18 de Abril de 1995 (está no Diário Oficial de 20/4/95); e aprova também, mas em 12 de Junho de 2002, o primeiro protocolo modificativo. Até aqui, poderia bater certo com as datas do MNE, caso se confirmem os respectivos depósitos. Mas depois tudo se atrapalha.

 

Num só dia, 29 de Setembro de 2008, Lula da Silva assina quatro decretos relativos ao AO: o 6583, promulgando-o (“considerando que o Acordo entrou em vigor internacional em 1.º de janeiro de 2007, inclusive para o Brasil, no plano jurídico interno”, dá uma data diferente para depósito do instrumento de ratificação: 24 de Junho de 1996, quando o MNE diz 30 de Abril); o 6584, promulgando o primeiro protocolo; o 6585, promulgando o segundo protocolo; e o 6586, obrigando os livros escolares a usarem já a nova grafia a partir de 2010 (mais tarde, Dilma Rousseff prolongará até Dezembro de 2015 o uso simultâneo das duas normas). Uns meses depois desta “maratona” legislativa, o Diário Oficial da União revela que haverá um apoio de meio milhão de reais (486.696, para sermos exactos) à edição de um Vocabulário Ortográfico a editar pela Academia Brasileira de Letras, para distribuição gratuita a escolas, bibliotecas, etc., com uma tiragem de 10 mil exemplares. E em Setembro desse mesmo ano de 2009 são dados mais 269.680 reais a um festival musical inspirado no “acordo ortográfico”.

 

NOTA: os documentos publicados neste espaço, podem ser lidos aqui:

https://www.publico.pt/2019/12/12/culturaipsilon/opiniao/bom-exemplo-brasileiro-datas-duvidar-validade-acordo-ortografico-1896941


A correria a que Lula se entregou em 2008 tem uma origem próxima: Marcos Vinicios Vilaça, académico desde 1985, tinha chegado à presidência da Academia Brasileira de Letras (ABL) em 15 de Dezembro de 2005, para o biénio 2006/2007. Apadrinhado por José Sarney (que foi o grande impulsionador do Acordo Ortográfico nos anos 1980-90) e com um gosto especial pela projecção mediática, nomeou como seu assessor um jornalista de nome Antônio Carlos Athayde para garantir tal projecção. E esse assessor teve, um dia, uma ideia: descobriu que o Acordo Ortográfico estava a adormecer numa gaveta (de onde muita gente, em Portugal e no Brasil, confiava que nunca saísse), e disse a Vilaça: “Meu presidente, eu tive uma ideia que não vai tirar mais a ABL da mídia. Nós vamos promover a unificação ortográfica.” Ora no mesmo ano em que Vilaça entrara na presidência da ABL, também José Sócrates chegara a primeiro-ministro de Portugal. Com Lula na Presidência do Brasil desde Janeiro de 2003, foi só juntar a ambição de ambos com o desiderato pessoal de Vilaça e Athayde: um primor!

 

SÓCRATES E LULA.jpg

José Sócrates com Lula da Silva no Palácio do Planalto, Brasília, em Agosto de 2006 JAMIL BITTAR/REUTERS

 

Voltando aos decretos de Lula da Silva. As datas que ele refere nos seus decretos não batem certo com as que o MNE dá por oficiais. Lula escreve que o documento inicial do AO foi depositado em 24/6/1996 e o MNE diz que foi em 30/4/1996, dois meses antes (num e noutro caso, ainda na presidência brasileira de Fernando Henrique Cardoso); Lula diz (decreto 6584) que o primeiro protocolo modificativo foi depositado em 3/9/2004, enquanto o MNE fala em 15/8/2002 (a ser assim, não seria durante a presidência de Lula, mas sim de Fernando Henrique); e, por fim, Lula diz (decreto 6585) que o documento referente ao segundo protocolo foi depositado em 20/10/2004, quando o MNE português refere, explicitamente, 12/6/2006. Nenhuma das datas coincide.

 

Pior: se nos dois primeiros casos (AO e primeiro protocolo), Lula refere a aprovação no Congresso Nacional, já no que respeita ao segundo protocolo diz apenas que “foram cumpridos os requisitos”. Mas no decreto 6586 (o quarto desta maratona) esclarece, afinal, que tal protocolo foi “internalizado pelo Decreto n.º 6585 de 29 de setembro de 2008”. Ou seja, nesse mesmo dia, e pelo decreto anterior, mas sem ir ao Congresso.

 

Ora a ida ao Congresso era obrigatória por lei, como ele bem sabia. Mas nesse dia não quis saber. Lá diz o Decreto Legislativo n.º 54, de 1995 (e é confirmado nos posteriores): “São sujeitos à apreciação do Congresso Nacional quaisquer atos que impliquem revisão do referido Acordo [Ortográfico].” Quaisquer actos! Mas que importava? Estava-se em plena euforia do quero, posso e mando. E deu no que deu.

 

Recapitulando, com as datas do texto anterior: se Portugal (diz o MNE) só ratificou o segundo protocolo em 2009, a 13 de Maio; se de São Tomé não se conhece registo de que tal protocolo tenha sido sequer ratificado; se Cabo Verde, em Dezembro de 2009, ainda estava a pensar notificar o MNE, “com a urgência possível”, da sua ratificação interna; e se o Brasil fugiu à lei não levando o segundo protocolo ao seu Congresso Nacional, como é possível afirmar (como se lê em notas, avisos e decretos) que o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa “entrou em vigor, a nível internacional, em 1 de janeiro de 2007”? Não é claro que estamos perante um embuste?

 

Fonte:

https://www.publico.pt/2019/12/12/culturaipsilon/opiniao/bom-exemplo-brasileiro-datas-duvidar-validade-acordo-ortografico-1896941

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 17:03

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