Sexta-feira, 17 de Março de 2023

Marcelo fala de TUDO em todo o lado (quase) ao mesmo tempo. Só NÃO fala do AO90

 

Não sei se já repararam que o presidente Marcelo Rebelo de Sousa é a pessoa que mais aparece nas televisões, a falar de TUDO em todo o lado (quase) ao mesmo tempo, e se houvesse um Óscar para o protagonista deste “filme” à portuguesa, Marcelo recebê-lo-ia com certeza absoluta.

 

Numa entrevista recente, Marcelo referiu-se ao “costismo” como uma “maioria requentada", "uma maioria cansada". Porém, esqueceu-se de olhar para si mesmo, com olhos de ver. Se olhasse, veria que a sua actuação como presidente da República, peca pelos mesmos defeitos: uma conduta egocêntrica requentada, cansada e que esgota quem o vê, todos os dias, a todas as horas, em todos os telejornais, a meter-se em tudo, EXCEPTO no que JAMAIS lhe trará algum prestígio, ainda que fuja do assunto como o diabo foge da Cruz.

 

O erro já foi cometido, mas ainda vamos muito a tempo de o reparar. Não o fazendo, o DESPRESTÍGIO, que tal atitude irracional trará, será inevitável.

 

Marcelo sabe disso, mas ainda assim, espera um milagre (?), e RECUSA-SE a responder às mensagens que, ultimamente, um grupo de cidadãos portugueses (eu incluída), preocupados com a destruição, cada vez mais evidente, da Língua Oficial de Portugal, obviamente, a NOSSA Língua Portuguesa, usando-a como moeda de troca, para a introdução da sua Variante Brasileira, em Portugal, que lá por ser falada e escrita por milhões, NÃO significa que esses milhões tenham de USURPAR a Língua que outros milhões falam e escrevem, por esse mundo fora.

 

Desta destruição, que está a desqualificar o ENSINO em Portugal, os governantes portugueses, inclusive o presidente da República actual, terão de prestar contas aos Portugueses, até porque o acordo ortográfico de 1990, responsável pela mixórdia ortográfica vigente, foi imposto através de uma ilegalidade e de uma inconstitucionalidade, fazendo isto parte de um pacote luso-brasileiro anti-linguístico, mais brasileiro do que luso, uma vez que o tal pacote só interessa ao Brasil.

 

Não sei se já repararam que o PR assenta a sua INDIFERENÇA para com os Portugueses Pensantes, que DEFENDEM o que lhe competia a ele defender - a Língua Portuguesa -  na BAJULICE dos órgãos de comunicação social, que andam sempre a pô-lo num pedestal, se bem que num pedestal de barro. Ele NÃO tem UM amigo, sequer, que lhe diga que está a seguir o caminho errado, e que já não tem a noção do que faz e do que diz?

 

Vou dar apenas dois exemplos, a propósito da polémica gerada em torno da vinda de Lula da Silva ao Parlamento, discursar no 25 de Abril: Marcelo afirmou que «com o Brasil as relações são sempre doces», descartando que tal polémica tenha afectado as relações diplomáticas entre os dois países. Hoje, com o reacender desta polémica, ouvi-o dizer o seguinte, num dos canais das nossas muito subservientes televisões: «[a presença de Lula da Silva] é uma presença óbvia, tão natural como respirar».

Se eu não tivesse ouvido isto, não teria acreditado.

A presença de Inácio Lula da Silva - o impulsionador-mor do malfadado AO90 -  nas celebrações do “25 de Abril”  «é uma presença óbvia, tão natural como respirar», só porque ele é o Chefe de Estado de um País, com quem Portugal mantém relações amistosas, tão amistosas que como ex-presidente do Brasil, Lula da Silva foi fazer um discurso a Madrid, e nele culpou os colonizadores portugueses pelos atrasos [monumentais] da educação no Brasil, conforme pode ser recordado no link da imagem?

https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/12/151214_lula_colonizadores_mdb

 

Capture.PNG

A presença de amigos da onça, numa cerimónia oficial, será assim tão óbvia e natural como respirar?

 

Em que medida é que o “25 de Abril” foi assim tão importante para os brasileiros, como já li algures na Internet?


Então e a presença dos restantes presidentes das Repúblicas da CPLP, a cujos países o “25 de Abril” trouxe a descolonização? Não serão também óbvias e naturais como respirar?


*

Brasil e Portugal, dois países tão “irmãos” que o primeiro quer subjugar o segundo, através de um engodo, que apenas os cegos mentais não o vêem como tal: o engodo da Variante Brasileira do Português, que milhões de brasileiros falam e escrevem, e que irreversivelmente NÃO é mais a Língua Portuguesa; não é mais a “Última Flor do Lácio”, de que falava Olavo Bilac; não é mais o “o balanço doce das palavras de Vinícius de Morais”. É uma Língua feita de retalhos de outras Línguas, nomeadamente do Português, do “Americano”, do Francês, do Italiano, do Castelhano, e das Línguas Indígenas e Africanas.

 

Marcelo NÃO tem UM amigo, sequer, que lhe diga que ele está a ir por caminhos onde lhe estão a estender passadeiras vermelhas, para o bajular? O PR vai nu, mas ninguém se atreve a dizer-lhe isto.  Os amigos NÃO existem para bajular. Os amigos existem para serem sinceros com os amigos.

 

O PR NÃO é só para andar por aí a falar de TUDO em todo o lado (quase) ao mesmo tempo, EXCEPTO do AO90. O PR também é para RESPONDER às questões que os Portugueses lhe põem, relativamente a esse acordo, criado pelos brasileiros, o qual está a retirar-nos a NOSSA identidade.

 

Um presidente da República tem Obrigações e Deveres tão óbvios e naturais como respirar, para com o País e com o Povo que diz representar, e  aqui sim, o ÓBVIO e o NATURAL como RESPIRAR encaixa-se na perfeição.

 

E é em nome deste ÓBVIO e deste NATURAL como RESPIRAR que solicitamos a Marcelo Rebelo de Sousa que convoque todos os canais televisivos, rádios, jornais, enfim, todos os órgãos de comunicação social portugueses, para que, em direCto, possa explicar RACIONALMENTE aos Portugueses, por que motivo Portugal, que tem uma Língua com mais de 800 anos, uma das mais antigas da Europa, anda a rastejar aos pés do Brasil, com o intuito de, ilegalmente e inconstitucionalmente, fazer dela moeda de troca, para impor uma Variante, composta por um léxico, fruto de um cocktail  de palavras americanizadas, italianizadas, castelhanizadas, afrancesadas, e por acentuadas diferenças fonológicas, morfológicas, sintácticas, semânticas e ortográficas.

 

É que isto NÃO é uma atitude normal, num País livre e soberano, como Portugal. Ou Portugal, em nome da brasilidade que nos querem impor, já não será um País livre e soberano?

 

Isabel A. Ferreira

 

****

Comentários na Página do Facebook: 
PORTUGUESES E LUSÓFONOS CONTRA O ACORDO ORTOGRÁFICO 90

 

parvoíce.PNG

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 17:00

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Segunda-feira, 29 de Março de 2021

Engana-se quem diz que o Português é a Língua mais falada no Hemisfério-Sul e arredores

 

Há quem queira esticar a corda, para parecerem muitos, e justificar uma unificação de grafias que jamais acontecerá. E há também quem tenha a alucinante pretensão de que a NOSSA Língua Portuguesa venha a ser uma Língua oficial da ONU. Poderia até ser se esses “milhões” de pretensos falantes, falassem, de facto, Português. Mas não falam, nem escrevem em Português.

 

A matemática dos “milhões” (com um elevadíssimo índice de analfabetos) que serve de base ao insano AO90, peca por estar muito aldrabada. Senão vejamos por que é uma falácia dizer que “milhões” falam Português. Se bem que os oito países lusófonos, que integram a eivada de colonialismo e inútil CPLP, tenham (ainda) a Língua Portuguesa como Língua Oficial, por meros interesses político-económicos, mas não linguísticos.

 

lingua-portuguesa-no-mundo.png

Imagem: Reprodução

 

Porém, de facto, o único país onde se fala, quase a 100% Português, é Portugal, tendo o Mirandês também como Língua oficial. A estas duas Línguas acrescentem-se os dialectos Madeirense e Açoriano. E, no mundo, falar-se-á Português, onde quer que exista uma comunidade portuguesa, se bem que as novas gerações sejam, no mínimo, bilingues: falam a Língua dos Pais e a do País que os acolheu.

 

De resto, eis o que na realidade se passa:

 

- No Brasil, fala-se a Variante Brasileira,  oriunda do Português ou Crioulo Brasileiro, ou seja, uma línguaoriginada pelo contacto intenso do Português com as línguas, nativas ou não, faladas numa região;  a acrescentar a este, existem mais 274 línguas diferentes, faladas pelas 305 etnias indígenas; a estas, juntem-se mais as seguintes línguas regionais, bem enraizadas no quotidiano brasileiro:  Alemão, Castelhano (nas áreas fronteiriças), Hunsrik, Italiano, Japonês, Polaco, Ucraniano, Inglês, Pomerano, Talian, Chinês e Coreano.  

 

- Em Cabo Verde fala-se o Crioulo Cabo-verdiano, oriundo da Língua Portuguesa, usado no quotidiano das pessoas, como Língua primeira, e o Português, como Língua estrangeira. Isto, oficiosamente, porque a Língua oficial, continua a ser a Portuguesa, por motivos políticos.

 

- Em Angola a Língua oficial é a Portuguesa, contudo a maioria da população angolana fala, como primeira língua, algumas das línguas angolanas, a saber: o Umbundo, o Kimbundu, o Quicongo, o Chócue, o Nganguela, o Kwanyama, além de dezenas de outros dialectos.  

 

 - Em Moçambique a Língua oficial é a Portuguesa, mais utilizada no meio urbano. Contudo, existem 43 línguas nacionais, das quais 41 são línguas Bantu, faladas no meio rural, as quais me abstenho de mencionar por serem demasiadas.

 

- Na Guiné-Bissau predomina o Francês, nas universidades (por motivos de vizinhança) e o Crioulo da Guiné-Bissau, oriundo do Português, é a língua franca da Guiné-Bissau, e é falado por cerca de 70% da população total do país.

 

 - Em São Tomé e Príncipe, o Português como língua oficial é falado apenas virtualmente pela população, porque o que predomina são os crioulos desenvolvidos a partir do Português como o Forro, o Angolar e o Principense. Mas também é ali bastante falado o Crioulo Cabo-verdiano, o Português dos Tongas e resquícios de Línguas do grupo Bantu. Contudo, actualmente, o Francês e o Inglês são também profusamente falados no país.

