«Não adianta a unificação da língua porque somos ligados por uma língua diferente. Você quer unir uma coisa que é falada de um jeito num lugar… Tirar o acento de “pára”, do verbo parar, é uma confusão louca. “Para o ônibus” — como é que você sabe se é para parar o ônibus ou para ir para o ônibus?! Uma bobagem…»
Jô Soares, Humorista e escritor brasileiro
«Uma coisa que me dá muita aflição são essas reformas ortográficas. Eu não consigo escrever “pára” sem acento. Há frases que podem até ficar totalmente incompreensíveis se se usar “para” e “para” na mesma frase. Não entendo o porquê disso. Acho também que há preocupação excessiva com uma unificação que não é possível. A língua é uma coisa viva, tomou vários caminhos e vai-se desenvolvendo de um lado e do outro. As duas versões são totalmente actuais e modernas.»
Jô Soares, Humorista e escritor brasileiro
«Nunca escrevi com o Acordo Ortográfico, nem mesmo quando dei aulas. Acho que o acordo é nocivo para a língua e é nocivo não só para o português de Portugal, mas para o português do Brasil e para as outras variantes todas. Ele não faz rigorosamente nada do ponto de vista semântico, as diferenças continuam as mesmas e é bom que assim seja.»
Ana Luísa Amaral, Escritora, tradutora e professora universitária
Inicia-se o escrito de Outubro com três citações de dois vultos da cultura recentemente desaparecidos. Na primeira dessas citações, o humorista Jô Soares refere-se à distinção entre “pára”, forma do verbo parar e “para”, preposição.
Os defensores do AO90 argumentam sempre que o contexto esclarece sempre as possíveis dúvidas. Veja o leitor, nas imagens que acompanham este texto, como três órgãos da comunicação social, desde há muito aplicadores do acordo, resolvem a situação. Acrescente-se ainda que, a propósito da lesão do futebolista Morato, o jornal Record utilizou a locução “vai parar”. Se o contexto resolvesse todas as dúvidas, tal não seria necessário.
Já em Abril do corrente ano, no artigo “Em Defesa da Ortografia XLVI”, apresentámos um número significativo de casos em que os órgãos da comunicação social não prescindem do acento, não respeitando o ponto 9.º da Base IX. Tomamos a liberdade de repetir esses exemplos: Quem pára Mbappé? (A Bola, 22/03/22); Bagaço a mais pára lagares no Alentejo (Correio da Manhã, 17/12/21); Magnus Andersson pára o jogo (O Jogo, 18/11/21); Simeone pára o treino do Atlético Madrid… (Record, 11/08/21); Travante Williams pára seis semanas (A Bola, 19/03/22); Condutor de carrinha com seis ucranianos não pára na fronteira da Roménia (Correio da Manhã, 17/03/22); Florian Wirtz pára sete meses (Record, 14/03/22); José Mourinho não pára de me surpreender (A Bola, 18/03/22); Renato Sanches pára três semanas por lesão (Record, 12/03/22); Dário Essugo: o clone de Palhinha que não pára de fazer história (Record, 06/03/22); O guarda-redes do Benfica pára um remate perigosíssimo de longe (Record, 06/03/22); Elina Svitolina escreve emocionada carta à Ucrânia: O meu coração não pára de sangrar.” (Record, 27/02/22); Na casa gilista o trabalho não pára (A Bola, 22/03/22); É certo que o campeonato agora pára (A Bola, 22/03/22); Brest não sabe onde pára o argelino (A Bola, 01/04/22); Alto e pára o carro! (Nascer do Sol, 02/04/22).
O que observamos, caro leitor? Os jornalistas que redigiram estas notícias, em nome da clareza e da inteligibilidade, esquecem-se do referido ponto da Base IX e redigem de uma forma que facilmente é compreendida. Na linha do economista e político Bagão Félix, reconhecem que o Acordo Ortográfico de 1990 “não é uma bandeira que nos une. É farrapo que nos divide.”
Se o caro leitor, tiver mau gosto ortográfico e escrever, na grafia do AO90, uma obra intitulada “A aceção de abjeto é uma exceção”, como será editada no Brasil? Lá terá o título “A acepção de abjecto é uma excepção”. A unidade essencial da língua é isto, ou, por outras palavras, fizemos um acordo para aproximar as variantes do português e nós passámos a escrever aceção, abjeto e exceção, enquanto os brasileiros continuam a escrever acepção, abjecto e excepção.
