Observação: por ser do interesse de todos os que, com boa-fé, se entregam à luta anti-AO90, eu, como autora do Blogue «O Lugar da Língua Portuguesa», um lugar/repositório de quase, quase tudo o que tem sido publicado e realizado acerca da luta contra o AO90 e em defesa da Língua Portuguesa, considerei, por bem, reproduzir a entrevista que o site «Vidas e Obras» fez à Página do Facebook «Tradutores Contra o Acordo Ortográfico».
É preciso que exista em Portugal uma verdadeira e informada opinião pública, como refere a Professora Helena Carvalhão Buescu, e para tal é necessário ler o que se diz e o que se escreve acerca desta matéria.
Isabel A. Ferreira
Fizeram várias publicações no Facebook sobre a “Resistência ao Acordo Ortográfico”. O que é preciso para que a resistência consiga efeitos imediatos?
A resistência já vem de longe, desde 1986, quando a sociedade civil se mobilizou em peso contra uma proposta de acordo ortográfico cheia de bizarrias (como o famoso “cágado” sem acento). Ainda assim, esse plano não foi derrotado — com uns retoques, havia de redundar no Acordo Ortográfico (AO) de 1990. Desde Vitorino Magalhães Godinho e o Grémio Literário a Vasco Graça Moura e ao Público, passando por José Pacheco Pereira, Miguel Sousa Tavares, Teolinda Gersão, Maria do Carmo Vieira e tantas personalidades e cidadãos mais ou menos anónimos, a resistência sempre esteve viva, fosse sob a forma de artigos de opinião, petições, uma iniciativa legislativa de cidadãos, acções judiciais, cartas a deputados e governantes, audições parlamentares, grupos de trabalho no Parlamento, a tentativa de referendo, activismo nas redes sociais e em blogues, etc. Em 2012, porque a voz dos tradutores sobre a questão foi quase nula, esta página quis dar o seu contributo.
Para se ter uma ideia do nível de oposição que existe, nunca houve uma única sondagem ou inquérito de opinião favorável, com a rejeição do AO a ultrapassar sempre os 60 %. Por todo o país, inúmeros órgãos de comunicação social, entidades públicas e privadas, editoras e autores continuam a não aplicar a nova norma. Esse simples acto, juntamente com a renúncia à compra de determinados livros ou jornais, ou a correcção de grafias em placa/avisos, constitui uma poderosa forma de resistência ao alcance de todos, embora com o passar do tempo essa atitude vá esmorecendo. Chegou-se a uma fase em que enquanto não houver vontade política, seja da maioria dos partidos, do Governo ou da Presidência da República, as tentativas de anulação ou discussão do assunto ao mais alto nível estão votadas ao fracasso. A postura do facto consumado tem feito o seu caminho, mas como se costuma dizer, nunca é tarde para se corrigir um erro. Neste caso, vários erros, tantos quantas as bases do Acordo, que levaram a confusões ortográficas, semânticas e de pronúncia. Nenhuma reforma anterior levou a este estado de coisas, o que diz bem das deficiências técnicas e científicas do documento.
Têm uma fotografia duma manifestação intitulada “A Língua não é uma mercadoria. Não está à venda!”. A ortografia já foi alterada três vezes à revelia do povo, resultando neste novo acordo ortográfico. De que forma é possível que esta premissa de que a Língua não é uma mercadoria e que não está à venda seja cumprida?
As alterações ortográficas têm coincidido com mudanças de regime, fosse em 1911, com a instauração da República, em 1945, durante o Estado Novo, ou em 1990, na democracia. Daqui se depreende que têm sempre um grande cunho político, subalternizando-se a parte técnico-científica. Isto foi por demais evidente no caso do último Acordo, em que a vertigem do tema levou o então primeiro-ministro Cavaco Silva a mandar assinar logo o documento e o Governo de José Sócrates a fazer aprovar o Segundo Protocolo Modificativo, de acordo com o qual bastaria a ratificação de apenas três países para que o tratado vigorasse. Uma manobra de desespero e imposição a todo o custo, visto que o assunto estava engavetado e esquecido há vários anos.
O ritmo a que Portugal faz reformas ortográficas, já sem contar com ajustes pontuais, resulta em alterações a cada 35 anos, um caso sem paralelo na Europa, por exemplo. A ortografia é conservadora por natureza, dado que a estabilidade convém à compreensão e é uma forma de entendermos o ontem e nos fazermos entender no futuro. Não deve ser alterada a bel-prazer, com ligeireza e como uma cartada ideológica ou uma moeda de troca diplomática. Por alguma razão nada disto aconteceu com o inglês, que, apesar de “arcaico” na forma, é a língua franca internacional, da modernidade e do futuro, seja na Internet, nas aplicações, na programação informática, nas publicações científicas, etc. Também a ortografia cristalizada do francês, cheia de duplas consoantes, letras mudas e falta de correspondência entre escrita e fala, não obstou à sua aprendizagem e a que o idioma tivesse nível mundial e fosse veículo de conhecimento. Por conseguinte, deixe-se a língua em paz. O património maior de qualquer nação, por ser um bem intangível, não pode servir para mercadejar. Acresce que, volvidos quase 15 anos da adopção, nenhum dos objectivos do Acordo foi cumprido, fosse no intercâmbio entre países lusófonos, na uniformização, na projecção do português, na maior simplificação, nas actas únicas em fóruns internacionais e na abertura do mercado livreiro.
Têm um álbum no Facebook sobre: “Oposição em Portugal ao Acordo Ortográfico”. De que forma é possível aumentar a oposição ao acordo?
Páginas como esta e grupos no Facebook e noutros locais, blogues, artigos em jornais, reportagens específicas e emissões dedicadas ao AO constituem contributos valiosíssimos não só para a compreensão e o despertar para as questões da língua, mas também para desconstruir muitas das teorias do acordismo e expor o seu fracasso. A este respeito, o jornalista Nuno Pacheco tem sido um lutador incansável, divulgando não só os erros e o caos ortográfico, mas dissertando sobre a relação que a política e os costumes em geral têm com a língua e a sua forma escrita. Também o escritor e revisor Manuel Monteiro, nos seus livros e em entrevistas, nunca perde a oportunidade de denunciar os atropelos do Acordo, que nem estará vigente (o decreto da norma anterior não foi revogado), conforme explanou o embaixador Carlos Fernandes em livro.
Criou-se em relação à língua portuguesa a ideia de que pode ser diversa em tudo, menos na ortografia, o que não se passa em nenhuma das línguas com variantes fortes. Esta visão é completamente anacrónica nos dias que correm. Cada país deve seguir as suas próprias orientações em consonância com as especificidades da sua variante, gozando de soberania linguística. Os Brasileiros mandam na sua variante, nós na nossa e os Angolanos na sua. Esta perspectiva teria evitado tantos equívocos e verdadeiros atentados culturais. É divulgando estas ideias, que no fundo são de senso comum, que será possível chegar a mais pessoas e aumentar a oposição, seja do ponto de vista técnico, social ou até filosófico. É que o AO faz mesmo o pleno — é uma aberração científica, política, jurídica e diplomática.
