Texto de Ana Cristina Pereira Leonardo
«Consolida, filho, consolida
É conhecida a inteligente farpa de Groucho Marx sobre a arte da política – e perdoem-me começar logo usando uma redundância, acrescida de um gerúndio e de uma dupla negativa: é que não há farpa de Groucho que não seja inteligente. Disse ele: “A política é a arte de procurar problemas, encontrá-los em todo o sítio, diagnosticá-los mal e prescrever-lhes o remédio errado.”
Transpondo as suas palavras para o universo mais restrito do chamado Acordo Ortográfico – restrito, mas ainda assim suficientemente amplo para nele caber a Guiné Equatorial, país onde por seu turno caberão uma dúzia de falantes de português –, iremos encontrar, via artigo recente de Viriato Teles, a definição magistral que dele fez Gregório Duvivier, um dos criadores da série “A Porta Dos Fundos”: “O Acordo Ortográfico é como a tomada de três pinos: criou uma solução para um problema que não havia.”
Chegada aqui, e não sendo razoável que se peça ao leitor o mesmo grau de conhecimento em matérias energéticas que se exige, por hipótese, a um Secretário de Estado da Energia – dando de barato que o presuntivo entretanto já aprendeu o que é crowding out –, esclareça-se que a “tomada de três pinos” é um modelo de tomada exclusivo do Brasil que se tornou obrigatório em 2001, a pretexto de oferecer maior segurança, o que até hoje nunca foi confirmado. A Portaria que o impôs, e que previa pesadas multas para os relutantes, foi assinada pelo então Presidente do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia, Armando Mariante Carvalho Junior, sujeito que se encontra sob investigação no âmbito do Lava Jato, tendo forçado 196 milhões de pessoas à sua observância compulsiva.
Quanto ao AO, ninguém até agora nos disse quanto rendeu o negócio. Para a Guiné Equatorial foi decerto lucrativo, já que, sem a entrada para a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, seria pouco provável que a filha de Obiang, presidente no poder desde 1979, alguns dos leitores desta crónica ainda não seriam nascidos, tivesse escolhido a Madeira para sede empresarial, o que já lhe terá rendido benefícios fiscais de 1,5 milhões de euros. Negócios à parte, a Academia Angolana de Letras voltou a insistir no Não ao AO, falando em “risco de deriva e desvirtualização da língua”.
Contas feitas, dos nove países da CPLP apenas Portugal, Brasil, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde (***) seguem o AO. Quatro. Mais um do que a tomada de três pinos.
Ana Cristina Pereira Leonardo»
Fonte:
https://www.facebook.com/ana.c.leonardo/posts/10213008606158487
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Apenas Portugal segue subservientemente, ilegalmente e obtusamente o AO90
(***) Sendo que Cabo Verde já não tem a Língua Portuguesa como língua oficial, que passou a ser o Crioulo Cabo-Verdiano. O Português é agora língua estrangeira, e como tal será grafada à brasileira (se realmente o é), o que retirou Cabo Verde do rol dos países lusófonos/lusógrafos.
Restando, portanto, Portugal, onde apenas os subservientes a um Poder, também ele subserviente, grafam à brasileira, ou seja, segundo o AO90; e São Tomé e Príncipe, onde predomina a Língua Francesa, e o AO90 não tem qualquer expressão. Porque no Brasil, os Brasileiros estão-se nas tintas para o acordo ortográfico. Os restantes países lusófonos/lusógrafos (Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e Timor-Leste) não seguem o AO90.
Conclusão: apenas Portugal segue subservientemente, ilegalmente e obtusamente o desacordo disortográfico, imposto pelos que têm dificuldade em escrever correCtamente, por isso, pugnam por escrever como falam. E como falam mal, escrevem mal. E entram num círculo vicioso engrenado por uma ignorância descomunal.
Isabel A. Ferreira
. «Acordo Ortográfico de 19...