 

- Em Timor-Leste, de acordo com a Constituição do país, o Tétum, que sofreu influências da Língua Portuguesa (uma Língua de elite em Timor), é a Língua Nacional, mas também Língua Oficial, que partilha com o Português. A estas, juntam-se mais as seguintes quinze Línguas Nacionais faladas pelo povo timorense: Ataurense, Baiqueno, Becais, Búnaque, Cauaimina, Fataluco, Galóli, Habo, Idalaca, Lovaia, Macalero, Macassai, Mambai, Quémaque e Tocodede. 

 

- Na Guiné-Equatorial, metida à força, no grupo dos países da CPLP, por questões meramente economicistas, NÃO SE FALA Português, mas sim o Castelhano e o Francês. Aqui tem-se a pretensão de criar escolas para se aprender o Português. Mas qual Português? Obviamente o Crioulo Brasileiro, oriundo do Português, aliás já bastamente disseminado pela Internet, com a bandeira brasileira.

 

- Em Macau já pouco se fala Português, a Língua predominante aqui é o Mandarim.

 

***

Feitas bem as contas, a Língua Portuguesa nem pouco mais ou menos é falada pelos “milhões” que, falaciosamente, os predadores da Língua Portuguesa (brasileiros e portugueses) propagam, para justificar a imposição (ilegal) do AO90.

 

O facto é que tudo bem espremidinho, e tendo em conta que Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e Timor-Leste não ratificaram o AO90, e que Cabo Verde tem o Crioulo Cabo-verdiano como primeira Língua, e São Tomé e Príncipe está-se nas tintas para o AO90, quem sobra para defender o indefensável? O Brasil, o mais interessado nesta questão, pois é a sua VARIANTE que pretendem impor à CPLP e ao muito servilista Portugal. E tendo ainda em conta que apenas uma fatia seguidista de Portugueses aplica o AO90, pretender que a Língua Portuguesa tenha a importância que lhe querem atribuir, no plano internacional, é da mais cristalina estupidez.


E sim, concordo com o que diz Olavo de Carvalho.

 

Olavo de Carvalho.jpg

 

Ao suficientemente idiota que apareceu no Brasil, somam-se os idiotas portugueses que, deslumbrados com os falsos “milhões” de falantes, e imbuídos do complexo de inferioridade que os faz rastejar aos pés do gigante, andam por aí a justificar o Acordo Ortográfico de 1990, com a colossal e imbecil falácia da defesa do papel da Língua Portuguesa à escala internacional.

 

Que papel? Que Língua Portuguesa?  A quem querem enganar e fazer de parvos?

 

E pensar que a Língua Portuguesa, GENETRIZ de toda esta diversidade e riqueza de Crioulos, que disseminou pelo mundo, está a ser empobrecida, esmagada, reduzida a uma insignificante imitação ridícula e imperfeita da Língua que já foi, dá-me ímpetos de maldizer todos (os que obrigam e os que se dizem obrigados a…, mas não são) os que estão a contribuir para este monstruoso retrocesso linguístico, sem precedentes na História de Portugal.

 

E citando Maria Alzira Seixo, ao comentar uma publicação no Facebook: «Obrigar as pessoas a escrever mal, nem o próprio Salazar o teria feito. Até porque Salazar sabia escrever, ao menos».

 

Isabel A. Ferreira

 

Nota: artigos que me levaram a escrever este texto:

Português, a língua mais falada do Hemisfério Sul

https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/portugues-a-lingua-mais-falada-do-hemisferio-sul-419517

A casa da lusofonia: riqueza linguística

https://eltrapezio.eu/pt-pt/opiniao/a-casa-da-lusofonia-riqueza-linguistica_18416.html

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 18:17

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Quinta-feira, 5 de Novembro de 2020

«Perda de Nave Espacial» - um conto que veio de Itália, em Bom Português, onde se fala da importância da linguagem e da preservação da diversidade cultural interplanetária

 

Matilde Maruri Alicante, autora deste conto futurista escrito por volta de 1995, é uma escritora italiana, bastante versátil, que ama muito Portugal e estudou a Língua Portuguesa com paixão, tendo viajado bastante pelo nosso País.

 

Matilde Maruri Alicante dá-me a honra de ser minha amiga, há longos anos. E do mesmo modo que ela ama Portugal, eu amo a Itália, e este facto contribui para que partilhemos as nossas duas Culturas e Idiomas, se bem que eu não seja capaz de escrever Italiano tão perfeitamente como ela escreve Português.

 

Matilde tem publicado vários livros sobre diferentes temas, alguns deles dedicados à agricultura biológica e à ecologia. Também escreve artigos para a Web e para revistas, especialmente sobre viagens e culinária, dois temas que facilitam os encontros pacíficos com culturas diferentes.

 

Também gosta muito de música e escreve letras para canções, que foram publicadas em alguns CDs.

 

***

A personagem deste conto chama-se João, é arquivista no Departamento Danos da P.U.A., uma Companhia de Seguros, com a tarefa de classificar as práticas definidas, dividindo-as de acordo com o idioma do sistema do planeta ou do sistema estrelar a que pertenciam, tendo sido adoptado um método diferente de divisão territorial: a da linguagem.

 

Outros elementos de avaliação, para que a um território pudesse ser dada a qualidade de nação unida, eram, juntamente com a linguagem, a arquitectura, os hábitos das pessoas e o tipo de cozinha.

 

O enredo situa-se num futuro possível, onde se pratica um intercâmbio de idiomas e de hábitos culturais, deixando intacta a variedade de costumes locais.

 

Recomendo vivamente a leitura deste conto, por dois motivos: por ter sido escrito num Português impecável, por uma escritora estrangeira, e por conter uma ideia de futuro, muito interessante.

Isabel A. Ferreira

(Clicar na imagem para ouvirem o coro no YouTube)

 

(…) na Terra tinha sido criado um coro em que participavam todos os habitantes.

 

Por Matilde Maruri Alicante

matildemarurialicante@gmail.com

 

«Perda de Nave Espacial»

 

João estava sentado no seu local de trabalho, numa grande mesa de escritório transparente, parcialmente ocupada por um teclado grande e alguns monitores quando o videofone enviou um sinal. Quando ele aceitou a comunicação apareceu a imagem sorridente do seu amigo Paulo.

— Como estás? — perguntou Paulo.

— Sinto-me como se tivesse sido bombardeado. — respondeu João — Tive a ideia de celebrar todos os primeiros dias da Terra, e fiquei acordado a beber champanhe a cada meia-noite. Fiz um brinde a cada minuto, a todas as horas. Encontras-me aqui, porque se tivesse ficado em casa para o trabalho, como de costume, teria arriscado adormecer no teclado.

— Parabéns! — disse Paulo, rindo.

— Obrigado. — respondeu João — também te desejo um Feliz Ano Novo. Então, vamos encontrar-nos amanhã de manhã para fazer jardinagem?

— Certamente. — Paulo confirmou — Às cinco e meia está bem?

— Para mim, sim. Vou dirigir-me directamente ao Parque das Magnólias. Quantos somos? Julgas que podemos terminar o trabalho em tempo para as Férias da Primavera? 

Paulo respondeu amavelmente às muitas perguntas do amigo. Ele tinha uma voz bonita e profunda, e estava sempre calmo, o que tornava muito agradável a companhia dele.

— Somos vinte e oito. Não te preocupes, João, naquela altura o Parque vai ficar esplendoroso.

— Bem, até mais tarde. — Concluiu João.

 

João terminou a comunicação e recomeçou a trabalhar. Era arquivista no Departamento Danos de uma grande Companhia de Seguros, com a tarefa de classificar as práticas definidas, dividindo-as de acordo com o idioma do sistema do planeta ou do sistema estrelar a que pertenciam. Seguia o turno 9/5, que é o que ia das nove da noite até às cinco da manhã, ideal para a sua natureza nocturna. Paulo era um dos seus melhores amigos, um daqueles com que, depois do trabalho, ia contemplar o nascer do sol, comer alguma coisa e passar o tempo até ao momento de ir dormir, para acordar ao entardecer, quando, com a energia lunar, a sua lucidez mental começava a aumentar.

 

Na verdade, falar sobre dia e noite já não tinha o significado de uma época em que a alternância da escuridão e luz marcava o ritmo de trabalho e descanso. Já há muitas centenas de anos que as actividades na Terra continuavam durante todas as vinte e quatro horas. Por outro lado, de nenhuma outra forma teria sido possível satisfazer a necessidade de manter a comunicação com dezenas de planetas que mediam o tempo com métodos diferentes. A única possibilidade era estar constantemente presentes e à escuta.

 

Esta decisão foi tomada por todos os governos dos planetas do sistema, no primeiro dia da terceira era astral. Desde então, todos os habitantes do planeta tiveram a oportunidade de escolher o turno mais congenial para eles. Na Terra foram estabelecidos três turnos: o primeiro, das nove da manhã até à uma da tarde, o segundo da uma da tarde até as às nove da noite, a terceira, das nove da noite até às cinco da manhã. Para abreviar e por piada, os trabalhadores do primeiro turno tinham sido apelidados de cotovias, os do segundo, cigarras e os do terceiro, corujas. Mesmo aqueles que tinham um trabalho independente tiveram livre escolha para trabalhar quando preferiam. A única condição importante era a continuidade de cada serviço, de maneira que todos, cotovias, cigarras ou corujas, que fossem, podiam fazer qualquer coisa em qualquer momento.

 

Durante o mesmo período, bem como uma divisão diferente dos turnos de trabalho, também havia sido adoptado um método diferente de divisão territorial, a da linguagem. Consideravam-se como pertencentes à mesma zona da Terra, os lugares onde as pessoas falavam a mesma língua, com o conceito de que para a homogeneidade da população e o bom funcionamento do comércio e dos assuntos internos fosse suficiente comunicar com a mesma linguagem.

 

Contudo, porque em todos os lugares era absolutamente proibido o isolamento, os habitantes dos planetas que estavam relacionados entre si deviam ser capazes de falar tanto a linguagem matemática universal quanto pelo menos três línguas além da sua própria, de maneira que fosse possível comunicar em qualquer lugar do próprio planeta e com um bom número de planetas em outros sistemas. Se, no decurso do tempo, por qualquer motivo, tivessem ocorrido mudanças na língua de um lugar, também se mudava a divisão do território. Uma comissão especial de estudiosos, que continuamente exploravam cada planeta, estava encarregada de tomar nota de todas as mutações, a fim de redesenhar as fronteiras territoriais quando as variantes do idioma indicavam que a mentalidade das pessoas já não era a mesma.

 

Outros elementos de avaliação, para que a um território pudesse ser dada a qualidade de nação unida, eram, juntamente com a linguagem, a arquitectura, os hábitos das pessoas e o tipo de cozinha.