Têm um álbum no Facebook sobre: “Caos ortográfico pós-AO”. Após vários anos de imposição ilegal do Estado, Presidência, escolas, universidades, revistas, canais de televisão e outros meios de comunicação em que medida o AO tem prejudicado quer a ortografia, quer a oralidade? E que impacto é que tem tido este este Caos Ortográfico nos alunos, quem lê na TV ou jornais e revistas? Em que medida as alterações desde a reforma ortográfica têm prejudicado a ortografia, e este caos tem prejudicado as traduções?
O Acordo lançou a ortografia portuguesa num caos que é indigno de uma língua desta dimensão, como observou Bagão Félix. Não só continua a existir uma mistura permanente de grafias pré e pós-AO, como surgiram erros atribuíveis aos novos preceitos, como sejam “adeto”, “elítico” e “interrutor” (supressão do “p”), “espétaculo” e “desinfétar” (acentuação indevida pela retirada da consoante muda diacrítica), “inteletual”, “impato” e “fição” (ausência do “c”), “galático”, ”adição”, “contato” e “fato” (não perderam mesmo o “c”), “25 de abril” (mantém a maiúscula), “excessão” (a queda do “p” levou a uma deturpação ainda maior), etc. Grafias deste tipo aparecem com frequência no Diário da República e já constaram numa reprodução da Constituição Portuguesa no site da Assembleia da República. Além disso, um fenómeno inédito que ocorreu foi o retorno da escrita sobre a oralidade, como proferir “afêta” (devido à grafia “afeta”), em vez de “aféta” (“afecta”), ouvido a um jornalista há uns dias, ou “coâção” (“coação”) por “coàção” (“coacção”). Vocábulos noutras línguas têm surgido com consoantes truncadas, incluindo na imprensa. Depois, por via da supressão de hífenes, passámos a ter verdadeiras aberrações gráficas, tais como “conarrar”, “cocomandante”, “corréu”, “contraião”, “semirrei” ou “intrauterino”, além de confusões ortográfico-semânticas entre palavras que se tornaram demasiado parecidas, como são os casos de “conceção”/“concessão” e “interceção”/”intercessão”/”interseção”. Tudo isto, que está documentado em profundidade na página, e a que acresce o desmembramento de famílias de palavras, leva o falante a ter mais dúvidas do que certezas na hora de escrever. Houve uma dispersão ortográfica ainda maior do que antes, com a não-aplicação das novas regras pela maioria dos países lusófonos, com destaque para Angola e Moçambique, e nos próprios países que as aplicam devido às duplas grafias e à colagem da grafia à pronúncia, que será o aspecto da língua que mais variação apresenta. Toda a gente passou a escrever de uma forma ainda mais diferente.
Embora o objectivo fosse facilitar e simplificar a escrita, o que vemos é o inverso, porque a nova ortografia é pouco intuitiva. Temos recebido na página imagens de professores que se deparam com erros gritantes resultantes do Acordo em provas dos seus alunos, com os próprios a confessarem que não viam esse tipo de erros antes. Nas traduções, particularmente em filmes e séries, e inclusive em capas de livros, surgem vários tipos de anomalias, de que damos conta na página. Em sites de empresas de tradução, não é raro ler a indicação “Contatos”. Há tradutores que passaram a trabalhar para os mercados de Angola e Moçambique, a fim de contornar toda esta trapalhada.
Têm um álbum no Facebook sobre “Factos e propaganda anti-AO”. De que forma pode isso ajudar a esclarecer e levarem as pessoas a tomarem uma posição contra o acordo ortográfico?
É no esclarecimento que está a chave para que os cidadãos tenham consciência deste problema. Há pessoas que não tinham uma opinião definitiva ou eram a favor, mas perante as contínuas evidências foram obrigadas a reconhecer que não estavam a par de toda a realidade da questão. Em vez de bater no peito com o patriotismo lusitano, que em si não serve de muito para esta causa e pode prejudicá-la pelo desvio para outros campos, a solução é informar, explicar, educar. E convocar pessoas que nos outros países combatem este processo, incluindo no Brasil, onde existe uma oposição significativa entre académicos, personalidades de várias áreas e políticos.
O AO não é de esquerda nem de direita, tem apoiantes e detractores de ambos os lados, nem a norma de 1945/73 é «o português dos nacionalistas», como se escreveu por aí, e não presta porque é «do tempo da ditadura», segundo Santana Lopes. É apenas a norma estável, mais coerente e mais bem elaborada após as alterações de 1911.
Quais são os vossos sonhos para a Língua portuguesa e para Portugal?
É evidente que a língua portuguesa não se esgota no AO. Há quem afirme, como o professor Fernando Venâncio, outro antiacordista, que o idioma não está tão mau como muitos querem fazer crer e que esse sentimento é cíclico e já ocorreu noutras épocas. Pode ser verdade até certo ponto, mas é inegável que, somando-se ao AO, o português enfrenta desafios como o uso massificado e tantas vezes despropositado de anglicismos, o empobrecimento do ensino ou o afunilamento do vocabulário. Não podemos ser passivos e ficar à espera de que a língua sobreviva só por si própria, até porque, como se sabe, se extinguem línguas todos os anos com a morte do último falante e o avanço hegemónico do inglês a nível global ou de outras línguas mais poderosas a nível regional.
Por outro lado, não podemos estar dependentes do Brasil como o motor da língua e a olhar sempre para o outro lado do Atlântico. O Brasil faz o que lhe compete, faz avançar a sua variante, e tem algo que Portugal ainda hoje não tem, uma verdadeira política da língua, algo que o AO serviu para mascarar, sem nenhuns resultados práticos, como é notório. Será isso que falta a Portugal como um todo, mais iniciativa, mais capacidade de comando, menos atrelamentos, menos dependências, seja demográfica, económica ou culturalmente. Por vezes, dá a ideia de que temos um país ao contrário.
Tradução: Português (endónimo: Português ou, por extenso, Língua Portuguesa) é uma Língua Românica Ocidental da família das Línguas Indo-Europeias originária da Península Ibérica da Europa. É nos documentos administrativos Latinos do século IX que se registam pela primeira vez palavras e frases escritas em Galaico-Português.
Origem da imagem:https://www.joseantunes.com/sítio de José Antunes que, sentindo-se um exilado da Língua, quando os jornais em Portugal se fecharam para ele, investiu mais nos espaços de Língua Inglesa para onde já escrevia, entre outros que, entretanto, o convidaram. Custou-lhe muito ser impedido de escrever na sua própria Língua, quando a ela dedicou tantos, e mais 20 ao Jornalismo, e enraivece-se ao ver a forma como hoje se escreve. Todos os que amam a sua Língua Materna se enraivecem.
Quem me enviou o texto chamou caricato ao artigo que está na berlinda, e caricato é uma palavra suave para adjectivar o que ali foi escrito.
Eu nunca li nada tão disparatado, tão sem nexo, tão eivado daquele complexo de vira-lata, que o jornalista brasileiro Nelson Rodrigues usou para caracterizar os seus compatriotas.
