Carta enviada por Carlos A. Coimbra, um cidadão português que vive em Toronto (Canadá) há longos anos, a uma personalidade televisiva portuguesa, a propósito da corrupção activa exercida sobre a NOSSA Língua, à qual as comunidades portuguesas na diáspora estão atentas, e que defendem com unhas e dentes, ao contrário dos decisores políticos e apolíticos portugueses.
Isabel A. Ferreira
Texto de Carlos A. Coimbra
«Quero então expor-lhe as minhas ideias quanto à presença da Língua no Brasil nos média de Portugal.
Aliás, uma pessoa que se interessa por, e tanto pesquisou sobre descobrimentos, deve forçosamente dar importância à língua que "viajou" pelo mundo fora.
Há vários aspectos por onde entrar no assunto, mas começo com a diferença entre sotaque (ou pronúncia) e corrupção da língua.
Eu admito não conhecer Portugal tão bem como quem lá vive. Mas sei que há diferentes pronúncias, como do Alto Minho, da área do Porto, a inflexão de Alentejano, o por vezes quase incompreensível São Miguelense, e a "corrupçon" da Madeira.
Mas todos usam a mesma gramática, a mesma semântica, sem mudar a ordem das palavras, nem as alterar (um brasileiro diria alterar elas).
E o mesmo se mantém em relação a Angolanos e outros nacionais de territórios que foram portugueses, embora o sotaque deles seja mais carregado.
Só que continuam a falar o mesmo Português.
Lendo textos escritos por um português ou pessoa de proveniência africana, não podemos extricar qualquer evidência acerca da origem da pessoa.
Aliás, como comparação, entre os vários espanhóis (castelhanos) falados, eu sei distinguir o Castelhano original, o Mexicano, o Cubano e Porto-riquenho (caribenho) e o Argentino.
Contudo, todos falam o mesmo Castelhano, com a mesma gramática e ortografia; a única distinção é o facto de usarem alguns termos locais.
E quanto ao Inglês, lendo textos escritos por americanos e britânicos, vemos a mesma língua, embora haja diferenças pontuais na ortografia (z/s, or/our, etc...).
Ninguém pensou em unificar a ortografia, nem em usar em permanência locutores do outro lado (embora os média americanos usem alguns jornalistas não-americanos no estrangeiro, por razões que têm a ver com obtenção de vistos, por exemplo).
Agora falando do Brasileiro, a coisa é muito mais séria.
A modificação que os escravos foram fazendo à Língua dos colonizadores, em termos de pronúncia e possivelmente função da gramática das Línguas nativas, levou até a que os Brasileiros de hoje troquem a ordem normal das palavras, não usem verbos correctamente e tanto mais.
Um brasileiro que falava bom português gramaticamente foi o Presidente Temer...
E então posso passar ao vício de meter um 'i' onde ele não existe: abisurdo, opitar, e inúmeros outros exemplos.
E é contagioso! Exemplo:
Um tempo depois do 07 de Outubro, os Israelitas levaram jornalistas à povoação chamada Sderot (além de hebraico, é assim que está escrito na placa à entrada: Quer dizer "Boulevards", plural de Sder - eles formam plurais em -ot e em -im).
Esse grupo incluía pelo menos um português e uma brasileira.
Eu sei, porque vi uma peça na RTP e outra na Globo, na mesma noite.
Ora a brasileira dizia Siderot, devido à aversão que os Brasileiros têm a dizer duas consoantes juntas (Lula inclusivamente).
E fiquei chocado por ouvir o jornalista português copiar a brasileira, também dizendo Siderot!
Ainda mais curioso, noutra ocasião, ouvi outra repórter brasileira que preferia dizer Isderot (idêntico o que fazem com 'esporte').
Ora todo este linguajar "à brasileira" passa muito para lá de questões de pronúncia ou entoação, e consiste em corrupção da Língua.
Não se pode deixar de dizer isso quanto à introdução de sílabas que não existem.
Infelizmente, a Língua Brasileira tem características dominantes, tal como o Castelhano, senão basta ouvir portugueses que vivem há muito tempo no Brasil ou na Venezuela...