 

Naquela altura, foi longamente debatido se não seria conveniente uniformizar a língua, as leis e costumes de toda a Terra. Concluiu-se que teria sido tão desconfortável e limitativo para os seres humanos que foi decidido aceitar a realidade tal como ela era, irredutivelmente multifacetada. Em vez disso, foi dado o impulso máximo para a melhoria dos sistemas de informação, que ao longo do tempo se tornaram tão rápidos e precisos para compensar quaisquer diferenças. Além disso, com a participação de todos os representantes das várias jurisdições territoriais, foi escrita uma Constituição Interplanetária que estabelecia de maneira simples os elementos básicos para o bom funcionamento da vida, que as pessoas respeitavam em todos os lugares. Desta forma foi alcançado o nível de uniformidade necessário para manter um sentido de coesão entre os habitantes de todos os planetas, deixando intacta a variedade de costumes locais.

 

O resultado dessas mudanças foi um alto grau de liberdade das pessoas, que podiam ir a qualquer lugar do planeta sempre se sentindo aceites, contanto que falassem a linguagem do lugar. Ocorreram casos de nações inteiras que, ao fim de se transferirem para outras jurisdições, tinham mudado completamente de alimentos, casas, e língua, e nunca a transferência foi negada, pelo princípio de que nenhum movimento interno poderia comprometer a integridade do planeta.

 

As estatísticas diziam que nos países onde tinha sido decidido adoptar uma diferente linguagem e cozinha, a fim de obter a transferência para outras jurisdições havia um alto grau de harmonia, que se havia criado especialmente quando todas as pessoas se tinham reunido no esforço e no trabalho colectivo para aprender o novo idioma e os novos hábitos alimentares. Também parecia que as mudanças tiveram uma influência positiva sobre o humor das pessoas, porque todos que se mudavam tinham a convicção de fazê-lo para melhor e ficavam satisfeitos.

 

Desta forma, a vida nos planetas estava sempre muito movimentada. Havia sempre alguém que estava a mover-se de um lado para o outro, e havia muitas escolas onde se aprendia línguas, modos de cozinhar e construção de habitações.

 

Também foram instituídos inúmeros centros interplanetários, muito frequentados, onde era possível estudar e praticar os modos de vida e de produção dos outros planetas conhecidos. Estes centros enviavam à Terra grupos virtuais de pessoas capazes de apresentar o modo de vida do planeta deles. Os terrestres, que queriam aprendê-lo, poderiam viver por um tempo com esses grupos, a fim de fazer experiência directa dos hábitos deles. Claro, também era possível o contrário, e os usos da Terra foram estudados em centros interplanetários de outros planetas.

 

Tal fervoroso uso de energia para a aprendizagem, ao longo do tempo, tinha produzido um efeito inesperado. Na Terra, as guerras acabaram. Parecia que as pessoas, atarefadas e ocupadas em criar algo, tinham perdido o desejo de gastar tempo em empresas destrutivas.

 

Muitos comprometeram-se a criar objectos, sistemas ou teorias que facilitassem a vida. Desta forma foram criados roupa e calçado resistentes a tudo, tornando possível viajar através do espaço sem qualquer dificuldade. Na verdade, até mesmo as viagens eram muito populares. As pessoas partiam para qualquer destino e por várias razões, desde as pesquisas geológicas à participação em torneios, aos tratamentos de SPA, meditação e estudo. Praticavam-se as actividades desportivas mais variadas, e cantar era uma grande diversão para a maioria.

 

Na Terra, tinha sido criado um coro em que participavam todos os habitantes. Todos aqueles que queriam cantar eram designados para uma secção, de acordo com o tipo de voz e o lugar onde viviam. Como não era possível que os participantes se reunissem num único lugar todos cantavam a partir da própria casa.

 

A distância entre os cantores fez surgir o problema de obter a unidade e a contemporaneidade da constelação de vozes provenientes de diversas fontes, que empregavam tempos diferentes para alcançar os pontos de escuta. Por isso, foi posto em órbita em torno da Terra uma grande estação de rádio, que captava o som das vozes de todos os cantores e fundia-as num som único. Aqui era onde realmente todas as vozes se harmonizavam entre si e o coro se formava. De lá, o som era retransmitido para a Terra para ser ouvido.

 

Encontrar a concordância certa entre todos foi um trabalho complicado, mas acabou por fazer parte da diversão. Às vezes, organizavam-se competições com outros planetas, e um júri interplanetário premiava os melhores coros.

 

Este processo foi começado por acontecimentos muito distantes no tempo. Por muitos anos, a humanidade havia sido consumida por guerras devastadoras, desencadeadas pelas causas mais diferentes. Tentou-se evitá-las ou limitá-las de várias maneiras, mas quase sempre em vão, até que se decidiu deixar tudo acontecer.

 

A partir desse momento realmente aconteceu tudo, muitas pessoas tinham morrido e muitos países tinham sido destruídos, enquanto a Terra mergulhava no caos. Contudo, curiosamente, juntamente com as guerras e destruição, até mesmo o exacto oposto acontecia, pois nas pessoas nascia o desejo e a necessidade de reconstruir, de qualquer forma, o que tinha sido destruído e experimentar o prazer de fazer, de inventar, de criar e construir. Todos aqueles que tinham construído algo estavam preocupados com o facto de uma nova guerra poder destruir a produção deles e estavam interessados em não fazer desencadear outras.

 

Foi assim que com o tempo a antiga tendência bélica cessou. Como cada vez menos pessoas estavam dispostas a combater, já não foi possível formar exércitos, e os governantes que queriam fazer a guerra contra alguém não tinham quem a fizesse. Para satisfazer o seu próprio desejo de poder, por vezes organizaram duelos entre eles, com a ideia de que o vencedor do duelo venceria a guerra e ganharia o poder. Não funcionou, era uma ideia demasiado estúpida, mas ver chefes de Estado em estádios e arenas a lutar com punhos, com armas de fogo, espadas, paus e de outras formas fantasiosas foi um espectáculo muito divertido para toda a população.

 

Não durou muito, porque eles próprios, os chefes de Estado, além de não ter a mínima preparação física e psicológica, compreenderam que isso tudo era ridículo e sem sentido, abandonaram a ideia por completo e começaram a tentar encontrar acordos e colaborar. Descobriram então que não era impossível.

 

Então, estranhamente e, paradoxalmente, as guerras terminaram apenas quando não se tinha feito nada para evitá-las.

 

Todavia, foi uma época terrível, um período obscuro que durou centenas de anos, e mesmo naquele tempo, mesmo quando no final tudo tinha terminado bem, os historiadores não tinham certeza se deixar tudo acontecer tinha sido uma boa ideia. Em qualquer caso, as coisas tinham corrido assim.

 

Entre os muitos amigos de João também havia Gri, que vivia num mundo onde o modo de vida era parecido com o praticado na Terra, muitos séculos antes. João tinha-a conhecido no dia em que todos os coros terrestres tinham cantado juntos para celebrar o aniversário da Grande Paz. Gri ficou fascinada com aquele canto de milhões de vozes, e na tentativa de entrar em contacto com algum terrestre, encontrou João. Ele tinha-lhe explicado que cantar era uma arte cultivada por quase todos na Terra, porque harmonizava e facilitava a comunicação, também explicando como eles tinham conseguido superar as dificuldades relacionadas com as distâncias e diferenças de tempo.

 

A partir de então eles sempre se mantiveram em contacto. Graças a ela, João conseguiu um conhecimento profundo de muitos factos do passado, cuja documentação tinha sido destruída durante o longo período de guerras. Com grande emoção João havia estudado todos os eventos que tinham levado ao que foi chamado de Unificação, a união de todos os países e povos da Terra, e o longo debate sobre a conveniência de unificar também as línguas e costumes, um debate que se tinha concluído com a decisão unânime de aceitar a existência da diversidade, considerando-a um valor e uma fonte de ensino.

 

No entanto, por vezes, os discursos de Gri irritavam um pouco João. Na opinião dela, por exemplo, os terrestres estavam demasiado envolvidos em trabalhos, reservando pouco tempo à diversão.

 

Neste ponto João não tinha a certeza de entender bem. Claramente ele entendia a fórmula que Gri usava para definir a diversão, mas porque na Terra a mesma fórmula era utilizada para indicar o trabalho, excepto por um factor que indica a existência de um pagamento, um factor que era adicionado ou removido conforme o caso, intuía que Gri talvez estivesse a referir-se a outra coisa. Formulou a hipótese de que fosse beber, embebedar-se, dançar desenfreadamente, fazer barulho e confusão, mas não quis aprofundar.

 

Igualmente, escapava-lhe o conceito de riqueza, que Gri explicava com a fórmula "possuir muitos objectos". Ou, melhor, porque a hipótese de não possuir muitos objectos, não ter riqueza, não serem ricos, devia causar, na opinião dela, um sentido de falta e sofrimento. Em conclusão: ele não compreendia porque é que as pessoas podiam sofrer por não serem ricas (ou "não possuir muitos objectos"). De facto, ele, em nenhuma das suas muitas viagens, tinha encontrado alguém que parecesse "possuir muitos objectos", embora ninguém deles se queixasse por um sentido de falta de qualquer coisa e parecesse sofrer por isso.

 

João neste caso considerava muito estranhas as fórmulas matemáticas de Gri. Ele compreendia os termos um por um, mas não conseguia alcançar o resultado final. Às vezes, ele tinha a sensação de que pertenciam a outro sistema matemático.

 

Outro ponto em que a sua amiga levantava objecções era no que respeita aos edifícios e às casas. Estas pareciam-lhe muito extravagantes no exterior, e sempre muito "vazias" no interior. Pelo contrário, João considerava as casas da Terra muito lindas. Todas. As subterrâneas, as grandes plataformas na água, aquelas em forma de ovo ou de cúpula, as grandes pirâmides. Cada uma tinha a sua própria razão de ser construída daquela determinada maneira e naquele determinado lugar, cada uma era um laboratório para absorver luz e calor e ou rejeitá-los, para reabastecer elementos úteis, como água e processar resíduos. Ele tinha uma predilecção especial pela casa de Kyria, uma espécie de cogumelo muito alto, no qual se tinha continuamente a sensação de partir em voo.

 

Gri julgava apenas aceitável o edifício de quarenta andares que era a sede da P.U.A., a Companhia de Seguros para a qual João trabalhava, talvez porque este fosse parecido com as construções do planeta dela. Na verdade, o prédio reflectia um certo grau de atraso, era preciso dizer, tal como a empresa e a sua propensão para as hierarquias. A cada andar correspondia uma posição mais ou menos influente no trabalho, e este sistema tinha o poder de criar uma mentalidade em que as palavras "alto" e "baixo" estavam ligadas subtilmente e obscuramente ao valor das pessoas que ocupavam o andar. Embora João, como a grande maioria dos terrestres, trabalhasse na sua casa, mantendo-se razoavelmente alheio a essa influência, ele compreendia que, de alguma forma, era igualmente tocado. E isto não lhe agradava muito.

 

João continuou a armazenar documentos. A um certo ponto virou a cabeça para espirrar e... viu dois indivíduos que pareciam enormes morcegos, um mais claro e um mais escuro. E o espirro ficou por dar.

 

— Quem são vocês? — perguntou alarmado, levantando-se precipitadamente.