O autor de “A língua portuguesa americana”, um linguista que imagino ser brasileiro, mistura alhos com bugalhos; vai buscar, a um passado que já passou e não pode ser modificado, coisas que já não interessam para nada; malha naquele ferro já frio que já enjoa. E não vejo mais nenhum país do mundo, como é o caso do Brasil, a interferir tanto numa Língua que pertence a Portugal, um País livre e soberano [a não ser que Portugal já não o seja] e que não mais lhe diz respeito, até porque já não lhe pertence, devido a uma esquerda da ala mais ignorante a ter deslusitanizado.
O autor introduz um outro modo de insultar Portugal e os Portugueses, chamando à linguagem falada e escrita no Brasil, “português americano”, quando deveria chamar-lhe Variante Brasileira do Português. Até porque o vocábulo “americano” pode ser atribuído aos EUA, mais do que à América do Sul, à qual o Brasil pertence. Quando muito, poderiam designá-la como Variante sul-americana do Português, uma vez que é assim tão importante para os Brasileiros sentirem-se incluídos na América que eles gostariam de ser, mas não são, porque não tiveram capacidade para gerir o espólio deixado pelo ex-colonizador português, assim como os norte-americanos tiveram, para gerir o espólio deixado pelos Ingleses. E desta incapacidade, os Portugueses não têm culpa nenhuma. Porém, até já ouvimos Inácio Lula da Silva, em Madrid, ter o desplante de dizer que a culpa de o ensino no Brasil ser um fracasso é dos Portugueses. Será?
Não sei como é que o Público se deixou levar pela lábia brasileira e permitiu-se criar um jornal, onde Portugal e os Portugueses são frequentemente insultados, no seu próprio País! Bonito serviço!!!!
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O mesmo e-mail trouxe-me uma análise ao texto A língua portuguesa americana, que passo a reproduzir, por ser do interesse público, e que é exactamente o que eu sinto e penso acerca desta infeliz incursão pela Língua que nasceu em Portugal, há quase 800 anos, e a mais ninguém pertence. Nenhum outro país do mundo se deixou tomar por parvo, como Portugal, em relação ao seu mais precioso símbolo identitário. Que espécie de decisores políticos temos?
Eis os pontos essenciais dessa análise:
- Promoção da ideia que no Brasil existe uma Língua Portuguesa e não a Variante brasileira do Português.
- Lusofobia e Ressabiamento pela Colonização: o autor menciona que muitos brasileiros acreditam que teria sido "mais vantajoso" ser colonizado pelos ingleses, algo comum entre aqueles que vêem a colonização portuguesa de forma negativa. Isso revela um possível ressentimento em relação à herança colonial portuguesa, ignorando os desafios que outras ex-colónias britânicas também enfrentam. Além disso, há uma tendência a desvalorizar as contribuições portuguesas, como se a língua e cultura brasileira de matriz lusa fossem um fardo ou inferioridade herdada.
- Complexo de Inferioridade: o questionar sobre a legitimidade do português falado no Brasil, referindo-se à "língua" como "português americano" para evitar a designação "português europeu", pode ser visto como uma tentativa de distanciamento da herança portuguesa. Isso sugere um complexo de inferioridade ao enfatizar uma diferença que, embora real, pode ser exagerada para afirmar uma identidade própria.
- Incongruências: embora o autor critique a expressão "português europeu", ele também admite que muitos brasileiros fazem uso da Língua Portuguesa na Europa, apontando para uma contradição. Além disso, ele defende que o Brasil deveria se ver como parte da América, sem adoptar superficialmente aspectos dos EUA, mas ao mesmo tempo propõe a adopção de uma nomenclatura que ecoa essa influência norte-americana, o que parece paradoxal.
- Generalizações e Falta de Coerência: o texto faz uma generalização ao sugerir que falar brasileiro é partilhar de uma herança que não foi sempre ética ou nobre, sem explorar as matizes dessa afirmação. Isso gera uma percepção incompleta e reducionista da História e identidade linguística do Brasil, que é mais complexa e diversificada do que a dicotomia sugerida entre "português europeu" e "português americano".
Em resumo, o artigo apresenta uma visão que pode ser interpretada como ambígua e, por vezes, sem surpresa, ressentida em relação à herança portuguesa, enquanto busca simultaneamente afirmar uma identidade distinta, mas que carece de uma base sólida em certos pontos.
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Nem todos em Portugal são parvos e desprovidos de sentido crítico.
Posto isto, penso que já era mais do que tempo de o Brasil abandonar a fase da primeira infância e dar um salto para a fase adulta e crescer como País livre, desatrelando-se de Portugal, porque enquanto andar atrelado ao ex-colonizador, a mendigar a muleta europeia e, muito ressabiadamente, a disseminar, por toda a parte, os maiores disparates sobre uma Língua que já NÃO é a deles, jamais chegará aos calcanhares dos Estados Unidos da América, como sempre foi do seu maior sonho.
Um país só é adulto e livre quando abandona a fase da sua primeira infância, e deixa para trás as suas frustrações, delírios e um desmedido complexo de inferioridade.
O respeito pela democracia que nos trouxe o "25 de Abril", cujo cinquentenário celebramos este ano, é incompatível com a criminosa imposição política do AO90 a Portugal. E nestas eleições não é democraticamente defensável continuar a silenciar - como se fez em todas as outras - a discussão deste tema fundamental para a defesa da nossa identidade.
"Acordai"!
Maria José Abranches
(...) No "Público", mais umartigode Nuno Pacheco, em defesa da nossa língua. Leiam, por favor, e enviem comentários - apoiem, não se calem - se sentem e entendem que a nossa língua é a coluna vertebral da nossa identidade, coisa que os outros povos conhecem, designadamente os antigos colonizadores, ingleses, franceses, que não recorreram a AOs para pseudo-defender as suas línguas!
Recordo as palavras de Jacques Attali: «L'identité française, c'est la langue, bien plus que le territoire. La langue d'un peuple est la colonne vertébrale de son identité.»
(...)
Por favor, não se calem, não podemos deixar morrer a nossa língua! E este apelo é particularmente endereçado aos professores, de todos os níveis e disciplinas, porque é a língua que suporta o nosso conhecimento!
Lembrem-se do que foi a ditadura e a censura, que estamos a aceitar de novo!
Celebremos os 50 anos do 25 de Abril, defendendo a democracia, que a imposição política do AO90, irresponsável e criminosamente, desprezou!
Maria José Abranches
*** (Momento 1)
Como eu sempre afirmei, o PS de António Costa, no qual nunca votei, nem voto e não confio nada de nada, governou com maioria absoluta que, na verdade, como sempre afirmei e foi confirmado, essa maioria absoluta transformou-se numa autêntica ditadura da maioria sobre a minoria do povo português. Não valem nada.
Fernando Alberto
***
(Momento 2)
Como já referi e mantenho, foram eles mesmos que reforçaram a minha opinião amplamente negativa. Parece que se sentem bem assim, tanto mais que, o povo queixa-se sempre muito mas, na hora de votar só pensa sempre, sempre, de forma mórbida, muito mórbida e sem pragmatismo algum, na velha "geometria política", de "esquerda", "extrema-esquerda, "direita" e "extrema-direita". Isto parece-me a mim, um pensamento mórbido, de uma autêntica "pandemia política". Não me admiro nada que, ás tantas, acabem todos os indecisos, por voltar a oferecer maioria absoluta ao PS, que o mesmo é dizer, oferecem a forma de continuarem a governar de forma "ditatorial", como se verificou até agora. Estou muito triste com tudo isto.