Isto é devido às Línguas serem parecidas, e tal não acontece comigo nem com quem mora na França (adoptam certos termos, mas não lhes afecta a pronúncia).
Não questiono o direito ao trabalho em Portugal de brasileiros, mas não quero ouvi-los na rádio e televisão a falar de assuntos que não têm nada a ver com o Brasil.
Isto particularmente quando os sotaques portugueses e africanos que referi não parecem ter lugar cativo nos canais de TV a que tenho acesso, e esses falam Português!
Creio que jornalistas portugueses até devem ficar ofendidos por serem preteridos. O caso do brasileiro na TVI/CNN-P a comentar futebol é um exemplo extremo, pois dá a ideia que se esgotou em Portugal quem saiba falar do assunto!
Aliás, quando um canal aqui em Toronto adquiriu uma meteorologista com pronúncia australiana, pode crer que eu protestei...
O Português falado já sofre de tantos erros...
E bem basta a falta de respeito pela audiência que leva a cair no Inglês fácil, em parte pela perda de vocabulário, causando até asneiras devido a não saberem o significado das palavras (ouvi uma comentadora que quando falava do Suez, lembrou o caso dum barco que entupiu o canal, e disse que era um verdadeiro "checkpoint", quando tal seria um "bottleneck").
Qual a necessidade de usar alguém que nem fala o Português correcto, e que em qualquer momento pode dizer uma "brasileirice"?
Eu nasci com inclinação para lógica (levou-me aos computadores) e Línguas (passou de entretenimento a conhecer a fundo o Inglês, a falar Italiano além de Castelhano e Francês, e saber o suficiente de Alemão; as minhas maiores peneiras vêm de me ter ensinado mais que o suficiente Russo, antes de haver Internet).
E sou compreendido em muita coisa de várias outras línguas estranhas, sem pretender que as falo minimamente, só por diversão. Até o tradutor do Google me entende, e isso tem utilidade neste país de imigrantes.
Mas o que interessa aqui é que quero fazer o que posso para proteger o verdadeiro Português da influência do Brasileiro, e que não seja considerado "variedade europeia", como me escandalizou a professora Dr.ª Sandra Duarte Tavares, pois assim caracterizou o meu Português original, enquanto assessora da Língua (!) na RTP.
Ofenderam-me, insultaram-me, tanto o PM como o PR: um disse que até gostaríamos de falar com o sotaque brasileiro, e o outro lembrou-se de imitar (mal) a fala brasileira, enquanto Chico Buarque ficou de boca aberta a pensar sabe-se lá o quê do indivíduo...
Pois lembro-me de dois casos:
Num jogo amistoso entre não me lembro quem e um Benfica em que entraram Ricardo Araújo Pereira e Fernando Mendes, o Ronaldo (o original, chamado "Fenômeno" pelos brasileiros - com ô) magoou-se, foi para o banco e foi entrevistado: Lesionou-se? Hem? Lesionou-se? Heeeem? Machucou-se?
Aí ele finalmente entendeu...
E recordo que a propósito de não sei quê, no Brasil, perguntei a uma pessoa: mas que explicação lhe dão a si?
Nada de resposta até eu modificar a pergunta...
O 'lhe' e o 'a si' não faziam parte do entendimento da Língua da pessoa...
Isto está indecentemente comprido, mas eu queria apresentar os meus argumentos duma maneira mais completa, que não têm nada a ver com xenofobia (aprecio, por exemplo, o Português que ucranianos falam).
E tenho a certeza de que mais tarde vou lembrar-me de mais que podia ter escrito...
Cumprimentos,
Carlos A. Coimbra,
Toronto»
«Podemos livrar-nos de Trump ou até do bicho coroado que nos atormenta, mas tardamos a livrar-nos da pseudo-ortografia.» (Nuno Pacheco)
Por Nuno Pacheco
Por má sina ou fatalidade, há coisas de que não nos livramos. Podemos livrar-nos de Trump, poderemos até livrar-nos do bicho coroado que nos atormenta, mas há um mal que continua a perseguir-nos sem desfalecer e que alastra como uma praga: a pseudo-ortografia. Houve até quem, de forma brilhante e acertadamente, lhe inventasse nome: pentaortografia. Num artigo bem recente, de 5 de Dezembro, no Diário do Minho, M. Moura Pacheco (ao qual, apesar do apelido, não me unem laços familiares) veio explicar de forma sucinta esta magno problema.
