Num texto sob o título «De Costa a Costa - da “geringonça” à maioria», publicado no Jornal PÚBLICO, o cineasta António-Pedro Vasconcelos disse ao que veio: «O que não fez ou fez mal o anterior Governo de António Costa — e que se espera que corrija nesta nova legislatura.»
(O texto poderá ser consultado através do link que deixarei no fim desta minha exposição).
Uma análise com a qual concordei, na sua generalidade, contudo ater-me-ei apenas ao que António-Pedro referiu acerca do Acordo Ortográfico de 1990, ainda que de passagem - poderia ter aprofundado mais a questão, pois trata-se de algo visceralmente lesivo da Cultura e Identidade Portuguesas.
Depois de questionar «e o que não fez ou fez mal o anterior Governo de António Costa — e que se espera que corrija nesta nova legislatura?» António-Pedro enumerou três pontos: a imperativa reforma da Justiça; que o Ministério do Ambiente não esteja refém de lobbies; e «last but not the least, a definição do que deve ser o papel do Estado na Cultura, nas áreas do Património e das Artes Vivas (coisa que até hoje nenhum Governo fez), tarefa que deve ser assumida pelo primeiro-ministro e subscrita e apoiada por vários ministérios, e cujo orçamento passe a ser visto, não como uma esmola aos artistas, mas como um investimento e um direito, não apenas dos criadores, mas dos cidadãos **.»
Aos dois asteriscos finais corresponde o seguinte:
«** Incluindo a revogação imediata do Acordo Ortográfico, essa barbaridade que o anterior MNE, autoritariamente, decidiu manter em vigor, sem dar satisfações aos ministros da Educação e da Cultura (os que mais deviam ser ouvidos), um ato (sem c) que nos isolou ainda mais dos PALOP, ao aprovar uma ortografia absurda e que só nós adotámos (sem p), no conjunto dos países lusófonos.»
São os comentários à questão ortográfica, que o texto de António-Pedro levantou, que mais me interessa salientar, deixando-os aqui para reflexão:
Sim, é falso que no Brasil o AO90 tenha sido implementado. A grafia que corresponde ao AO90 e que foi imposta aos Portugueses DITATORIALMENTE, é a grafia que os Brasileiros sempre usaram (à excePção de umas poucas palavras e suas derivantes, e a acentuação e hifenização é outra coisa), e que os menos informados acham que é a grafia do AO90. Não é. É a grafia que corresponde à Base IV do Formulário Ortográfico Brasileiro de 1943, portanto, uma grafia muito anterior ao engendramento do AO90 por Antônio Houaiss, Evanildo Bechara e Malaca Casteleiro, (que lhe acrescentaram a hifenização e acentuação mais parva que já vi), e à Reforma Ortográfica Luso-Brasileira de 1945, a qual os Brasileiros rejeitaram depois de a ter assinado.
Isabel A. Ferreira
O texto de António-Pedro Vasconcelos, cuja leitura recomendo, pode ser consultado neste link:
Arthur Virmond de Lacerda, professor universitário, natural de Curitiba (Brasil) é um defensor da Língua Portuguesa, no seu País.
No Brasil, já quase ninguém escreve como o Arthur escreve. A grafia que ele usa neste texto é a grafia proposta pelo Formulário Ortográfico Brasileiro de 1943, pelo qual os Brasileiros optaram depois de terem descartado a Convenção Ortográfica Luso-Brasileira de 1945, assinada entre Portugal e Brasil, cuja grafia está em vigor em Portugal, porque a outra grafia, a defendida pelo AO90, é ILEGAL.
Contudo, se a grafia que o Arthur utiliza é a de 1943, o léxico é, em algumas frases, diferente do léxico português, e a formulação da escrita segue as regras gramaticais da Língua Portuguesa, em quase tudo.
Trata-se de um texto, cuja leitura recomendo, porque nem tudo o que parece é.
Isabel A. Ferreira
«IDIOMA ACHATADO»
Por Arthur Virmond de Lacerda
«Há muitos anos noto a crescente degradação do idioma, no Brasil. Trinta anos atrás, minha geração falava mal, porém sabia flexão de número (singular e plural), tempos verbais, pronomes, coisas que já se perderam, em parte.
A língua no Brasil mudou para muito pior. Dá vergonha ouvir como certas pessoas falam, como falam muitos do povo, e artistas, e políticos, e gente estudada. Dá vergonha o espírito de desleixo com o idioma; dá vergonha as pessoas não saberem mais usar corretamente os tempos verbais, os pronomes, os verbos, as palavras, a mesóclise, os pronomes contraídos.
Há simplificações (com a transformação de verbos transitivos indiretos em diretos) que denotam não que “português é difícil” (não, não o é) porém sim que as pessoas não o aprenderam ou, se o aprenderam, usam-no com o menor esforço (critério da preguiça e da mediocridade); por exemplo: proceda ao > proceda o; devido ao > devido o.
Mesóclise, sequer sabem que é, contudo incorporam todos os anglicismos que os maus sabedores de português inventam quando leem em inglês (investimento, alocar, evidência, massivo, força-tarefa, impacto, elusivo).
Também não se trata, apenas, de riqueza de vocabulário: está em causa a sintaxe e a construção das frases: cometem-se solecismos inaceitáveis vinte ou trinta anos atrás; a construção frasal é primária. As crianças em Portugal falam melhor do que muitos adultos brasileiros, o que inclui o pessoal acadêmico que, supostamente sendo ou devendo ser letrado, amiúde exprime-se e escreve mal.