Fernando Alberto
[Um Povo maioritariamente apolítico, como poderá votar em consciência? Vota em bandeiras, mas não sabe a quem pertence as bandeiras. (Isabel A. Ferreira)].
«E, mais uma vez, políticos e jornalistas estão a fazer tudo para não falar do Acordo Ortográfico de 1990, imposto a Portugal ditatorialmente, sem discussão pública, ignorando os inúmeros pareceres dos especialistas que o condenam, assim como os muitos apelos dos cidadãos - manifestos, petições, e uma Iniciativa Legislativa de Cidadãos, que subscrevi e para a qual recolhi centenas de assinaturas, e que a Assembleia da República preferiu 'esquecer'! Democracia isto? E é com o desprezo pela nossa língua que estamos a celebrar o 25 de Abril, que nos trouxe a democracia?! Se isto tudo não fosse criminoso, seria sobretudo ridículo!!!»
Maria José Abranches
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Os sinais de abuso de poder tendendo para censura e métodos de ditadura do poder socialista já vêm de longe. Quis condicionar notícias de jornal e ameaçou jornalistas, abusou durante a pandemia e até quis manipular o nosso telemóvel, lança filhos contra pais obrigando-os a perfilhar na escola opiniões que rejeitam, faz contratos sem concurso, etc. - e ter corrompido a língua portuguesa por decreto é 'só' mais um dos crimes do declínio tirânico do PS.
Mário Gonçalves
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Tem toda a razão! Não estamos mal, estamos pessimamente.
Já reparou que, em todos os debates para as próximas eleições que houve, até agora, apenas um dos candidatos, o do PC, aludiu, de passagem ao tema da Cultura?
Com perfis destes, como nos havemos de admirar que a nossa língua que, como diz Pessoa, é "a nossa Pátria", seja apunhalada constantemente, com étimos estropiados pelo Desacordo Ortográfico e pelo uso abusivo, a torto e direito, de anglicismos despropositados?
No meu trabalho de escritor, de muitas décadas, (cerca de 60 livros publicados) e de Presidente da, infelizmente já extinta, Sociedade de Língua Portuguesa, sempre considerei tais atropelos, como um crime hediondo de lesa-cultura.
Há que não baixar os braços e seguir em frente com o combate a esta forma de analfabetismo...
Adalberto Alves
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Há vários crimes na atitude servil dos acordistas no Poder e fora dele: crime de lesa-pátria, crime de lesa-cultura, crime de lesa-língua e crime de lesa-infância (por obrigarem as nossas crianças a escreverem incorrectamente a Língua materna delas. Os adultos podem optar ou não optar pela ignorância, as crianças, não. As crianças são obrigadas a seguir as más orientações dos muito servilistas e acríticos professores.
Isabel A. Ferreira
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Numa outra oportunidade, tive ocasião de mencionar que vivo na Dinamarca há quase 50 anos. Apesar de andar arredado, in loco, das actividades e situações relacionadas com a política, há já muito que me tenho vindo a observar o estado da Nação, através do que vou tendo conhecimento do que se me oferece ver e ouvir nos meios de comunicação - mesmo longe da Mãe Pátria, o cordão umbilical continua sempre conotado.
A democracia não se impõe -- como aconteceu há 50 anos em Portugal -- mas aprende-se. A maioria do povo português pouco sabe o que a Democracia é e como se gere. Mas afirmo-lhe com tristeza que, mesmo aqui no norte da Europa onde a democracia tem orientado e governado as nações, ela tem-se vindo a definhar e a ser abusivamente mal interpretada. Isto deve-se aos governos de maioria absoluta, que não dão ouvidos à voz pública.
Fernando Kvistgaard
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Concordo plenamente com a sua análise, Fernando. As maiorias absolutas não fazem parte da dinâmica de uma Democracia, que tem, forçosamente, por inerência à sua própria designação, de ouvir a voz do Povo. Isabel A. Ferreira
«O debate é paupérrimo. Não se ouve uma só posição sobre a situação internacional; ninguém consegue perceber como se quer pôr o país a crescer, para além das descidas dos impostos...» (E. M. G.)
"Sim, a própria concepção destes debates, com este formato, deixa muito a desejar. Mas, mais uma vez, no que toca aos debates, tendo em conta os políticos e os jornalistas, assim como relativamente ao autor deste artigo, ex-ministro da Educação, constato como o analfabetismo tradicional marcou este país: a imposição política criminosa dessa ortografia aberrante, que desfigura e ridiculariza a nossa língua materna, continua a ser tabu! Mais uma vez, temos eleições em que essa questão é cobarde e estupidamente silenciada! Os ingleses imitam a ortografia americana, os franceses a do Québec, os espanhóis uma qualquer da América Latina? E se investíssemos no estudo e ensino sério da nossa Língua, como fazem os outros, em vez de andarmos há décadas a fazer 'acordos ortográficos' com o Brasil?"
Maria José Abranches
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Abrir o escuro (expressão utilizada pelo meu filho, portador da Síndrome de Down, para “acender a luz” e que eu adoptei por a considerar brilhante) é do que mais precisamos, mas não vejo jeito de chegar à luz, porque não temos políticos interessados em resolver os problemas do País. Nenhum deles vai para a Política pelos lindos olhos de Portugal. Se fossem, Portugal, neste momento, e passados 50 anos desde o “25 de Abril”, já estaria no topo dos Países Europeus mais desenvolvidos, e, como sabemos, continuamos na cauda da Europa, em quase, quase, quase, quase tudo...
Isabel A. Ferreira
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Já nada me surpreende nas atitudes da "Vida Política", os verdadeiros, aqueles que colocavam Portugal, os Portugueses e a Verdadeira Língua Portuguesa, como algo Imperdível, já não existem na Política mesquinha, interesseira, no tempo doente que atravessamos. Mas, não faz mal, mesmo assim, continuaremos o nosso caminho, rumo aos nossos objectivos, lutando contra o AO90. (...)
Belíssimo trabalho! Se depois disto não formos ouvidos... Que gente é esta que apareceu para nos governar, que mentalidade, que amor a Portugal e à nossa Língua?! Onde está quem nos acuda?! Lamento tanto, mas tanto... Precisamos de um outro 25 de Abril, mas, se calhar, sem cravos. As verdadeiras revoluções não podem (e vê-se) ser feitas com flores! Que posso dizer mais? Que a louvo a si e a outros, que têm tentado, com esforço, sabedoria e amor ao nosso País e à nossa Língua, combater por todos os meios ao seu alcançe, esta Grande Ofensa Nacional, que nos é feita com a maior impunidade, arrogância e despotismo.
Soledade Martinho Costa
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Isto parece incrível no Séc. XXI. Se bem que penso que em nenhum período da História, um governo, regime ou civilização procedeu à sua autodestruição. Os políticos portugueses estão a contribuir para a destruição da Língua Portuguesa e da Cultura do país! Não conseguirão, pois enquanto cá andarmos, tudo faremos para que eles não consigam destruir algo que possui séculos de história! NÃO AO ABORTO ORTOGRÁFICO!