Começa assim: “Quando eu aprendi a escrever, havia duas ortografias: a certa e a errada. Agora há, pelo menos cinco. E todas auto-consideradas certas – é a pentaortografia.” Quais são? Ele explica: primeiro, a ortografia clássica ou antiga (a do acordo, ou reforma, de 1945); depois, “a do chamado ‘acordo ortográfico’ que, por sinal, nunca foi acordado”; em seguida, há “a ortografia do ‘super-acordo’ ou dos fanáticos do ‘acordo’. São aqueles que não podem ver uma consoante antes de outra sem que, zelosamente, a façam cair”; em quarto lugar, vem “uma mistura das três anteriores, em doses e proporções ao gosto de cada um, em ‘cocktails’ sortidos de um extenso cardápio.”; e, por fim, a quinta ortografia: “É a que não se integra em nenhuma das anteriores, que está errada à luz de qualquer delas, que desvirtua a fonética, atraiçoa a etimologia, ofende a morfologia e atropela a sintaxe. Uma espécie de sublimação da anterior. Mas é, talvez, a mais popular de todas.” Daí esta conclusão do autor, professor universitário aposentado: “Das duas velhas ortografias, o ‘acordo’ que ninguém acordou conseguiu fazer cinco – a pentaortografia. É o que se chama produtividade cultural!!!” Outra voz que se tem levantado, com regular insistência, contra tal realidade e dando exemplos, é a de João Esperança Barroca, na série “Em defesa da ortografia”, no jornal Cidade de Tomar.
Exagero? Antes fosse. Todos os dias, e é bom aqui sublinhar todos, surgem exemplos desta novilíngua que se vai insinuando pela má escrita e que, sem ameaçar a língua portuguesa (que já resistiu a tanto e há-de resistir a tudo), ameaça impiedosamente a nossa paciência. Alguns exemplos, recolhidos por olhares atentos, permitem uma avaliação sumária de tais misérias.
Na rua, um sinal de proibição de trânsito ressalva excepo [por excepto] acesso à escola”, bem perto de um outro onde se anuncia “Todas as direcções” (à “antiga”, com cç). Na RTP, no Jornal da Tarde, lemos este aviso: “Restrições do fim-de-semana impõem novos horários para espétaculos [!] culturais”; enquanto isso, num anúncio governamental de restrições devido à pandemia, lia-se nas projecções atrás do primeiro-ministro: “Limitação de circulação na via pública nos 121 concelhos, ao fim-de-semana a partir das 13h.” Um desgoverno no aplicar do Acordo Ortográfico de 1990, que, na caça aos hífenes, impôs como norma fim de semana.
Quem diz hífenes diz acentos. Mão zelosa deve ter achado por bem este título “A ERC pode por [em lugar de pôr] em causa a sobrevivência da TVI” (Visão, 24/11). Quanto a “impatos”, “patos” ou “estupefatos”, vão surgindo a eito, apesar de se pronunciar claramente o omitido C em impaCto, paCto ou estupefaCto. No artigo “Costa apresenta plano para investir 43 mil milhões até 2030”, no Observador (22/11), lá vinha: “com menor impato no clima”; o mesmo numa circular de formação escolar, onde se menciona o “impato nos currículos”. Já num antigo artigo da Visão (“Quando a Europa vai à Escola”), apesar de aí se escrever “impacto” sem erro, surge esta linda frase: “É sempre preciso patuar com algo que não é o ideal”; e na TVI (26/2) tivemos ainda esta pérola: “Setor bancário está estupefato com esta decisão.”
Isto já para não falar nos “artefatos tecnológicos” (numa comunicação sobre Tecnologia Educativa), no “julgamento por corrução do ex-presidente Sarkozy” (Lux, 30/11), na “interrução de trânsito” (Câmaras do Machico e do Funchal), ou na “queda de um helicótero” [por helicóptero] em notícias publicadas em 2019 em jornais de Coimbra e da Madeira.
