Vou contar-vos o que se passou hoje, quando me dispus a visitar a tenda, que, este ano, serve de Feira do Livro, do Correntes d’Escritas, a decorrer na Póvoa de Varzim.
Gosto de passear-me entre os livros. Entrei na tenda com boas intenções.
Mas dei dois passos e deparei-me com uma nova colecção das obras de José Saramago, e saltou-me à vista este título «OBJETO QUASE», um livro de 1978, agora reeditado em acordês.
Fiquei logo muito mal disposta e enervada e decidi sair da tenda, não antes de dizer às meninas, que estavam na “Caixa”, o motivo da minha saída abrupta, de que elas não tinham culpa, obviamente.
Ora acontece que fui apanhada nesta flagrante indignação, por uma professora que eu conhecia, e que me interrogou acerca do meu agastamento.
Disse-lhe o que tinha a dizer sobre esta imposição ilegal do AO90, e da vergonhosa vassalagem que se presta a tal predador da nossa Língua.
Ela retorquiu que, como professora, era OBRIGADA a aplicá-lo. Eu disse-lhe que não era. Ela respondeu que era, era… e que os alunos chumbavam se não o aplicassem. E eu disse-lhe que não podiam chumbá-los. E que tudo isso era ilegal.
E a discussão acendeu-se.
Nesse momento estavam dentro da tenda uns três escritores. Não sei se acordistas ou não, que ficaram a olhar-me, com um ar de quem estava diante de um extraterrestre.
Eu disse à professora que os professores (na generalidade) são os grandes culpados pelo facto de a nossa Língua andar por aí a rastejar pelo chão, como uma aleijada, e esfarrapada, como uma indigente, porque aceitaram submissamente, como um facto consumado, o AO90, sem sequer questionarem, se revoltarem, se interrogarem se seria ou não legal a sua aplicação, se seria ou não legítimo ensinar aos alunos portugueses a Língua Materna delas de uma forma deformada.
Foi então que a professora me respondeu assim: «Pode ser, mas NÃO ESTOU PARA ME INCOMODAR».
Pois… Esta é a grande verdade: os professores não estão para se incomodar. Então acomodaram-se, e o resultado é uma tragédia descomunal.
Se ao menos ELES (até porque a Constituição da República Portuguesa o permite) tivessem recusado aceitar entrar neste jogo insano, o AO90 já estaria no caixote do lixo, que é o lugar mais adequado para ele.
O «Objeto Quase» (livro que me falta, e poderia ter comprado) ficou na tenda.
À professora respondi: «Pois… para não se incomodarem, acomodaram-se…», e saí sem dizer mais nada. Para quê?
Já fora da tenda, mais furiosa do que um furacão, disse ao dono da livraria: «Vou embora, não quero enervar-me…» (mas já estava enervada).
E eu, que costumava gastar cerca de 200 Euros, na Feira do Livro, nas anteriores edições (pré-acordistas), do Correntes d’Escritas, gastei apenas onze euros, numa revista, onde se homenageia António Lobo Antunes, para chegar a casa e verificar que a revista estava escrita em acordês...
Ainda vou pensar o que farei com ela.
Isabel A. Ferreira