Os dois estavam à frente dele, imóveis.

— Silêncio — ordenaram eles — Senta-te.

João sentou-se e ficou imóvel, mais pela surpresa do que pelo medo, a observá-los com atenção. Eles eram mais altos e grandes do que qualquer terrestre, e pareciam seres racionais. Conversaram por um momento entre eles, numa língua desconhecida, fazendo um barulho como um ventilador que chiasse pondo-se em movimento:

Ppprrrrcccssssfffnnntttttmmmnnnntttnnntttllllgggnntttvvvvmmmssstttnnntttrrrr

Depois, um deles perguntou:

— Quem és tu?

— O meu nome é João.

— O que estás a fazer aqui? — insistiram os dois.

— Este é o meu trabalho. Pergunto o que estão a fazer vocês! — João respondeu numa voz irritada.

— Silêncio. Temos de te eliminar. — Decretaram os dois.

 

Em João a surpresa superava o medo, tanto que a única coisa que consegui dizer foi:
— Porquê?

— Lembras-te de que há algum tempo se perdeu uma nave espacial em voo do planeta X428 para o planeta Yh3 após uma aterragem de emergência em Zy18?

João era um bom arquivista, com boa memória e conseguia lembrar-se do incidente. Parecia-lhe completamente sem sentido que dois estranhos tivessem chegado tão longe do nada e se apresentassem dessa forma apenas para pedir informações sobre uma prática arquivada. Podiam simplesmente enviar-lhe uma mensagem, poupando tempo, energia e ameaças aterrorizantes.

No entanto, ele respondeu de maneira neutra, tal como óptimo profissional que era:

— Sim. Sei que foi aberta uma prática para a regularização.

Os dois observaram-no por um tempo, ameaçadoramente, ou assim julgou João, depois começaram a pressioná-lo com perguntas e pedidos de esclarecimento. Para João, ficou claro que só queriam respostas prontas, precisas e concisas e que quanto mais ele hesitasse, tanto mais ele iria irritá-los.

— Sabes também que o prejuízo não foi pago? — perguntaram os dois.

— Sim. — confirmou João — Não era indemnizável. A perda ocorreu antes do início da garantia.

— Isto é o que afirma a P.U.A., mas deves ter em conta o facto de que o navio estava a viajar num sistema com o tempo diferente do da Terra, e para determinar que o dano não era indemnizável, porque a perda ocorreu antes do início da garantia, vocês teriam de fazer a conversão do horário.

— Não compreendo. — Objectou João — Esta operação é realizada normalmente, e foi realizada, como sempre.

— Claro, mas é preciso fazê-la correctamente. — Objectaram os dois ao mesmo tempo — Neste caso, o planeta em que ocorreu o acidente é parte de um sistema cujos horários ainda não estão definitivamente codificados. A P.U.A conseguiu ter vantagem nisso, para elaborar a tese de que o prejuízo não é indemnizável, ignorando evidências claras tais como as gravações de sinais de alarme lançados a partir da nave antes de se precipitar, e captado por pelo menos cinco planetas, com horários diferentes dos da Terra, mas codificados e reconhecidos. Através deles é possível determinar, com precisão absoluta, quando o episodio ocorreu. E naquele tempo o risco estava coberto.

— E se o que vocês dizem é verdade porquê a P.U.A. não tomou em conta as evidências apresentadas? — Perguntou João.

— Para evitar uma despesa, claro. Não é a primeira vez, já sabemos isso, que a P.U.A. intenta fazer operações semelhantes, mas eles não vão acabar com esta. O Conselho do nosso planeta decidiu não o permitir.

— Vocês poderiam recorrer para o Conselho Interstelar.

— Já fizemos isso, e estamos à espera de uma decisão deles, mas, ao mesmo tempo, decidimos punir a P.U.A. destruindo a sede deles. Agora temos de eliminar-te a ti, que tentarias avisar o Centro de Vigilância, da nossa presença.

João ficou pálido, mas conseguiu controlar-se e, com o máximo de dignidade possível, propôs:

— Não façam isso! Não me matem, eu posso ajudar.

— Como julgas que podes ajudar?

— Posso fazer com que vocês obtenham a compensação para o navio perdido.  Posso autorizar a regularização, sem que ninguém se aperceba de nada. Pensem nisso, seria conveniente para vocês.

— De acordo, aceitamos. — disseram os dois ao mesmo tempo — Agora descreve com precisão e em pormenor tudo o que vai acontecer para se obter o resultado do que estás a prometer. Declara todos os gestos e movimentos que vais fazer e cuida de fazer isto com muita precisão. Se algo não corresponder vamos eliminar-te.

 

Então João explicou o procedimento com meticulosidade, enquanto os dois ouviam atentamente. Teria sido necessário ir até ao trigésimo nono andar e trabalhar a partir do computador do chefe do ramo Aeronaves, Departamento Danos, chamando o ficheiro para confirmar a ordem de pagamento. João silenciosamente esperava que isto acabasse bem para ele.

— Não te preocupes. — disse um dos dois extraterrestres - Se fizeres tudo o que disseste, não estás a correr riscos. Lembra-te de que que nós estamos aqui porque foi cometida uma injustiça contra nós. Atacar sem razão não é nosso hábito.


João experimentou uma sensação estranha. Na verdade, não foi a primeira vez que aconteceu desde que aqueles dois tinham aparecido. Sempre que olhavam para ele, parecia-lhe ser atravessado por uma onda. Era uma sensação tão subtil, vaga e nova que ele não conseguia analisá-la, menos do que nunca na condição de humor em que se encontrava naquele momento. Ele tinha mesmo a impressão de que os dois eram cegos, embora se apercebessem de qualquer coisa com precisão. Quase parecia que eles não viam com os olhos, que também tinham, mas de alguma outra forma misteriosa. Talvez ele estivesse errado, mas… lembrou-se de um velho ditado do seu avô: "Nada vem do vazio". Talvez, pensou, nem este sentimento surgisse do vazio, do nada. Em qualquer caso, não havia tempo para pensamentos desses. O facto era que os dois entendiam perfeitamente tudo o que estava a acontecer ao redor deles, e qualquer especulação era inútil.

 

Os dois extraterrestres fizeram-lhe um sinal para ele agir. João extraiu o file do arquivo e inseriu-o na memória do computador do chefe do Ramo Aeronaves, Departamento Danos. Depois, seguido pelos dois, deixou o seu escritório e dirigiu-se para a Sala dos Elevadores, uma grande sala com paredes e chão brancos. Naquele momento ele teve uma ideia: se tivessem apanhado o elevador número quarenta em vez do número trinta e nove, teriam chegado directamente à Sala de Vigilância, onde os extraterrestres teriam sido capturados. Uma boa acção, que teria impedido os dois de conseguir o que queriam, enquanto ele, graças a este acto de heroísmo, poderia obter a promoção que desejava. Esperou conseguir, o número do elevador estava gravado na placa do comando de chamada, talvez os dois não tivessem reparado em nada. João parou em frente do elevador número quarenta.

— O que está a acontecer? — perguntou um dos extraterrestres.

— Como? — João perguntou, fingindo não compreender, enquanto as suas costas eram atravessadas por um calafrio.

— Há algo errado. — Continuou o outro extraterrestre.

— Estamos no lugar errado. — Conclui o primeiro, com uma voz ameaçadora.

— Não digam disparates! — protestou João — Estamos na Sala dos Elevadores, em frente do elevador número trinta e nove, que nos levará aos escritórios do Ramo Aeronaves...

Os dois interromperam-no com uma ordem:

— Verifica o número do elevador!

João fê-lo, com a sensação de que a sua vida estava perigosamente em risco.

— Vocês estão certos — confirmou debilmente, depois de fingir verificar — estamos no lugar errado. É o número quarenta...

 

Um dos dois extraterrestres interrompeu severamente a tentativa de justificação de João:

— Continua, terrestre. Não estás a correr risco de vida, se executares exactamente o que disseste, então acalma-te. Mas lembra-te de que não deixamos passar nada. Não faças outros erros de qualquer tipo.

 

João calou-se, perguntando a si mesmo como aqueles dois tinham sido capazes de se aperceberem de algo que não era visível, porque as portas dos elevadores eram todas iguais e o número não estava escrito em nenhum lugar visível. Em qualquer caso, ele abandonou a ideia de evitar esse pagamento à P.U.A.. A sociedade tinha dinheiro, podia pagar, e talvez aqueles dois estivessem a agir no seu direito. Não era a primeira vez que João tinha visto rejeitar injustamente a regularização de um dano.

 

Chegaram ao trigésimo nono andar e as portas do elevador abriram-se, em frente de um espelho enorme. Automaticamente João observou a imagem e viu um homem jovem e bonito, com cabelos loiros e corpo atlético, a única figura que espelho reflectia. Voltou-se para atrás com um sobressalto, à procura dos morcegos com o olhar. Os dois estavam lá, a meio passo dele. João perguntou porque não tinha visto a imagem deles no espelho.

— Vai para a frente — ordenou um dos dois. Depois, com uma gargalhada infantil que parecia uma chiadeira, ele continuou:

— Não percas tempo a olhar para ti, és feio e assim vais ficar.

Essa observação irritou João. Pensou que se entre os três havia alguém que poderia ser chamado feio, certamente não era ele. Todavia, naquele momento a coisa mais importante era descobrir por que não tinha visto a imagem dos dois, que estavam ao lado dele. Mas os dois extraterrestres não lhe deram tempo para pensar.

— Depressa! — ordenaram, interrompendo as suas reflexões.

 

Chegado à mesa, João começou a operação. De repente lembrou-se de que de cada escritório poderia lançar um alarme. O sinal chegava directamente à Sala de Vigilância, da qual os guardas partiam para fazer um controle imediato. E Sala de Vigilância era apenas um andar mais acima. João pensou que talvez conseguisse, teria sido suficiente carregar numa tecla, no mesmo teclado em que estava a trabalhar.

 

— Pára! O que está a acontecer? — A voz de um dos extraterrestres paralisou-lhe os dedos.

— Calma, não está a acontecer nada. — respondeu João.

— Porque estás a agitar-te, então? — perguntou o extraterrestre.

— Não estou a agitar-me, estou agitado. — Salientou João.

— Tens de ficar agitado de maneira constante, então. — Disse um dos extraterrestres — Se tiveres um pico, eu estou autorizado a pensar que algo de anormal está a acontecer.

Um pico? João tentou adivinhar o que o morcego estava a dizer exactamente. Um pico, sim, mas um pico de quê? Depois teve uma espécie de iluminação. Talvez os dois fossem capazes de medir o seu electroencefalograma, ou até mesmo ler os seus pensamentos? Teve a desagradável sensação de que não iria participar nas próximas Festas de Primavera.

— Tu és estúpido, terrestre. Feio e estúpido. Deixa de especular e fazer tentativas para salvar a tua empresa desonesta e continua o trabalho. Faz o que disseste e vais participar nas tuas Festas de Primavera.

