Um amigo meu, Pedro Soares, chamou-me a atenção para um programa exibido no Canal Globo, aos sábados, chamado “Sem Cortes”, apresentado pelo actor português Ricardo Pereira (suponho que ainda seja português), usando a fala brasileira, para se dirigir aos portugueses lá de casa, mas, suponho, para também e principalmente melhor se dirigir aos brasileiros que vivem em Portugal.
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Como a televisão, para mim, é para ver telejornais, documentários e filmes, apressei-me a confirmar esta absurdez, ou seja, um cidadão português dirige-se aos seus conterrâneos na fala brasileira, com todos os djis e tchis e gerúndios no devido lugar. Confirmado.
Porém, dado o rumo que o actual governo português está a dar a Portugal, já nada me surpreende nesta azáfama de nos impingirem, à força, a linguagem brasileira, na forma grafada e, pelo que ouvi, também falada, com a estúpida desculpa esfarrapada de que os Brasileiros são milhões a falar o Português.
Mas os milhões de Brasileiros falarão mesmo o Português?
É isto que me proponho a esmiuçar, com base no programa do Ricardo Pereira, que me levanta algumas questões:
A primeira é saber se o Ricardo Pereira se naturalizou brasileiro e optou por ter o Brasil como sua Pátria, fazendo o programa, muito naturalmente, com a fala brasileira. Se assim foi, calo-me já. Está no seu direito. É um brasileiro a falar na sua Língua. Nada a obstar.
Porém, e se o Ricardo Pereira não se naturalizou e não tem o Brasil como sua Pátria, por que motivo apresenta um programa dirigido aos portugueses lá de casa na fala brasileira? Isto intrigou-me.
Sabemos, desde há muito, que os Brasileiros têm muita dificuldade em entender o Português (perguntem aos alunos brasileiros que frequentam as escolas portuguesas, por exemplo) mas também sabemos que os Portugueses, entendem perfeitamente o Brasileiro. Como o programa se baseia em entrevistar actores brasileiros, será que o Ricardo Pereira, sendo português, optou por falar brasileiro, para que os entrevistados brasileiros e os telespectadores brasileiros o entendessem? Porque, o problema não é os portugueses lá de casa, estes entendem perfeitamente as duas linguagens, se não entendessem, as novelas e filmes brasileiros teriam de levar legendas, e não levam, como levam os programas falados em Português, passados nas televisões brasileiras (isto foi o que me transmitiram, mas não acredito, porque comigo é ver para crer, e no tempo que por lá andei, a televisão brasileira não passava programas portugueses.)
Questão: se realmente os Brasileiros e os Portugueses falam a mesma língua, o Português, que necessidade tem o Ricardo Pereira, sendo português, de falar à brasileira, num programa dirigido ao público português, mas também ao público brasileiro? Isto lembra-me quando uns editores brasileiros, interessados em publicar um livro meu, no Brasil, me pediram para o traduzir para Brasileiro (tal e qual), e eu recusei-me. Então? Não falamos a mesma Língua? Traduzir, traduz-se para uma língua estrangeira. Nessa altura, tive a certeza de que o Brasil não falava a mesma língua que eu, porque a minha Língua era a Portuguesa. A deles, era a Brasileira. E como domino estas duas línguas, desde a infância, para mim, ler os autores brasileiros, em Brasileiro, nunca foi obstáculo.
O meu amigo, ao expor este caso insólito, na sua publicação, refere: «Convido o sr. Ricardo Pereira a ouvir as centenas de brasileiros que estudam, trabalham, residem no nosso Portugal e verificará que, apesar dos muitos anos em terras lusas, estes nossos irmãos não traem a sua Língua. É bonito de ver e de ouvir. (…) Lembro-lhe Fernando Pessoa, conhece? “Minha Pátria é a Língua Portuguesa”. Qual é a sua Língua? Qual é a sua Pátria?»
Na verdade, os Brasileiros não abdicam da sua Língua (nem os Brasileiros nem nenhum outro estrangeiro, que entre eles continuam a falar as respectivas línguas), embora a adaptem ao vocabulário Português, porque em Portugal não vestem ternos, não andam de trem, nem de bonde, nem de ônibus, não vão ver os seus times de futebol favoritos, não vão ao açougue, não compram balas para os filhos, não tomam ducha, não têm um pet, não registram cartas...
Onde eu quero chegar com isto? A lado nenhum. Só quero dizer que algo vai mal nesta república DOS bananas de Portugal.
Isabel A. Ferreira