Esta carta devia ser lida em voz alta no Parlamento. É inacreditável que os destruidores de Portugal (todos os Governos desde o 25 de Abril) também queiram destruir a nossa alma colectiva como Povo, tendo vomitado um criminoso aborto ortográfico imposto brutalmente, totalitariamente a toda a administração pública. Pobres crianças portuguesas consideradas atrasadas mentais por esse Casteleiro de má memória (...)! Parabéns à autora da carta Maria José Abranches. Vou partilhá-la imediatamente. Desde ontem que estou em estado de choque depois de ouvir o de-bate-bate dos dois senhores que querem governar o País. Tanta mediocridade, tanta falta de educação, tanta ignorância, tanta falsidade, tanta hipocrisia. Nunca se viu uma coisa destas. E os comentadores, para se mostrarem muito importantes a analisar o inalisável! Que tristeza. Portugal não caminha para o abismo. Já está mergulhado no abismo. O PR vai ser obrigado a eleger um Governo de Salvação Nacional, que devia já ter elegido depois da retirada do (des)governo de Costa que continuou a (des)governar...
Idalete Giga
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Idalete Giga, eu ontem vi o debate dos partidos sem representação parlamentar. Alguns são novos, outros lavaram a cara, mas quando abrem a boca percebemos onde estamos. Nem os fascistas, nem os "patriotas", nem os europeístas, nem os soviéticos, nem os lunáticos genéricos disseram nada sobre a língua.
Este modelo de debates também está inquinado, porque os temas são lançados pelos apresentadores, "os assuntos que preocupam os portugueses".
Ou eu não sou português, ou a Língua não é assunto.
E depois vê-se ad nauseam os comentários: "votaram neles...", ou "não votaste, não te queixes". Se me apresentarem 20 pratos de excrementos de um animal diferente, devo comer um ou perder o direito de dizer que tenho fome?
Pedro Henrique
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(A propósito dobloqueiodo PS aos textos que Isabel A. Ferreira envia aos políticos, via e-mail)
Como foi possível que o PS bloqueasse o seu texto? Prova bem a falsa democracia que tal Partido diz defender. Que atitude totalitária, arrogante, nojenta! Hoje, a censura é uma espécie de verme subterrâneo, que trabalha no escuro e na mais repugnante hipocrisia. Portugal caminha para o abismo e parece que ninguém quer ver. Não há um único seCtor da vida do nosso País que esteja bem. Cada governo que engana os portugueses e assalta o Poder é sempre pior que o anterior. Se assim não fosse, Portugal seria um dos Países mais desenvolvidos do mundo, pois temos recursos para isso. Não temos líderes. Não temos políticos humanos. Temos marionetes a mando da UE. E agora na questão da Língua, temos os maiores cobardes da nossa História, incapazes de assumir o erro GRAVÍSSIMO que foi o Aborto AO/90. Quem terá coragem para o dinamitar?
A cobardia total já foi revelada pelos falsos democratas do PS.
Tive a minha página do FB bloqueada e alguém criou três perfis falsos de mim.
Já não podemos confiar em nada. Cada vez me revejo menos nesta sociedade alienada.
Idalete Giga
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Este bloqueio só veio confirmar o que há muito venho, vimos dizendo, porque a Idalete e tantos outros também o dizem: vivemos numa ditadura de esquerda, disfarçada de democracia. As ditaduras tanto são de esquerda como de direita. Por isso, não faço distinção: são todos farinha do mesmo saco.
Como sempre, as suas análises são lúcidas e dizem da triste realidade do nosso desventurado País.
Pergunta: quem terá coragem para dinamitar o AO90?
Quem, se só temos COBARDES no Poder?
Estamos a ser cercados por uma mediocridade e pobreza intelectual urdida nos calabouços de São Bento e de Belém, para tramar Portugal.
E quem se opõe a esta mediocridade e incompetência é vigiado, é bloqueado, é interceptado, porque incomoda as mentes obscuras que nos desgovernam.
Vimos que nenhum partido político incluiu a perda da nossa identidadedevido à imposição ilegaldo AO90, como um assunto também prioritário.
Este é um dos maiores tabus de sempre. Porquê? Porque desde Dom Afonso Henriques que nenhum Rei, nenhum presidente da República, nem mesmo António Oliveira Salazar vendeu Portugal a um país estrangeiro. E o nosso Dom João VI, tão vilipendiado pelos ignorantes, foi um Rei que teve a coragem de enganar Napoleão, e salvar o Reino de Portugal e do Brasil, transferindo a Corte para o Brasil. Todos os outros monarcas europeus caíram às mãos de Napoleão, excepto o nosso Dom João VI.
Precisávamos de um novo governante corajoso, para nos salvar dos que estão a usurpar a nossa identidade, com a cumplicidade dos muito subservientes actuais decisores políticos portugueses.
A expressão “português do Brasil” está de tal forma enraizada no imaginário de alguns portugueses e na estratégia política do Brasil que chega por vezes — tanto nos meios mais passivos, porque ignorantes, e são muitos, como nos círculos mais bajuladores e parolos, que são ainda mais — a passar por verdade incontestável. Nada de mais falso, evidentemente, e nem o matraquear constante de tão bizarro wishful thinking (ou tão estranha alucinação) de uns e de outros, analfabetos e deslumbrados, poderá jamais abalar a realidade: a Língua Portuguesa e o brasileiro são tão diferentes entre si como o Português e o Galego, por exemplo, mesmo dando de barato que a Língua Galega, ao contrário da brasileira, mantém intactas as estruturas gramaticais — nomeadamente a sintaxe — comuns a ambas as Línguas.
Para ilustração da similitude entre o Português e o Galego, o que exclui liminarmente dos termos de comparação a língua brasileira, serviria qualquer uma das milhares de gravações “made in” Galiza que se podem encontrar no Youtube. Servindo apenas de exemplo, por conseguinte, mas também porque versa um assunto relacionado com a colonização linguística, o vídeo seguinte ilustra perfeitamente a evidência: Português e Galego são efectivamente quase iguais, com regras comuns, inteligíveis e coerentes entre si.
Portanto, como mais uma vez se vê e comprova — aliás, caso alguma dúvida subsista, basta ir aSanxenxo, por exemplo,que é já ali,e falar seja com quem for –, entre o Português e o Galego existem muito menos diferenças do que entre o Português e o brasileiro. Repita-se: as duas línguas ibéricas partilham exactamente as mesmas regras gramaticais, ao passo que a ex-colónia sul-americana as demoliu; os brasileiros têm obviamente o direito de fazer o que entenderem com aquilo que aos brasileiros pertence, incluindo a língua cuja origem portuguesa tanta repugnância lhes causa.
Justificam-se assim os encómios devidos à “jornalista formada pela Universidade de São Paulo, especializada em Jornalismo Digital“, por ter ousado — ou terá sido por mera distracção, quem sabe — escrever e publicar, para variar, contrariando a pandemia de públicas mentiras e negócios privados, a verdade, toda a verdade e só a verdade: não fala português.
Pode até não ser exactamente um acto revolucionário, ao contrário do que escreveu Orwell, mas a verdade liberta (João 8:32) ou, pelo menos, não merece castigo.
Saudações, PT (BR)
Com uma expressãozinha pequena, revelo minha brasilidade e descubro, todo dia, que não falo o português.