Os dois resmungaram entre eles, enquanto João fechou os olhos. Era assim, concluiu, lêem o pensamento! Continuou a inserir dados, resignado. Faltava pouco para acabar.

— Acabei. — disse um momento depois — Agora a regularização está autorizada e a operação é irreversível. Digam-me onde e como vocês desejam que o valor seja pago.

Os dois deram-lhe instruções e num instante tudo foi feito. João estava aliviado. A P.U.A. teria de pagar uma soma enorme, mas a vida dele estava salva.

 

De repente, ouviu-se um barulho. Certamente era uma patrulha de vigilância. João levantou-se rapidamente e dirigiu-se correndo para a saída, tal como os dois extraterrestres. Correndo desordenadamente perdeu o equilíbrio, vacilou numa tentativa de mantê-lo e, finalmente, caiu sobre os dois. Ou melhor, no chão, porque os dois tinham a consistência do ar.

 

João ficou deitado no chão. Não estava a compreender absolutamente mais nada. Aqueles dois estavam lá à frente dele, mas era como se não existissem. Com um fio de voz perguntou:

— Mas... mas... mas quem são vocês?

— Terrestre, tu és realmente estúpido. — insultaram-no os extraterrestres.

João então irritou-se.

— Já chega! Vocês ameaçaram-me de morte, forçaram-me a trair a empresa em que trabalho, e...

— Pára um momento. — responderam os dois. Eles costumavam falar juntos, de facto, mas tão em uníssono que as duas vozes se fundiam em uma — porque "forçado a trair"? Tu és que propuseste ajudar-nos a recuperar o que nos pertence. Tínhamos de recusar?

João gritou:

— E eu o que deveria ter feito, na vossa opinião?

— Deixar-te eliminar. — responderam os dois ao mesmo tempo, imperturbáveis — Desta forma terias sido fiel à tua empresa. Evidentemente não era isso o mais importante para ti. Se não tivermos entendido mal, e nós dificilmente entendemos mal, tu estás muito mais interessado em tornar-te chefe do teu departamento e participar nas Férias de Primavera. De que te queixas? Agora estás vivo, podes fazer isso. Além disso, ouve bem, e a menos que não sejas completamente estúpido, tens de entender que não cometeste nenhuma traição.

— Expliquem-se melhor. — João ordenou.

— O que terias feito se tivessem ameaçado a vida do teu amigo, aquele que ligou para ti e com quem irás cuidar das plantas, no Parque das Magnólias?

— Teria tentado impedi-lo. — respondeu com decisão João.

— De que maneira? — indagaram os dois.

— Não sei, teria tentado desarmá-los. — João respondeu, irritado com a insistência de tantas perguntas dos dois indivíduos.

— Terrestre, não estamos armados. — Observaram os dois, com uma expressão indefinível.

João olhou para eles com os olhos arregalados, reparando que realmente não estavam armados. Contudo, ele não podia acreditar nos seus olhos. Teria jurado ter visto umas armas. Queria ter tido tempo para reflectir, mas os dois extraterrestres continuaram a argumentar de maneira insistente:

— Em qualquer caso, estarias disposto a arriscar a tua vida.

— Paulo é o meu amigo mais querido! — defendeu-se João.

— E a tua amada empresa? — insinuaram os dois — Porquê não tentaste "desarmar-nos" para salvar os interesses dela?

— Não é a mesma coisa! E em qualquer caso eu tentei, mas correu mal. — João levantou novamente a voz.

— Sim, não é a mesma coisa, mas em que pensaste, realmente, em frente do elevador? Na vantagem da tua empresa ou na possibilidade de conseguir uma promoção?

João ficou em silêncio. A maneira de agir dos dois e o tom de voz deles incomodava-o enormemente, mas não conseguia encontrar as palavras para contradizê-los.

— E sabes por que ficaste tão rapidamente convencido a "trair", como dizes, a tua empresa?

João não respondeu e os dois continuaram:

— Porque sabes bem que temos razão, que a P.U.A. estava errada nesta ocasião e em muitas outras. O que temos dito confirmou o que já pensavas. Se tivesses uma opinião diferente da tua empresa, se estivesses convencido de que é irrepreensível, se tu mesmo não tivesses culpas para imputar-lhes, não terias sido tão condicionável. Terias ousado mais, como para defender a vida do teu amigo Paulo.

João seguia atentamente as argumentações dos dois extraterrestres. As palavras deles, que apenas alguns minutos antes chamava mentalmente de "monstros", inspiravam-lhe um sentido de respeito. Mesmo a palavra "morcegos" parecia apagada da mente dele.

— Por que caíste no chão em vez de caíres em cima de nós, como acreditavas? — continuaram os dois.

— Porque vocês não têm um corpo concreto. — João respondeu num sussurro.

— E por que não viste a nossa imagem no espelho, e com os teus olhos, podes ver-nos muito bem?

João lembrou-se da cena do espelho. Perguntou-se novamente por que ele não os tinha visto. Depois, como se estivesse a falar para si próprio, disse em voz alta:

— Realidade Virtual.

Falou um dos dois, o da cor mais clara:

— Sim, João, somos imagens. O meu nome é Siochain. O do meu amigo é Ceartas. Fomos projectados aqui do planeta Moraltacht com a tarefa de obter uma indemnização pela perda da nossa aeronave. Julgamos que não é justo permitir que acções ignóbeis, tais como a que a P.U.A. queria cometer contra nós, tenham sucesso. No nosso planeta há um maior grau de conhecimento e   muitos de nós, incluindo Ceartas e eu, temos poderes telepáticos.

Ao ouvir estas palavras um pensamento cruzou a mente de João.

— Não te entusiasmes, João. — exortou-o Siochain, rindo — É preciso treinar para pensar bem, e ter muita consciência para obter o privilégio da telepatia. É um poder recíproco. Agora considera isto: tu conheces bem a realidade virtual, pois os terrestres fazem grande uso dela, mesmo que de forma rudimentar. Além disso, tu ignoravas a existência de seres com a nossa aparência. Pensaste que éramos horríveis, embora, lembro-te, para os nossos cânones tu é que és horrível, mas nem por um momento nos questionaste, suspeitaste de nós. Atribuíste-nos mesmo a posse de armas, que não temos. Sabes porquê?

João não respondeu, e Siochain continuou.

— Porque "nada nasce do vazio", como dizia o teu avô, um conceito em parte para rever, mas que faz sentido. E isso significa que o pensamento de que uma injustiça já havia sido cometida já estava na tua mente, a nossa aparição captou essa ideia, tornando-a realidade. É por isso que aceitaste facilmente a nossa presença e até mesmo tiveste medo de nós. Pelo contrário, não correste nenhum perigo, João. Poderias defender a tua causa com um sopro, com uma palavra, se tivesses tido mais coragem, mais determinação, se estivesses convencido de que era uma boa causa.

Naquele momento, a patrulha de vigilância entrou na sala. Um deles exclamou:

— Ei, aqui há um fulano deitado no chão que está a falar com os seus botões!

— Está bêbado. — Acrescentou outro.

— Sim, parece que está bêbado. Nem é o único, hoje. O que vamos fazer?

 

— Deixamo-lo aqui. Não está a fazer nada de mal e vai restabelecer-se em poucas horas. Isso só significa que a P.U.A. vai pagar para ele dormir um pouco. Pode pagar, tem dinheiro.

 

Todos riram.

As duas imagens em forma de morcego ainda estavam perto da porta. Parecia que estavam a ir-se embora. João disse-lhes adeus com os olhos. Achou que depois de tudo não estavam tão mal. Talvez o quadro desse plano superior melhorasse tudo, mas agora eles não lhe pareciam nem feios nem morcegos. Na verdade, não conseguia ver nenhuma diferença entre eles e ele mesmo. Por sua parte, ele sentiu-se um pouco ridículo assim deitado no chão, mas em paz e sossego, com a estranha sensação de ter feito bem.

 

Afinal, só se tinha antecipado. Não tinha dúvidas de que o Conselho Interstelar condenaria a P.U.A. a pagar esse dano. Ele sabia que a recusa de indemnização era injustificada.

 

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 16:09

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Segunda-feira, 3 de Fevereiro de 2020

Uma abordagem da Língua Portuguesa sob a óPtica (*) brasileira, para refleCtirmos que grafia queremos para Portugal

 

Aqui deixo esta dica, para que não digam que sou eu (Isabel A. Ferreira) que invento esta coisa de chamar Brasileiro ao que se fala e escreve no Brasil, pois se até os próprios Brasileiros e Alemães o dizem.   

 

Eu não invento nada. Tenho opiniões, obviamente, mas não trabalho debruçada nas minhas opiniões, tão-só sobre factos.

 

Se me perguntarem qual é a minha opinião sobre o que aqui se vai abordar direi: contra factos não há argumentos. E o facto é que, no Brasil, há muito quem considere Brasileiro ao que lá se fala e escreve. E quem sou eu para contrariar aqueles que têm direito a uma Língua que identifique o próprio país, e que não se revêem na Língua que herdaram do colonizador, ao ponto de se afastarem das suas raízes?

 

Li algures que «alterar o Idioma Português é sinal de falta de Cultura. O Idioma Português é um Idioma, cuja origem é o Latim, daí chamar-se um Idioma Neolatino, tal como o Castelhano, o Galego, o Catalão, o Francês e o Italiano. Os adeptos do AO90 coagem-nos a adoptar o nosso Idioma Neolatino adulterado na sua forma grafada.

 

É uma ortografia adulterada que queremos para Portugal?

 

Ensinar o brasileiro.jpg

 

Ensinar o Brasileiro” - Livro à venda na Amazon

 

Sinopse do livro:

Há um grande número de perguntas relevantes, comuns aos professores de língua materna, cujas respostas podem interferir na prática docente. Essa necessidade dos professores chamou tanto a atenção do autor, que ele começou a colecionar as perguntas que lhe eram feitas, no intuito de produzir um livro de respostas condensadas, com o objetivo de atender a essa demanda por material informativo. Cinquenta dessas perguntas reais estão aqui, mais ou menos com as mesmas respostas que foram dadas. Existem boas respostas na bibliografia corrente, mas essas respostas são ou dispersas, ou demasiadamente complexas, exigindo um tempo e um conhecimento nem sempre correspondentes à realidade de nossos professores do ensino fundamental e médio. Esse livro é o resultado dessa interação com os docentes do nível fundamental I e II e médio. Ele pretende ser sucinto, claro e objetivo, permitindo uma compreensão básica dos temas abordados. Esperamos que ele auxilie nossos professores do brasileiro na compreensão de alguns temas importantes. Mas é preciso ressaltar que não estamos propondo um receituário. Os conceitos e opiniões aqui apresentados nem sempre são consensuais, além de que precisam ser confrontados com a realidade de cada comunidade atendida e, em última instância, de cada professor e de cada aluno, para que as necessárias adaptações possam ser efetuadas, com bom senso e respeito.»