O impato de tudo isto deixa-nos estupefatos. O melhor é ir a um espétaculo, a ver se passa.
Texto de Ana Cristina Pereira Leonardo
«Consolida, filho, consolida
É conhecida a inteligente farpa de Groucho Marx sobre a arte da política – e perdoem-me começar logo usando uma redundância, acrescida de um gerúndio e de uma dupla negativa: é que não há farpa de Groucho que não seja inteligente. Disse ele: “A política é a arte de procurar problemas, encontrá-los em todo o sítio, diagnosticá-los mal e prescrever-lhes o remédio errado.”
Transpondo as suas palavras para o universo mais restrito do chamado Acordo Ortográfico – restrito, mas ainda assim suficientemente amplo para nele caber a Guiné Equatorial, país onde por seu turno caberão uma dúzia de falantes de português –, iremos encontrar, via artigo recente de Viriato Teles, a definição magistral que dele fez Gregório Duvivier, um dos criadores da série “A Porta Dos Fundos”: “O Acordo Ortográfico é como a tomada de três pinos: criou uma solução para um problema que não havia.”
Chegada aqui, e não sendo razoável que se peça ao leitor o mesmo grau de conhecimento em matérias energéticas que se exige, por hipótese, a um Secretário de Estado da Energia – dando de barato que o presuntivo entretanto já aprendeu o que é crowding out –, esclareça-se que a “tomada de três pinos” é um modelo de tomada exclusivo do Brasil que se tornou obrigatório em 2001, a pretexto de oferecer maior segurança, o que até hoje nunca foi confirmado. A Portaria que o impôs, e que previa pesadas multas para os relutantes, foi assinada pelo então Presidente do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia, Armando Mariante Carvalho Junior, sujeito que se encontra sob investigação no âmbito do Lava Jato, tendo forçado 196 milhões de pessoas à sua observância compulsiva.
Quanto ao AO, ninguém até agora nos disse quanto rendeu o negócio. Para a Guiné Equatorial foi decerto lucrativo, já que, sem a entrada para a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, seria pouco provável que a filha de Obiang, presidente no poder desde 1979, alguns dos leitores desta crónica ainda não seriam nascidos, tivesse escolhido a Madeira para sede empresarial, o que já lhe terá rendido benefícios fiscais de 1,5 milhões de euros. Negócios à parte, a Academia Angolana de Letras voltou a insistir no Não ao AO, falando em “risco de deriva e desvirtualização da língua”.
Contas feitas, dos nove países da CPLP apenas Portugal, Brasil, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde (***) seguem o AO. Quatro. Mais um do que a tomada de três pinos.
Ana Cristina Pereira Leonardo»
Fonte:
https://www.facebook.com/ana.c.leonardo/posts/10213008606158487
***
Apenas Portugal segue subservientemente, ilegalmente e obtusamente o AO90
(***) Sendo que Cabo Verde já não tem a Língua Portuguesa como língua oficial, que passou a ser o Crioulo Cabo-Verdiano. O Português é agora língua estrangeira, e como tal será grafada à brasileira (se realmente o é), o que retirou Cabo Verde do rol dos países lusófonos/lusógrafos.
Restando, portanto, Portugal, onde apenas os subservientes a um Poder, também ele subserviente, grafam à brasileira, ou seja, segundo o AO90; e São Tomé e Príncipe, onde predomina a Língua Francesa, e o AO90 não tem qualquer expressão. Porque no Brasil, os Brasileiros estão-se nas tintas para o acordo ortográfico. Os restantes países lusófonos/lusógrafos (Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e Timor-Leste) não seguem o AO90.
Conclusão: apenas Portugal segue subservientemente, ilegalmente e obtusamente o desacordo disortográfico, imposto pelos que têm dificuldade em escrever correCtamente, por isso, pugnam por escrever como falam. E como falam mal, escrevem mal. E entram num círculo vicioso engrenado por uma ignorância descomunal.
Isabel A. Ferreira
. «Protecção contra a corru...
. «Viagem alucinante pelo p...
. «Acordo Ortográfico de 19...