Na escola brasileira, ao lado de clássicos nacionais, comoMachado de Assis, João Guimarães Rosa e Clarice Lispector, os alunos precisam ler obras de Eça de Queiroz, Agustina Bessa-LuíseJosé Saramago. Comigo não foi diferente. Naquela altura, aos tropeços de uma jovem leitora preocupada com exames, pouco me importava de que lado do Atlântico estava cada autor. Já me era suficiente saber as escolas literárias e os estilos de cada um.
Não me recordo de ter estranhado mais o vocabulário de um Eça do que de um Machado. Os textos de ambos eram maravilhosamente diferentes e belos aos meus olhos adolescentes. E talvez tenha nascido bem ali uma grande ignorância que ora confesso: sempre achei que a minha língua fosse o português. Desde o ano passado, porém, venho descobrindo que falo um português.
A minha conclusão é de uma obviedade acachapante para os portugueses, que cresceram a ouvir os brasileiros tomando liberdades com sua língua materna novela atrás de novela. Nunca imaginei que agradeceria a Manoel Carlos por ser tão bem percebida (vejam como estou a aprender, semgerúndio também). Viva o nosso softpower, que agora passa também poryoutubers e influenciadores digitaisque cruzam fronteiras.
No Brasil, especialmente em 1980 e 1990, porém, não tivemos a sorte de ter contato com produções culturais portuguesas que nos apresentassem as diferenças linguísticas e nos preparassem os ouvidos. No máximo, de vez em quanto, topávamos com algumsoftware que pedia para escolher: PT-PT ou PT-BR? Algo que eu fazia sem dar qualquer atenção.
Este é meu primeiro contato mais intenso com Portugal. Antes disso, só havia cá estado (ou estado aqui, se eu for seguir o meu português) uma vez, em 2018, para um evento quase todo em inglês. E não há um dia em que eu não descubra uma palavra ou expressão novas. Talvez eu não tenha reparado que Eça falava outro português porque, naquela época, não havia nem autocarrro/ônibus, nem telemóvel/celular.
Também tenho de lidar com a sensação diária de escrever e/ou falar “errado” – o que é particularmente incômodo para alguém que trabalha com a língua. Há regras diferentes para os porquês e, confesso, ainda me dói ver uma pergunta com “porque” juntinho.
Falando em juntinho, adoro a relação dos portugueses com o diminutivo. Há jantarinhos e até beijinhos que podem, ainda assim, ser grandes. Beijinhos esses que me causam alguma confusão quando enviados “para si”. No Brasil, esse pronome oblíquo só é usado de maneira reflexiva em referência à terceira pessoa. “Ele cuidava de si próprio” seria levemente pleonástico, por exemplo. Quando enviam “beijinhos para si”, logo penso num “autobeijo”, para só depois retribuir. E, com essa breve observação linguística, espero ter ajudado os portugueses a ler o olhar confuso que pode surgir em alguns brasileiros diante de uma situação tão gentil.
Mais curioso, porém, foi perceber que basta uma reles palavra ou expressão para descortinar minha origem toda.
– Tô!
– Alô?
A rigor, ao atender o telefone, queremos só testar se o canal está funcionando: tanto faz a palavra que se usa. Mas não deixa de me soar divertida a maneira portuguesa de cumprir essa função fática. Quando alguém diz “por favor” (não “faz favor”) e “imagine” (no lugar de “por nada”), também é quase como se apresentasse um passaporte brasileiro. Agora, com licença, que achei bem elegante essa forma PT-PT de dizer “tchau”, mas deixar entreaberta a porta da comunicação.
A autora escreve em português do Brasil. Jornalista formada pela Universidade de São Paulo, especializada em Jornalismo Digital
[Transcrição integral (incluindo “links” a azul e destaques a “bold”) de artigo, da autoria de Letícia Sorg, publicado pelo jornal “Público” em 6 de Fevereiro de 2023.Sendo a autora brasileira, esta transcrição não foicorrigida automaticamente.A expressão “português do Brasil” é da autoria do “Público”. Destaques e “links” a cor verde acrescentados por mim.]
Após a finalização do processo de aquisição ou atribuição de nacionalidade portuguesa, você poderá solicitar o seu cartão cidadão (“RG” português) e o passaporte português. Estes são documentos importantes para quem pretende viver em terras portuguesas ou viajar para fora do Espaço Schengen. O cartão cidadão está vigente desde 2010 e conta com um chip que armazena todos os dados pessoais do indivíduo, assim como o passaporte vermelho português. [nacionalidadeportuguesa.com.br]
Para que se entenda minimamente o processo de neo-colonização invertida, incluindo os diversos meios envolvidos na intoxicação da opinião pública e nos apoios políticos que suportam ideologicamente tal perversão da História, conviria ao menos atender a alguns pressupostos elementares.
Do ponto de vista dos brasileiros, em geral e em particular, a premissa básica reside numa espécie de silogismo — que seria absolutamente risível se não fosse miseravelmente triste:
Primeiro — Portugal “invadiu” o Brasil (que, por mero acaso, não existia na época) no ano da graça de 1500 e por ali se entreteve até 1822 “roubando o ouro brasileiro” e “escravizando” e “exterminando” os brasileiros.
Segundo — Portugal vive ainda hoje à custa do “ouro roubado ao Brasil”, ao que acresce a fortuna constituída pelos fundos provenientes da União Europeia.
Logo, portanto — o Brasil tem toda a legitimidade “histórica” não apenas para se vingar da exploração desenfreada a que os brasileiros “foram” sujeitos pelos tugas, como também para que Língua e Cultura do antigo colonizador sejam agora substituídas pelas do (coitadinho do) povo anteriormente colonizado.
Além da reposição da “justiça” histórica (com efeitos retroactivos) temos, por conseguinte, o dever de ficar para sempre gratos — há dívidas que jamais prescrevem porque nunca poderão ser liquidadas — pelo facto de o Brasil exportar para Portugal, quase integralmente grátis, além de jogadores de futebol e telenovelas, também o seu “fálá”, o seu “isscrêvê” e, de resto, todo o seusambístico circo. Trata-se, segundo esta arrepiante lógica, de uma tomada de posse sumária, nada mais do que mera recuperação por perdas e danos, em simples exercício do seu deles direito natural.
Do programa oficial de ensino da disciplina de História do lado de lá:
《A colonização portuguesa no Brasil se efetivou a partir da exploração, povoamento, extermínio e conquista dos povos indígenas (povoadores) e das novas terras.》 《A colonização portuguesa no Brasil teve como principais características: civilizar, exterminar, explorar, povoar, conquistar e dominar.》 《A partir de então, já sabemos de uma coisa, que o Brasil não foi descoberto pelos portugueses, pois afirmando isto, estaremos negligenciando a história dos indígenas (povoadores) que viviam há muito tempo neste território antes da chegada dos europeus.》[“Brasil Escola”]
Por amostras deste calibre poderá julgar alguém que não é normal a política “educativa” do Estado brasileiro servir o objectivo político de disseminar — desde o ensino básico — a lusofobia, levando os brasileiros adetestar o tuga, colonizador, “ladrão” e “imbéciu”?