 

Fonte:

https://www.amazon.com.br/Ensinar-Brasileiro-Respostas-Perguntas-Professores/dp/8588456680

 

***

 

Português do Brasil a caminho da autonomia?

 

«A análise de documentos antigos e de entrevistas de campo ao longo dos últimos 30 anos está mostrando que o português brasileiro já pode ser considerado único, diferente do português europeu, do mesmo modo que o inglês americano é distinto do inglês britânico. O português brasileiro ainda não é, porém, uma língua autônoma: talvez seja quando acumular peculiaridades que nos impeçam de entender inteiramente o que um nativo de Portugal diz. Veja no vídeo produzido pela equipe de Pesquisa FAPESP como a expansão do português no Brasil, as variações regionais com suas possíveis explicações e as raízes das inovações da linguagem estão emergindo por meio do trabalho de diversos linguistas

 

Vale a pena ver e ouvir atentamente o que se diz no vídeo. E assim falassem todos os Brasileiros, porque era sinal de que, nas escolas, o Português (dito) do Brasil estava a ser ensinado adequadamente.

 https://www.youtube.com/watch?time_continue=331&v=0sDuGRKwguY&feature=emb_title

 

Fonte:

https://www.jornaltornado.pt/as-marcas-do-portugues-brasileiro/?fbclid=IwAR2gy2mTqjaZ-zkj2d8RgfxhewYzQhzzkm92iSoAEksYSRMu7hlysynSlis

 

«Adulteração, no Brasil, de livro português. A Ilíada, de Frederico Lourenço»

 

IlÌADA.jpg

 

Chamo a atenção para o facto de este texto, cuja leitura recomendo vivamente (clicar no link), porque além de excelente, está primorosamente bem escrito, ser da autoria de um jurista e professor universitário brasileiro, portanto, não é meu (para que não digam que eu é que ando sempre a implicar com o abrasileiramento de textos portugueses).

 

Soubessem os acordistas portugueses escrever tão apuradamente como Arthur Virmond de Lacerda Netto! Mas, lastimavelmente, os acordistas portugueses escrevem como meninos da primeira classe da escola básica.

https://arcodealmedina.blogs.sapo.pt/dulteracao-no-brasil-de-livro-751590

 

«A mutilação da "Língua-Mater"»

 

O desabafo de uma cidadã brasileira sobre o acordo do seu descontentamento:

«Ando macambúzia, cabisbaixa e sorumbática, desde o dia 01/Janeiro, quando ouvi oficiosamente em dois jornais televisivos diferentes, que o AO entraria em vigor no Brasil, a partir de então...não pelo que representa aqui, tolices de meia dúzia (se tanto) de regras sem sentido, mas porque um aceite do Brasil, era a chancela de que "pulhíticos" de ambos os lados precisavam, para deflagrar a hecatombe nuclear da Língua Portuguesa, que como o próprio nome diz é a "Língua de Portugal"...»

 

Ler o texto completo aqui:

https://olugardalinguaportuguesa.blogs.sapo.pt/a-mutilacao-da-lingua-mater-27973

 

Oscar wilde.jpg

 

 «O objectivo brasileiro é impor o Brasilês sobre o Português»

 

Quem o diz não sou eu. Quem o diz é Helena Seiler, uma brasileira que vive nos EUA, e tal como eu, sabe o que está por trás da imposição política do AO90.

Embora eu também o diga.

E digo mais: digo que o Português brasileiro, apenas diz respeito ao Brasil. Não diz absolutamente nada a Portugal.

 

Ver o texto aqui:

https://olugardalinguaportuguesa.blogs.sapo.pt/o-objectivo-brasileiro-e-impor-o-67583

 

Orwell.jpg

 

(*) No Brasil, o vocábulo óptico (relativo a visão) não se escreve com , escreve-se ótico (relativo aos ouvidos), o que, na minha óPtica, e penso que na óPtica de todos quantos são pela clareza e objectividade da linguagem, deveria ser escrito óPtico, quando falamos de olhar, e ótico, apenas quando falamos de ouvidos, até porque em nenhuma língua europeia se confunde ouvidos com olhos, e o “nervo ótico” é algo que nem sequer existe.

Em Portugal, devido ao abrasileiramento da grafia portuguesa, passámos todos a ouvir pelos olhos e a ver pelos ouvidos, numa promiscuidade, sem precedentes.

 

É isto que queremos para Portugal?

 

Isabel A. Ferreira    

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 15:40

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Quinta-feira, 30 de Maio de 2019

Ó eles e elas que por aí andam: poupai-me, porque já ando com os nervos e as nervas em pé!

 

Texto dedicado às mulheres que têm um complexo de inferioridade em relação aos homens, e necessitam que especifiquem o seu género, quando alguém se dirige ao TODO, em que elas estão integradas.

 

É que já não aguento mais andar por aí e deparar-me com este modismo (= idiotismo) do “todas e todos” “amigas e amigos”, “eles e elas”, que virou uma moda muito deselegante e sinónimo de ignorância, a qual no Brasil é considerada uma PRAGA LINGUÍSTICA, e em Portugal “é um must. Como sempre, na cauda do mundo.

 

TODOS E TODAS.jpg

Origem da imagem: http://www.geraldojose.com.br/index.php?sessao=noticia&cod_noticia=29802

 

Chamam-lhe "linguagem inclusiva” e dizem que é por causa da “igualdade de género”, como se a igualdade de género passasse pelo mau uso da Língua Portuguesa.

 

Dizer “todos e todas”, “amigos e amigasé um pleonasmo vicioso. É mais do que uma reiteração (repetição), é um ERRO, isto porque o TODAS já está incluído no TODOS. Bem como TODAS as outras palavras masculinas que integram o FEMININO, e o TODO.

 

TODOS (neutro) engloba todos e todas. Trata-se de um princípio gramatical do Português, que não herdou do Latim o género neutro.

 

Tentarei explicar o que acima referi (a insciência que por aí vai), como se estivesse numa sala de aula, a explicar a alunos do Ensino Básico, por que não devemos aplicar esta PRAGA LINGUÍSTICA para igualar os géneros.

 

Quando dizem: todos e todas; Portugueses e portuguesas; caros e caras; adeptos e adeptas; amigos e amigas; camaradas e camarados (esta à Bloco de Esquerda) demonstram que desconhecem o significado dos vocábulos: todos ( = toda a gente; humanidade); Portugueses ( = povo luso, habitantes de Portugal); caros (adjectivo masculino plural = quem estimamos, seja do sexo masculino ou feminino); adeptos (adjectivo/substantivo masculino plural = apoiantes, sejam do sexo masculino ou feminino); amigos (adjectivo/substantivo masculino plural = pessoas a quem nos ligamos por afectos); camaradas (substantivo de dois géneros = pessoas que connosco partilham uma função comum); e de todos os outros vocábulos que englobam o feminino e o masculino, porque se referem a PESSOAS no seu todo: homens, mulheres, crianças, novos e velhos, menos novos e menos velhos. Simplesmente TODOS.

 

Diferente é dizer especificamente minhas senhoras (porque - em princípio - não serão homens) e meus senhores (porque - em princípio - não serão mulheres). E isto sem qualquer segundo sentido, porque aceito a condição humana, tal qual ela é concebida. Só não sou tolerante (nem tenho de ser) com os que tendo obrigação de SABER, porque lhes foram dadas todas as oportunidades e privilégios, se recusam a QUERER SABER. E para tal não há perdão.

 

Suponho que o que leva os que se julgam modernos, a aplicar este modismo queira imitar algumas línguas estrangeiras, como o Inglês ou o Castelhano, que especificam, por exemplo, filhos e filhas (sons and daughters, hijos y hijas), quando querem referir-se a boys and girls, e a chicos y chicas. Porém quando se referem à sua prole (filhos) dizem children e niños (ou hijos).

 

Contudo, na Língua Portuguesa, o vocábulo Filhos é um substantivo masculino plural = conjunto dos descendentes = DESCENDÊNCIA, PROLE…

 

E o vocábulo filho é um substantivo masculino singular = indivíduo do sexo masculino (ou animal macho) em relação a seus pais. Se queremos dizer que tivemos mais de um indivíduo do sexo masculino, dizemos que temos X filho(s). Mas se quisermos dizer que, no todo, tivemos seis descendentes, dizemos seis filhos.

 

Portanto, quem anda agora, por aí, a imitar línguas estrangeiras, ou os modismos oriundos do complexo de inferioridade que certas mulheres sentem em relação ao homem, não conhecem nem essas línguas, nem a própria língua.

 

Experimentem traduzir isto para Inglês: meus queridos amigos e minhas queridas amigas = my dear friends and my dear friends. Experimentem também traduzir: Ingleses e Inglesas = English and English.

 

Agora reparem: como se traduz o modismo ( = idiotismo) Portugueses e Portuguesas, que agora tanto se ouve por aí:

 

Para Inglês = Portuguese and Portuguese
Para Castelhano = Portugués y portugués
Para Italiano = Portoghese e portoghese
Para Francês = Portugais et portugais

Para Alemão = Portugiesisch und Portugiesisch

 

No que pretendem transformar a Língua Portuguesa? Já não basta o Acordo Ortográfico que destruiu a Língua? Querem transformá-la numa língua extraterrestre? Extra-europeia? Extra-indo-europeia? Uma língua de ignorantes?

 

Já não será tempo de deixar os modismos e regressar ao que estava bem e não necessitava de remendos mal costurados?

 

Sempre ouvi dizer que o que é demais é moléstia.

 

E já chega de tanta moléstia!

É de nos deixar os nervos e as nervas em pé!

 

Isabel A. Ferreira

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 15:08

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Sexta-feira, 25 de Janeiro de 2019

LUSODESCENDENTES PREPARAM CAMPANHA DE PROMOÇÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA OU DO AO90 EM PARIS?

 

Diz a notícia que cerca de 200 lusodescendentes, portugueses e franceses, vão reunir-se este fim-de-semana, na Casa de Portugal, em Paris, para preparar uma estratégia de promoção da aprendizagem da Língua Portuguesa em França, uma iniciativa considerada "crucial" pela embaixada portuguesa.

 

A questão é saber que Língua Portuguesa irá ser promovida. É bom que eles saibam que os governantes portugueses andam por aí a propagar o Português grafado à brasileira, que se distancia substancialmente da Língua Portuguesa original. E se pensam, esses lusodescendentes, que estão a aprender a Língua Materna dos seus Pais, enganam-se. Andam a vender-lhes gato por lebre, crime que sairá bastante caro a Portugal.

 

ORTOGRAPHE.png

 

A reunião dos "Estados Gerais da Lusodescendência" ('États Generaux de la Lusodescendance', em francês) que será coordenada pela associação Cap Magellan, e juntará cerca de 150 estruturas associativas, empresários, estudantes e professores, entre lusodescendentes, portugueses e franceses, vai dedicar-se integralmente à promoção de uma Língua que em Portugal já deixou de ser Portuguesa, na sua forma grafada, mas também na oralidade, que já se começa a sentir a olhos vistos.