João Esperança Barroca
«O Acordo Ortográfico está a criar imensa confusão e novos erros, como a troca de “recessão” por “receção” ou de “conceção” por “concessão”. Também no Diário da República tiram consoantes a mais, como “união de facto” que lá aparece “união de fato”. O acordo tinha o argumento político e económico, mas só três países é que o aplicam e a circulação de livros entre o Brasil e Portugal não ocorreu.
É complicado voltar atrás e recompor livros e manuais escolares, mas antes mudar do que perpetuar alguns erros. As línguas devem ser deixadas em paz e o Brasil fará sempre o que bem lhe apetecer com a criatividade que tem em relação à língua.»
Luísa Schmidt, Socióloga
«Os defensores do Acordo Ortográfico de 1990 recorrem a um argumento de uniformidade que é simplesmente aporético. Essa uniformidade nunca existirá. Nenhum decreto poderá travar a progressiva diversidade inerente a uma língua partilhada por tantas culturas diferentes. Essa diversidade é um facto. E não tem de ser vista como um factor de separação ou empobrecimento; bem pelo contrário, é algo que enriquece a língua — e nos enriquece a todos.»
Rosa Maria Martelo, Escritora e professora da Faculdade de Letras do Porto
«Uma língua não é do Estado, uma língua é de uma nação. O caso do português, é de mais do que uma nação, estamos a falar da 5.ª língua nativa do mundo. E o que nós temos neste momento é uma desordem ortográfica imprópria de uma língua destas. Acho que ainda estamos a tempo de impedir este equívoco e de não sermos meros “espetadores”, quer dizer, “espectadores”.»
Bagão Félix, Político e economista
O nosso escrito do mês de Setembro contém, tal como o anterior, três citações.
A primeira delas aborda uma questão do maior interesse. Ao contrário do que foi afirmado pelos seus defensores, o Acordo Ortográfico de 1990 interferiu com a pronúncia. Com a remoção das consoantes ditas mudas, o falante tem tendência para fechar a vogal anterior, átona, como era expectável. É assaz curioso, para não dizer outra coisa, que Malaca Casteleiro, a par de Houäiss e Bechara, um dos pais do Acordo Ortográfico de 1990, tenha manifestado a sua preocupação com o fechamento das vogais no português europeu quando esse acordo contribui decisivamente para essa situação. Esta citação rebate ainda o argumento dos custos, usado para manter o AO90 em vigor. Os custos serão exactamente iguais aos da aplicação do acordo, custos esses que nunca foram contabilizados.
A segunda citação contraria a tese da uniformidade ou da aproximação entre as variantes das línguas. Se elas se vêm afastando há séculos, por que carga de água haveriam de se aproximar agora. Por decreto?
A última citação trata do caos ortográfico, que também é ilustrado pelas imagens que acompanham este escrito, exemplificativas das ortografias com que convivemos hoje: a de 1945, que se mantêm mesmo em órgãos que aplicam o acordo, a do AO90 e uma terceira onde cabe tudo, inclusive as maiores barbaridades.
Repare, agora, o leitor, baseando-nos num texto de José Carlos Fernandes, publicado no jornal Observador, nos procedimentos de duas línguas pouco dadas a malaquices, perdão, maluquices.
No inglês, no século XVII, com base nos étimos latinos foram reintroduzidas inúmeras consoantes, como, por exemplo: aventure passou a escrever-se adventure; dette passou a debt; doute tornou-se doubt; iland ganhou um “s” e ficou island; perfet recebeu um “c” e transformou-se em perfect; receit tornou-se receipt e verdit deu lugar a verdict. Repare o leitor que este último termo em português consta como sendo um dos casos de dupla grafia: veredito e veredicto. Não consta que as crianças inglesas tenham mais dificuldades por terem de escrever grafemas que não são pronunciados, como acontece em island.
No francês, se aparecesse a ideia peregrina de privilegiar o critério da pronúncia, a palavra femme escrever-se-ia fame; fille, fie; endroit, andruá; et, ê; voilá, vualá; salut, saliu; bisou, bisu; pendre, pandre. Isto permitiria, na perspectiva do jornal Expresso, uma considerável poupança.