E, já agora, aproveitando o ensejo de estarmos a falar de imbecis, mai-las suas alarvidades, seria avisado atendermos também àquilo que move alguns portugueses coniventes — ou, em rigor, detentores de passaporte português –, os brasileiristas empedernidos, os bajuladores, subservientes e lacaios, os pategos deslumbrados com o pretenso gigantismo do “país-continente”.
Evidentemente, o primeiro factor a considerar para explicar esse fenómeno inexplicável é o chamado complexo do colonizador. O qual só por si não explica grande coisa (pois, naturalmente, daí o termo “complexo”) mas contribui para que entendamos as reacções de coitadismo militante que resulta de um outro complexo decorrente do primeiro: o complexo de culpa. Sintetizando em extremo uma série de processos mentais… complexos, o cidadão de um país que foi em tempos potência colonial sente imensa culpa não apenas por isso mesmo, a priori, como ainda mais pelos putativos maus-tratos e violências que os seus antepassados terão exercido sobre o (coitadinho do) indigenato das colónias, e portanto cabe às gerações actuais expiar as culpas, sejam elas reais ou imaginárias, mas tendo de passar necessariamente por reais, dos seus maldosos, sanguinários antepassados.
É certo, se bem que simultaneamente absurdo, que ainda hoje, para alguns portugueses, mesmo não tendo absolutamente coisa alguma a ver com qualquer das ex-colónias portuguesas (e, por maioria de razões, até porque já lá vão dois séculos de independência, quanto ao Brasil), o complexo de culpa implica um sentimento — apenas latente ou claramente expresso — da necessidade de uma punição, um correctivo urgente; a qual punição bem depressa trepará da esfera meramente pessoal para o plano colectivo. Ou seja, se o tuga “acha” que os brasileiros foram todos brutalmente violentados, salvo seja, pelo (maldito) colono dos séculos XVI a XIX, então todo o povo português deve “pagar” por isso — e pagar com língua de palmo, que nestas coisas terríveis não há cá borlas nem pechinchas.
Portanto, vá de “ceder”. E conceder. E ceder de novo. E as vezes e o que mais for preciso. Para pagar a “dívida” histórica não existem infelizmente empresas ou serviços especializados em cobranças difíceis, portanto o plano prestacional será para todo o sempre e a ele ninguém poderá escapar. “Nós” (ou seja, eles, mas, como sabemos, para eles, eles são “nós”), e isto já sem contar com os mercenários, vendidos, políticos, agentes, jornalistas e outros “intelectuais” por conta, temos obrigatoriamente de abrir mão de tudo — mas de tudo mesmo, sem a mais ínfima reserva, nem sequer a de carácter — e de “lhes” dar tudo aquilo que a “eles” apetecer.
Dos dois posts anteriores(1,2)sobre o Tratado de Igualdade de Direitos, não consta uma única referência a esse Estatuto de Igualdade, expressa ou mesmo subentendida, que tenha alguma vez surgido na imprensa ou em qualquer outro meio de comunicação (rádio, televisão, Internet); não existe também, realce-se de novo, uma só mençãoàquele Tratado internacionalem qualquer dos acordos subsequentes (#AO90,Acordo de Mobilidade,Estatuto de Igualdadeetc.). Realmente, é muito estranho tanto silêncio sobre um tema que fornece respaldo legal a todos os demais acordos entre os dois Estados.
Mais de 3000 conseguiram esse estatuto em 2018, mais do que em qualquer outro ano da última década. Raros são os estudantes que dessa forma conseguem ter propinas mais baixas, mas há outros benefícios para quem chega a Portugal. A entrada crescente de brasileiros no ensino superior nacional está a provocar uma corrida ao Estatuto de Igualdade de Direitos e Deveres (EIDD) entre cidadãos dos dois países. No último ano, praticamente duplicou a concessão dessa prerrogativa, definida no Tratado de Porto Seguro de 2000. O Estatuto do Estudante Internacional, aprovado há cinco anos, atraiu mais alunos do Brasil, mas ao mesmo tempo obriga-os a pagar propinas mais altas. (…) [“Público”, 11.08.19]
Dados constam do mais recente Relatório de Imigração, Fronteiras e Asilo 2021, do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), ao qual o PÚBLICO teve acesso. Estatuto de igualdade de direitos traz vantagens como um cartão praticamente igual ao cartão de cidadão português. No ano passado as concessões de estatuto de igualdade de direitos e deveres dadas a brasileiros aumentaram quase 40%. Em 2020, houve pouco mais de 7500 brasileiros que receberam aquele estatuto e, em 2021, chegaram aos 10.500. Proporcionalmente aos residentes brasileiros – que em 2021 passaram os 204 mil -, as concessões representam apenas 5%, mas a tendência de crescimento espelha as vantagens deste estatuto que quatro anos antes só foi concedido a 1736 cidadãos. (…) [“Público”, 23.06.22]
Os documentos de carácter legislativo acumulam-se e outro tanto sucede com outros tipos de registos, uns formais, outros nem por isso, mais as notícias, umas reais e outras meramente propagandísticas, com as inerentes e decorrentes consequências… práticas.
Até ver, a coisa vai correndo pelo melhor, tudo nos conformes, para os interesses geoestratégicos e económicos de uma das partes e para as contas bancárias de alguns traficantes da outra. Veremos então se Portugal já é de facto — porque jamais o será de direito — o 28.º estado brasileiro.
Talvez convenha, portanto, para facilitar o entendimento de uma questão com tudo para ser um problema, passar a referenciar sequencialmente a série de “posts” sobre este tema, o qual poderemos genericamente intitular como “O AO90 é um todo ou uma parte?”
Desta vez por excepção, muito aocontrário do habitual, recebi não apenas o original em papel como cópias integrais do artigo por e-mail, Messenger e SMS. O que se segue é, portanto, uma transcrição feita — para variar — na maior das calmas, tecnicamente falando, mas não tanto assim no que ao texto diz respeito.
Na verdade, o aparente fait divers tambémaqui relatado, envolvendo a agremiação profissional dos professores de brasileiro (vulgo, APP), surge neste texto com um tom algo… subsidiário. A começar logo pela forma verbal “livrem-se” e da formulação “nem para isto serve”, ambas utilizadas no título e desenvolvidas no texto propriamente dito. Na óbvia presunção de que se trata daquilo que à Língua nacional respeita e, concretamente, em que medida o AO90 a afectou, com que indesculpável gravidade os professores traíram a sua missão, então seria mais do que legítimo que ao menos os bois fossem chamados pelos nomes.
Ao não apenas acatar sem a menor hesitação como ao promover a ignorância, os sindicatos da classe professoral, com a bovina anuência de grande parte dos próprios “mestres”, traíram não “apenas” a Língua Portuguesa, a Cultura e a identidade nacionais, como também a própria dignidade (e a finalidade) da classe docente. Traíram a Língua dos seus alunos, dos pais destes e de todos os seus antepassados; portanto, traíram a História, o que equivale a dizer que traíram o seu país. Traíram ao trocar o Português por um linguajar alienígena e, num acrescido assomo de malvadez, colaborando activamente na sua difusão e propaganda — ou seja, deixaram de dar aulas e passaram a fazer lavagens a cérebros em formação. Traíram com a sua cobardia e a sua impassibilidade (não existem nem passividade nem neutralidade nisto) e, em suma, acabaram por trair a sua própria consciência — ou, em última análise, traíram a si mesmos.