 

O embaixador português em Paris, Jorge Torres Pereira, considerou, num comunicado enviado à Lusa, que a segunda edição deste encontro debruça-se sobre um tema "crucial para o desenvolvimento sustentado da relação bilateral" Portugal-França: "a mobilização de esforços para que a língua portuguesa ganhe efectivamente a 'batalha do paradigma', e deixe de ser vista como uma língua de uma comunidade - 'une langue d'immigration' ['uma língua de imigração'] - assumindo o seu lugar natural entre as 'deuxièmes' [segundas] ou 'troisièmes langues' [terceiras línguas] a serem aprendidas pelas crianças e jovens em França".

 

O que o senhor embaixador deveria ter acrescentado é que a língua que estes lusodescendentes aprenderão não é a Portuguesa, se estiverem a seguir o que se passa em Portugal.

 

E só para dar um exemplo da mixórdia que será ensinada a estes desventurados lusodescendentes, transcreverei uma parte desta notícia, tal qual ela vem escrita na fonte:

 

Tal como o diplomata, outras figuras da comunidade, mas também do ensino em França, marcarão presença neste encontro. Christophe Chaillot, responsável pela cooperação educativa do Instituto Francês e Sophie Sellier, diretora de comunicação do mesmo instituto, vão partilhar a experiência da francofonia no mundo, assim como Anne-Dominique Valieres, inspectora geral da Educação Nacional, participará nos trabalhos.

 

Ou seja: diretora (dir’tora) (grafada à brasileira, sem ) e que em Francês se escreve direCteur (com ), e em Língua Portuguesa se escreve direCtora, (também com ).

Mas… inspeCtora já com à portuguesa.

 

Explique-se a estes lusodescendentes porquê escreverão “direCteur” em Francês, mas “diretor” em “português”, se o Português é uma Língua Românica tal como o Francês.

 

É esta mixórdia que será ensinada aos lusodescendentes por “professores” acordistas?

 

Diz a notícia que para a organização do evento, o português está "muito aquém" das suas possibilidades, atrás do espanhol, alemão e até italiano, sendo assim necessário dar ferramentas às associações e aos lusodescendentes para promoverem a aprendizagem da Língua de Camões.

 

Se andarem por aí a promover o AO90, não estão a promover a aprendizagem da Língua de Camões. E isso será preciso ficar bem claro, para que os lusodescendentes não sejam enganados.

 

Dizem que escolheram o eixo da Língua Portuguesa porque há muito trabalho a fazer, e quando comparado o Português com o Castelhano o Alemão ou o Italiano, está aquém das suas possibilidades em termos de ensino.

 

É preciso dizer que nem os Espanhóis, nem os Alemães, nem os Italianos adoPtaram a grafia de uma ex-colónia e lhes chamaram “Castelhano”, “Alemão” e “Italiano”. Estas línguas são línguas europeias e íntegras. E o que Portugal anda por aí a “ensinar” como Língua Portuguesa, é a forma grafada da língua da ex-colónia brasileira, que se afastou da matriz europeia.

 

Dizem que vão tentar construir uma verdadeira campanha para a promoção da Língua Portuguesa para convencer os decisores locais a abrir novas turmas de português. Se for o “português acordizado”, não lhe chamem Português, porque não é, e ao lado do Castelhano, do Alemão e do Italiano será o parente empobrecido das Línguas Românicas.

 

Os lusodescendentes saberão destes meandros?

Perguntem-lhes que LÍNGUA querem aprender: a Língua Materna dos seus Pais, ou a língua sul-americanizada que os políticos traidores da Pátria dos seus Pais andam por aí a impingir aos lusodescendentes e aos Portugueses.

 

Se esta reunião é para promover a Língua Portuguesa na sua versão culta e europeia, esqueça-se tudo o que escrevi.

 

Isabel A. Ferreira

 

Fonte da notícia:

https://www.jn.pt/mundo/jn-comunidades/interior/lusodescendentes-preparam-campanha-de-promocao-da-lingua-portuguesa-em-franca-10484742.html?fb_comment_id=2038700702849868_2039892072730731&comment_id=2039383129448292&reply_comment_id=2039892072730731

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 18:11

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Quinta-feira, 21 de Junho de 2018

À CONTA DO AO90 A ARTE DE BEM ESCREVER ESTÁ COMPROMETIDA EM PORTUGAL

 

Carlo Dossi, escritor italiano, que deu um grande contributo à Literatura e à Política dos finais do século XIX, diz que quem lê e não sabe escrever é mudo.

É verdade. Concordo.

É um mudo, sim, mas um mudo ignorante.

E Portugal está a encher-se de mudos ignorantes gerados pelo governo português.

E isto não é algo estranho, algo anormal?

 

CARLO DOSSI.png

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 18:11

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Quinta-feira, 31 de Maio de 2018

«Língua Portuguesa, diversidade sim, uniformidade não!» - Moção da Juventude Popular

 

Ao cuidado dos governantes portugueses, para que possam aprender com a Juventude, uma vez que rejeitam o saber dos velhos do Restelo, como gostam de chamar àqueles que defendem a Língua Portuguesa, tenham a idade que tiverem...

 

FLOR DO LÁCIO.jpg

Para quem não sabe, Olavo Bilac é um dos maiores poetas brasileiros

 

Rafael Dias, presidente da Juventude Popular (CDS/PP) elaborou uma moção sectorial sobre o AO90, apresentada a 28 de Maio de 2018 e aprovada por larga maioria em, na qual rejeita inequivocamente o dito Acordo Ortográfico de 1990, sendo a JP a primeira Juventude Partidária a rejeitar o AO90, considerando que ele «promoveu um grotesco aborto ortográfico à língua portuguesa, sendo desde logo, por isso, uma fraude política e técnica. "

 

Eis, na íntegra, o documento apresentado e aprovado por larga maioria, pela Juventude Popular (o negrito é da responsabilidade da autora do Blogue):

 

«Língua Portuguesa, diversidade sim, uniformidade não!»

 

A moção aqui vertida insta a que a Juventude Popular de forma activa e indubitável vise a reversão do Acordo Ortográfico de 1990. A língua portuguesa anda entregue à bicharada, não pode ser. O património derradeiro da nossa pátria não pode ser vexado desta forma. O AO90 apenas complica em vez de simplificar, confunde em vez de unir, uma união que não faz qualquer tipo de sentido, pois a língua portuguesa como idioma global, tal como o inglês, deve ver na diversidade a sua riqueza e não numa uniformização cega, que convém apenas a algumas editoras. Mais, o AO90 afasta o português, como língua proveniente do latim, de outros idiomas semelhantes, como é o caso do francês, do espanhol ou do italiano, o que torna a sua difusão e aprendizagem pela Europa mais difícil e mais incerta.

 

Acima de tudo o AO90 é uma falácia política, técnica e cultural que tem como corolário factual o falhanço político, dada a sua rejeição pela maioria dos países da Portugalidade - só o Brasil, ainda que a espaços e de forma dúbia, e Portugal praticam o Acordo - e, sobretudo pela maioria da comunidade que mais utiliza a língua portuguesa no seu quotidiano, jornalistas, escritores, cronistas, professores.

 

A língua é um dos símbolos de uma nação é, pois, o seu maior património imaterial, derradeiro e perene. A Língua é um património valioso e um instrumento determinante para a afirmação dos povos e das suas culturas, porque é através dela que exprimem a sua identidade e as suas diferenças.

 

Tal como a espontaneidade da vida e dos costumes de cada povo, a Língua é um elemento vivo, e não pode, por isso, ser prisioneira de imposições do poder político, que limitam a sua criatividade natural. Deve, naturalmente, evoluir com as vicissitudes dos séculos, não obstante, esta deve ser uma evolução natural e espontânea que tenha âmago na vontade popular e no uso que os constituintes da nação dela fazem no quotidiano ao longo de gerações, sendo por isso tutelada pelo costume. Não é, note-se, o caso deste Acordo Ortográfico, que procedeu de forma sumária à amputação de consoantes e acentos gráficos de forma bárbara, desconexa e ilógica, promovendo um grotesco aborto ortográfico à língua portuguesa, sendo desde logo, por isso, uma fraude política e técnica.

 

Uma fraude política também porque substituindo a vontade popular, a classe dirigente do nosso país à época sentiu-se legitimada para liderar um hipotético processo de uniformização da língua portuguesa que encalhou no Acordo Ortográfico” de 1990 (AO90), nascendo de uma ideia, no mínimo, ingénua do primeiro-ministro à época, Aníbal Cavaco Silva – depois merecendo a conivência dos executivos sucessivos - sob a bandeira de unificar as diversas variantes do idioma português, alegadamente, pasme-se, para evitar que o Português de Portugal não se transformasse numa língua banal, e de simplificar a escrita, o que fez foi abrir uma caixa de Pandora e criar um monstro, pois todos os objectivos desta aventura diplomática fracassaram redondamente. O processo de entrada em vigor do AO90 nos Estados lusófonos é também uma fraude política: o AO90 teria de ser ratificado por todos os Estados. Mas Angola e Moçambique, os dois maiores países de língua portuguesa a seguir ao Brasil, nunca o ratificaram. E, dos restantes países, só três o mandaram aplicar obrigatoriamente: Portugal, a partir de 2011-2012; Cabo Verde, a partir de 2014-2015; e o Brasil, a partir de 2016. Há, assim, repetidas incongruências no domínio jurídico que urgem ser denunciadas. O AO90 é também um lamentável exemplo da forma como o Estado abusou do seu poder. Visto que nunca foi fomentado algum debate público sobre o AO90. Um abuso do poder do Estado e uma fraude técnica também porque foram, em 2005, emitidos 25 pareceres negativos por parte de especialistas e de entidades consultadas. Todo o processo do AO90, culminando com a Resolução do Conselho de Ministros n.º 8/2011, é um exemplo evidente e pérfido de falta de transparência, inadmissível num Estado de Direito democrático.

 

O AO é um grotesco falhanço técnico e político e uma fraude porque, indefectivelmente, não unificou, muito menos uniu, apenas baralhou e confundiu. Primeiramente, segundo um estudo Maria Regina Rocha 2.691 palavras que se escreviam de forma diferente mantêm-se diferentes; apenas 569 que eram diferentes se tornaram iguais; 1.235 palavras que eram iguais tornaram-se diferentes e, destas, 200 mudaram apenas em Portugal, dando origem a soluções aberrantes como aceção, conceção, confeção, contraceção, deceção, impercetível..., enquanto no Brasil se continua a escrever acepção, concepção, confecção, contracepção, decepção, imperceptível, etc. O AO patrocina também a confusão e a dificuldade de aprendizagem da língua através da sua incoerência morfológica, note-se no exemplo de «Egito», os seus habitantes não são os «egícios» mas sim uns egípcios, ou nas célebres «arquitetas» e «espetadores».