A revista SÁBADO, na sua edição do dia 04 de Março, pediu a várias personalidades que dessem ideias novas e conselhos para o novo mandato de Marcelo Rebelo de Sousa.
Então, na página 66, podemos ler o conselho mais lúcido que, actualmente, poderia ser dado ao Presidente da República Portuguesa, tão alheado que anda de uma questão de extrema gravidade, e que está a por em causa a soberania nacional.
Origem da imagem: Mário Cruz/Lusa
O conselho é do Dr. António Bagão Félix, e é o seguinte:
5
BAGÃO FÉLIX
O ex-governante quer “desenterrar” uma polémica.
Talvez seja desenterrar, de facto, ou quase, admite: mas o que pretende é mesmo que o Presidente traga, de novo, à luz do dia a questão do Acordo Ortográfico, «enquanto não vai para o crematório». E argumenta: «é extraordinário que as posições de especialistas, de deputados, e até dos cidadãos, expressas numa petição não tenham resultado. E não faz sentido que Angola, Moçambique e Timor não tenham aderido, o Brasil aderiu à sua maneira, e em quase nada, e nós esqueçamos esta questão de soberania nacional».
E deixa uma discreta farpa: «O Presidente já se interessou por tantas questões de menor importância que esta…» (Revista SÁBADO, pá. 66)
Verdade.
No seu primeiro mandato, Marcelo Rebelo de Sousa andou sempre por aí, metido em todas as questões, no que devia, e até no que não era da sua competência.
Muitas vezes foi confrontado com a questão do AO90, em privado e em público (eu própria o questionei em várias Cartas Abertas e privadas) e o silêncio a que se remeteu só teve o efeito contrário àquele que ele próprio pretendeu, pois sempre se ouviu dizer que quem cala consente. E posto diante das inúmeras alusões ao facto de estar a violar a Constituição da República Portuguesa, ao aceitar a fraude mais do que comprovada, que todos sabemos ser o AO90, o seu silêncio o que significará, senão o de consentir o erro?
Mas não é apenas o Dr. António Bagão Félix que quer que Marcelo Rebelo de Sousa traga à luz do dia a questão do Acordo Ortográfico. Querem também os milhares de Portugueses, espalhados pelos quatro cantos do mundo, que se sentem defraudados e envergonhados com a mixórdia ortográfica em que se transformou a nossa Língua Portuguesa, que já nem sequer é Portuguesa, tendo, aliás, desaparecido, por completo, do Universo Internético.
Eu, pessoalmente, também quero que o Presidente da República Portuguesa traga à liça a questão do AO90.
Em 2019, por duas vezes, propus-lhe uma entrevista para que me respondesse apenas à seguinte pergunta:
Porquê o Presidente da República Portuguesa não defende a Língua Portuguesa, como é de seu dever, ao fazer o seguinte juramento: «Juro por minha honra desempenhar fielmente as funções em que fico investido e defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa», na sua tomada de posse, em 2016 e, nesta matéria, sendo o AO90 uma fraude, mais do que comprovada, ilegal e inconstitucional, como o afirmam TODOS os juristas, não só não está a desempenhar fielmente as funções em que ficou investido, como não está a defender, a cumprir e a fazer cumprir a CRP?
A resposta foi o mais profundo silêncio. Sempre o silêncio.
Contudo, queremos e merecemos saber, da boca do Presidente da República, por que motivo Portugal está a perder a sua soberania nacional, cultural e linguística, ao rastejar por aí, sem rei nem roque, e sem Língua que o represente?
É que uma Língua não é apenas um meio de comunicação. Uma Língua é essencialmente um vector de Identidade Nacional e Património Cultural Imaterial de cada país.
Ou isto não é da competência de um Presidente da República?
Esperemos que, sendo Bagão Félix a dizê-lo, o PR saia da caverna e venha explicar o motivo por que deixou chegar a Língua Portuguesa à condição de farrapo linguístico.
Porque muitos de nós já fizemos tudo para que ele desencavernasse, e nada.
A culpa deve ser tanta, que não aguenta a LUZ.
Isabel A. Ferreira
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