Chegamos a tal ponto graças, também, aos teóricos populistas segundo quem toda mudança é bem-vinda e segundo quem a gramática normativa é elitista e anacrônica; também graças aos professores de português que ensinaram os seus alunos a sobrevalorizar a oralidade e a desdenhar da correção gramatical, como se a eficácia, a destreza, até a beleza da comunicação independesse da forma como se usa o idioma.
O resultado destes ideário e pedagogia é o de o brasileiro haver se tornado em povo relativamente obtuso, e a incapacidade de incontáveis estudantes de inteligirem textos, efeito cuja presença também se nota no pessoal acadêmico, em que mestres, doutores com doutorado e pós-doutores escrevem mal, praticam solecismos, manifestam carência de familiaridade com as formas elevadas de expressão no seu idioma. Escrevem por obrigação de ofício: é quando revelam seu despreparo, sua carência de traquejo com o vernáculo, a ocorrência e até a recorrência dos vícios e defeitos em voga. Nossos jovens doutores com 28 anos amiúde escrevem mal; juristas são piores, pelo pedantismo de seu juridiguês.
Outro resultado consiste na epidemia de cacoetes, vícios e defeitos, como o estúpido vício da duplicidade, com exclusão dos pronomes cabíveis ("Aristóteles redigiu livros e são importantes os do grego", em lugar de "Aristótoles redigiu livros; são eles importantes" ou "são importantes seus livros") ; o uso de palavras-ônibus (a exemplo do verbo ganhar: "Curitiba ganhou mais um restaurante") ; o gerundismo ("Vamos estar escrevendo") ; o apagamento da mesóclise ("Poder-se-á", "Dí-lo-ei"); a supressão do pronome reflexo "se" ("Fulano apaixonou, separou, aposentou" em lugar de "apaixonou-se, separou-se, aposentou-se") ; o emprego errado das preposições ("Ligue na central" em lugar de "Ligue para a central" ; "vaga que ele se candidatou", "empresa que trabalha") ; o desconhecimento da segunda pessoa do plural ("Vós sois", "Fizestes") ; o emprego errôneo dos tempos ("Vai querer ?" em lugar de "Quer ?"; "Aristóteles vai dizer" em lugar de "Aristóteles disse", vezo corriqueiro no mau estilo acadêmico) ; a conjugação errada da segunda pessoa do singular ("Tu veio", "Tu fez") ; o primarismo das construções ("Os primeiros dias choveu", "A gente acha que é bom para a gente"), a substituição de eu, ele, nós, pela reles locução "a gente", a invasão de anglicismos, tudo agravado com o desdém da gramática e com a exaltação da mudança pela mudança pois as "línguas mudam" : também mudam para pior, cujo outro efeito é a má qualidade da maioria das traduções brasileiras, dos últimos cerca de 40 anos.
As portuguesas sempre são melhores : em Portugal valoriza-se saber bem o idioma, falá-lo com escorreição, escrever com clareza e propriedade, traduzir com esmero e vernaculidade; contudo, a influência dos 300 mil brasileiros em Portugal e das telenovelas brasileiras há 50 anos, lá, vem introduzindo entre os portugueses os vícios, os solecismos, os empobrecimentos típicos da sub-instrução dos brasileiros ("Eu vi ele", "Ele deu a ela", "Ele se chama de Miguel"), para além de incontáveis expressões brasileiras (que não são erradas).
Já não se fala em Portugal com o estilo português puro e sim abrasileiradamente, como tudo que a fala brasileira tem de típico (não sendo errado) e de errado (que é muito). Portugal é colônia da escória lingüística dos brasileiros.
Em tudo isto nota-se a mudança do idioma, de cujos recursos, de cujas exatidão, lógica, beleza, muito se perdeu. Ele mudou para pior ; é espécie de infantilização.
Como em todos os assuntos no Brasil, sobre o idioma as pessoas muitas vezes emitem opiniões sobre o que não sabem, e fazem-no com emoção, não com razão, motivo por que geralmente bostejam e raramente alguém diz o que se aproveite. A doutrinação da sociolingüística e o antiportuguesismo inveterado (em gíria dir-se-ia "estrutural") contribuem fortemente para predispor as paixões contra a gramática e contra a forma culta, cujo efeito é o de coonestar o baixo nível em idioma e convencer o ignorante de que sua ignorância é o estado normal de sua inteligência. A vaca já foi para o brejo.
> > > > > > > > Leia assiduamente Machado de Assis, José de Alencar, Aluísio de Azevedo, José Saramago ; use o que aprendeu na escola ; consulte regularmente a gramática de Napoleão Mendes de Almeida ; procure alternativas aos vocábulos em voga ; consulte dicionários (porém desconfie dos eletrônicos e atualizados) fale com elevação, propriedade, riqueza ; entenda que as línguas mudam para pior e que a nossa é para quem usa sua inteligência.
Há, porém, corrente de brasileiros que se vem opondo ao achatamento do idioma : os olavinhos (parte deles, pelo menos). Olavo de Carvalho percebeu tal fenômeno (mas eu e Marcos de Castro também e creio que antes dele), denunciou-o e tentou contrariá-lo. Ele teve milhares de alunos e de seguidores, cuja inspiração passou a ser, em parte, a de cultivar o idioma. Nota-se, por exemplo, que as páginas eletrônicas das editoras "olavistas" e as de olavinhos são mais bem redigidas do que as do ambiente brasileiro em geral.»
Fonte:
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