 

Além de que, o AO90 não incide sobre os factores de divergência da linguagem escrita entre Portugal e o Brasil, nas quais existem diferenças lexicais (fato – terno; autocarro – ônibus; comboio – trem; usina-fábrica), sintácticas (tu – você) e semânticas (palavras com sentidos diferentes: camisola, por exemplo, que, no Brasil, significa “camisa de dormir”).

 

Estamos perante diferenças atávicas que caracterizam as duas variantes do Português e que não se alteram por decreto. No limite, não unificou ou uniu, porque desde logo o acordo não é aceite na maioria dos Estados com língua oficial portuguesa.

 

A jusante, a aplicação do AO90 afasta o Português dos principais idiomas internacionais, o que só traz desvantagens em termos etimológicos, de globalização e de aprendizagem dessas línguas estrangeiras, em relação às quais não temos qualquer vantagem em nos afastar. Por exemplo, a palavra “actor”: em todas as línguas, como a nossa, em que a palavra é de raiz latina, escreve-se “actor” com c ou k (excepto em Italiano, mas em que se escreve com duplo tt, que tem idêntica função de abrir a vogal “a”).

 

O AO 90 ao invés de cumprir o fim de evitar o desaparecimento do português de Portugal, um exercício desprovido de lógica e racionalismo, a caixa de Pandora que abriu, pelo contrário, fomentou a sua banalização. Senão vejamos: Qual é hoje o smartphone cuja escrita inteligente sugira António em vez de Antônio, género em vez de gênero, facto em vez de fato? Quantos são os programas electrónicos que prevêem apenas o célebre português do Brasil ou videojogos que atribuem ao português a bandeira brasileira?

 

Sejamos claros: a diversidade ortográfica — entre apenas duas variantes do Português: o de Portugal e o do Brasil — nunca foi obstáculo à comunicação entre os diversos povos de Língua portuguesa; como nunca foi razão de empobrecimento, mas, pelo contrário, uma afirmação da pujança da nossa Língua; o que, aliás, faz dela uma das mais escritas e utilizadas do Mundo.

 

O Inglês tem 18 variantes, e não deixa por isso de ser a principal língua internacional; o Francês tem 15 e o Castelhano, 21.

 

Devemos, portanto, como bons patriotas, celebrar a diversidade da nossa língua, e não uniformizá-la, rejeitando qualquer tipo de eugenia linguística sumária originada num decreto que não simplifica, não unifica e muito menos une!»

 

Original aqui:

https://www.docdroid.net/Rf9vOtK/mes-h.pdf#page=4

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 17:04

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Domingo, 7 de Janeiro de 2018

A campanha "Não Âdôtu" da TVI condiz com um logro chamado AO90

 

Todos (ou quase) devem ter visto as reportagens que a TVI transmitiu acerca das inacreditáveis adoPções ilegais de crianças, que se encontravam à guarda de entidades oficiais portuguesas.

 

Não é matéria deste Blogue esmiuçar os contornos obscuros que envolveram estas adoPções, mas tão-só dissecar a estranhíssima palavra “adoto” (que, segundo as regras gramaticais, pelas quais se rege a Língua Portuguesa, obrigatoriamente deve ler-se âdôtu) que apareceu nuns cartazes que várias personalidades se prestaram a “segurar”, pronunciando mal a dita palavra que, tal como as crianças roubadas pela IURD às famílias biológicas, também se desenraizou da sua “família latina” e perdeu a identidade.

 

Todos os que seguraram o cartaz pronunciaram mal aquele “adoto”, excePto Ricardo Araújo Pereira:

 

RAP.png

 

O Ricardo foi o primeiro a aparecer segurando o cartaz.

 

A minha primeira reacção foi de descomunal estranheza. O Ricardo Araújo Pereira consentiu “segurar” um tal cartaz? Eu recusar-me-ia.

 

Porém, a segunda reacção, quase imediata, foi de um enorme alívio e admiração pela postura erecta do Ricardo, que afinal não defraudou as minhas expectativas: aproveitou a ocasião para dizer bem alto: «Eu não adoPto, com PÊ, este silêncio, como também não adoPto, com PÊ, o acordo ortográfico».

 

Ah! Grande Ricardo. É assim mesmo. Não podemos SILENCIAR o roubo de crianças, como também não podemos SILENCIAR o roubo das consoantes não-pronunciadas da ortografia portuguesa.

 

Os outros, limitaram-se a segurar o cartaz e pronunciar mal a palavrinha “adoto” que, ali metida, entre o NÃO, o ESTE e o SILÊNCIO parece um vocábulo alienígena, oriundo de uma desconhecida linguagem extraplanetária. E, se no Brasil a adoPtam, por simpatia (uma vez mais) do italiano adottare, os Portugueses nada têm a ver com isso.

 

Não se esqueçam de que (e estou sempre a repetir-me, mas quando os cérebros são de pedra…), por enquanto, Portugal é um país europeu. Por enquanto.

 

Para os mal informados ou para os que optaram pela ignorância, deixamos aqui a origem da palavra adoPtar, que vem do Latim adoPtare, e todas as palavras desta família são escritas com , em Língua Portuguesa e em todas as línguas greco-latinas, à excePção da italiana, que o substituiu por dois tês.

 

Sem o , essas palavras são alienígenas e nada significam, na Língua Portuguesa.

 

Por exemplo, lê-se nos dicionários brasileiros: «O que é adoção: A palavra adoção tem origem do latim "adoptio", que em nossa língua significa "tomar alguém como filho"».

 

Não, não significa.

Se adoção (deve ler-se âdUção) significar alguma coisa, significará apenas algo que foi demasiado adoçado dUçádu).

 

De resto, deve escrever-se adoPtar, adoPção, adoPtivo, adoPtante, adoPtado, adoPtável, e obviamente eu ADOPTO, tu adoPtas, ele adoPta… etc., lendo-se com o Ó aberto. Isto é Língua Portuguesa.

 

Adotar (âdUtár), adoção (âdUção), adotivo (âdUtivo), adotante (âdUtante), adotado (âdUtadu), adotável (âdUtável), obrigatoriamente com o Ó passando ao som U, obviamente NÃO É da Língua Portuguesa.

 

Não sei por quais cartilhas estudou Malaca Casteleiro (o Bob o Construtor desta absurda ortografia que estão a impingir-nos), mas não foi, com toda a certeza, pelas mesmas cartilhas que, desde o nosso Dom Dinis, rei que ordenou o uso exclusivo da Língua Portuguesa nos documentos oficiais (ao contrário dos nossos actuais políticos que escrevem pela cartilha brasileira nos documentos oficiais) todas as gerações de Portugueses desde então e até Janeiro de 2012, estudaram e pensaram a Língua, falando-a e escrevendo-a escorreitamente, excePto os semianalfabetos, os analfabetos funcionais, que os há agora, por aí, aos montes.

 

Isabel A. Ferreira

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 15:56

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Quarta-feira, 25 de Outubro de 2017

Que vergonha, senhor primeiro-ministro!

 

«Assim vai escrevendo o primeiro-ministro que já nos disse que não toma a iniciativa de desfazer o Acordo Ortográfico http://bit.ly/2qGHSgD

Em nome de quê, então, se continua a descaracterizar desta forma um património de todos? Por teimosia? Estupidez? Insensibilidade?»

(Tradutores contra o Acordo Ortográfico)

 

Penso que por tudo isto. O senhor primeiro-ministro nem em Português, nem em acordês. Escreve no mixordês em que se transformou a nossa Língua. Nem os acordistas conseguem atinar com o “monstrengo” que pariram.

 

Daí que me proponha a lançar mais umas achas para esta fogueira, onde arde a Língua Portuguesa, e que tal como nas outras fogueiras, que fizeram arder Portugal, o senhor primeiro-ministro sacode a água do capote, como se nada tivesse a ver com isso…

 

ANTÓNIO COSTA.png

 

Origem da imagem:

https://www.facebook.com/TradutoresContraAO90/photos/a.212426635525679.35361.199515723483437/1389803597787971/?type=3&theater&ifg=1

 

Sabe o Senhor primeiro-ministro de onde vem parte da ortografia brasileira que os senhores governantes estão a impingir a Portugal e às crianças portuguesas, como sendo ortografia portuguesa?

 

Vem do Italiano.

 

No Brasil existe uma vasta colónia italiana, que exerce grande influência na vida brasileira, incluindo nas novelas, e a qual faz questão de falar e escrever "à italiana". Sabemos que os Italianos também mutilaram a língua deles (derivada do Latim, tal como todas as outras línguas românicas), suprimindo consoantes que os outros países mantêm, mas eles não.

 

Veja-se estes exemplos:

 

PT - No Português culto, escreve-se: Neptuno, directo, aspecto, objecto, insecto, óptimo, factura, dialecto, arquitecto, activo, espectador, húmido, eléctrico, reflectir, espectacular, acto, contacto, facto, omnívoro, adopção, tractor … para referir apenas algumas das mais flagrantes…

 

IT- Que em Italiano dá: Nettuno, diretto, aspetto, oggetto, insetto, ottimale, fattura, dialetto, architetto, attivo, spettatore, umido, elettrico, riflettere, spettacolare, atto, contatto, fatto, onnivoro, adozione trattore… 

 

BR – E no Brasil grafa-se assim: Netuno, direto, aspeto, objeto, inseto, ótimo, fatura, dialeto, arquiteto, ativo, espetador, úmido, elétrico, refletir, espetacular, ato, contato, fato, onívoro, adoção, trator – e qualquer semelhança com o italiano não é mera coincidência…

 

É que os Brasileiros, para se distanciarem do Português do ex-colonizador, optaram por italianizar estas (e muitas outras) palavras, como também afrancesaram e americanizaram e castelhanizaram tantas outras, que agora o governo português quer, porque quer, sem o mínimo fundamento científico-legal, nem qualquer sentido crítico que façam parte da nossa Língua Portuguesa.

 

Por estas e por outras, devemos exigir que devolvam a grafia portuguesa a Portugal.

 

Os que servilmente adoptaram a ortografia preconizada pelo AO90, mais não fazem do que italianizar o Português, imitando os Brasileiros que, por sua vez, imitaram os Italianos, mas também os Franceses e os Norte-americanos, descaracterizando a Língua Portuguesa que adoptaram aquando da Independência ocorrida em 7 de Setembro de 1822.

 

Eis, resumidamente, uma das fontes do mixordês utilizado pelo primeiro-ministro de Portugal. E quando um primeiro-ministro desconhece a Língua que, ditatorialmente, impôs ao País, o que fará o povo semianalfabeto que anda por aí a dar pontapés na gramática, a torto e a direito, sem a mínima noção do que está a fazer?

 

Francamente, isto não é ignorância e subserviência a mais?

 

Isabel A. Ferreira

 

publicado por Isabel A. Ferreira às 19:01

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