Pode parecer estranho, mas a Associação de Professores de Português resolveu acordar para um magno problema: o das variedades da língua e o seu impacto nas escolas. Seria mais adequado chamar-lhes variantes, embora neste caso a palavra variedades se ajuste melhor aos indecorosos espectáculos a que temos sido forçados a assistir, em nome do idioma. Umanotícia recente do PÚBLICOdeu-nos conta de que a Associação de Professores de Português (APP) resolveu propor ao Instituto de Avaliação Educativa (Iave) a criação de “um grupo de trabalho no seu conselho científico para discutir a aceitação das variedades linguísticas codificadas do português nos exames nacionais”. Isto devido a relatos de professores e alunos, queixando-se de que o exame nacional de português “penalizava quem usasse a variedade brasileira”.
O Iave, claro, mostrou “disponibilidade para discutir o assunto” e lá teremos, neste país de comissões, mais uma. Veio à baila, como convém, o “carácter pluricêntrico da língua portuguesa”, que o ministro João Costa, à data ainda secretário de Estado, já brandira num artigo seu na revista Palavras, da APP (n.º 4, 2021). Alguns excertos: “A ideia de que alguma língua no mundo não apresenta variação não passa de um mito”; “Todos têm lugar na escola, os que cresceram a falar português europeu, os que não têm o português como língua materna ou os que falam outra variante”; “Isto significa, antes que seja mal interpretado, que – na competência que a escola tem de ensinar a norma portuguesa – não podemos fazer de conta que a diversidade não existe ou que não está lá, na aula concreta e no aluno concreto. Não defendo que os erros não se corrijam, como é óbvio. Mas isso não se faz sem o desenvolvimento de uma consciência de que nem sempre o erro é o que julgamos.” Como se vê, a APP e congéneres têm muito com que se entreter, no tal grupo de trabalho – onde hão-de esbarrar com o tal elefante.
Expliquemo-nos. Aqui há uns largos anos, vieram convencer-nos de que o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 vinha criar uma norma única no espaço universal do idioma. Tal miragem teve paternidade dupla, e assumida, de dois académicos, o português João Malaca Casteleiro (1936-2020) e o brasileiro Evanildo Bechara (n. 1928, hoje com 94 anos). Ora este último, numaentrevista ao jornal Estadão, em 12/11/12, dizia coisas como estas, em favor da sua “dama”: “Em qualquer área em que seja usada, tanto no Brasil, como em Portugal ou na África, a língua portuguesa será grafada de uma só maneira. Isso significa que um livro editado em português pode correr todos esses países, porque a ortografia é a mesma”; ou: “Uma língua que tem uma só ortografia circula no mundo com mais facilidade.”
A entrevista estava pejada de declarações ligeiras e falsas, prontamente analisadas e denunciadas em Portugal porJoão Pedro Graça, tradutor, então no espaço da ILCAO (a 14/11) e porAntónio Fernando Nabais, professor de Português e de Latim, no blogue Aventar (15/11). Este, no mesmo blogue,não resistiu agora a comentara recente iniciativa da APP: “Convém lembrar que a APP esteve sempre do lado da defesa do chamado acordo ortográfico (AO90), essa oitava maravilha do mundo que, segundo os seus diversos apóstolos, iria contribuir para a tão desejada ‘unificação ortográfica’ […]”, concluindo: “Só falta a esta associação a honestidade de reconhecer que este problema constitui mais uma prova de que o AO90 é um falhanço vergonhoso.” Pois, a par das normas existentes, ainda inventou uma outra, desajeitada e inútil: o “acordês”. O elefante.
Se fosse num conto do Mário-Henrique Leiria, o elefante ia com ele “tomar uns gin-tonics” ao Bastilha, reaparecida a múmia (in “Desabamento”, Contos do Gin-Tonic, págs. 97-99). Mas como se trata da língua portuguesa, o elefante anda de braço dado com as múmias a fingir-se útil e a atormentar-nos a existência. Não, a APP não reconhecerá que errou, nem os ministros que engoliram as patranhas do dito “acordo” voltarão com a palavra atrás, como já se viu. Bem pode Marcelo Rebelo de Sousa garantir, como fez nas celebrações do 5 de Outubro, que “nada é eterno em democracia”, porque nos impuseram uma excepção (aliás, uma “exceção”) a essa verdade universal: o acordo ortográfico. Ora, citando João Costa, como “não podemos fazer de conta que a diversidade não existe”, que tal livrarem-se de vez desse empecilho que a ninguém beneficia (a não ser os poucos que dele já tiraram proveito) e aceitarem que o português tem variantes, também ortográficas? E que é conhecendo-as e sabendo conviver com elas que se fará o nosso futuro? O resto é poeira, que insistem em atirar-nos para os olhos.
Professores querem grupo para discutir aceitação de variedades de português em exames
A Associação de Professores de Português (APP) propôs ao Instituto de Avaliação Educativa (Iave) criar um grupo de trabalho no seu conselho científico***para discutir a aceitação das variedades linguísticas codificadas do português nos exames nacionais. Segundo o Ministério da Educação, o presidente do Iave manifestou “disponibilidade para discutir o assunto com a referida associação, o que acontecerá brevemente” – mas não especificou quando.
Deve ser realmente justo que o jornal “Público” se reserve uma caterva de direitos autorais,ainda que as matérias sejam de interesse igual ao do nome do jornal e que tais direitos se estendam até àscartas ao directorou ao “provedor do leitor“, assim como aos artigos de ambos esses titulares — a tudo menos aos anúncios a granel. Semelhante reserva deve ser absolutamente necessária, de facto; nem a publicidade comercial nem a “institucional”,paga pelo Estado, chegarão com certeza para mandar cantar um cego, quanto mais pô-lo atocar rabecão.
Daí, portanto, não havendo um exemplar em papel que se possa digitalizar (isso não deve o pessoal do “Público” perseguir, pois que diabo, Portugal não é um país de capitalismo selvagem nem está cheio de gananciosos patológicos), então “é assim”, como agora se diz, quem quiser ler as novas que se fique pelas “gordas”. “Gordas” essas que são servidas com uns appetizers textuais, dois parágrafozitos à laia de Martini com azeitonas verdes. E já gozas.
Tão frugal serviço noticioso foi-nos agora de novo servido (se bem querequentado) tratando da mais recente salgalhada que envolve professores e um departamento governamental cujas funções, como parece indicar a designação daquele “instituto”, consistem em avaliar não se sabe ao certo o quê mas que terá, presumivelmente, algo a ver com a função “educativa”. IAVE. É bem achado, convenhamos. “Instituto de Avaliação Educativa“, mas que lindo nome, ui, tão catita.
E de uma transparência absolutamente brutal, logo a começar pela apresentação que faz de si mesmo: «Regemos a nossa actuação por princípios de imparcialidade, de transparência e de rigor técnico e científico, respeitando a política educativa vigente.» Belíssimo oxímoro, para começar, logo nesta entrada a pés juntos: conseguir juntar na mesma frase dois conceitos que mutuamente se excluem, não é para qualquer. Nota-se que há ali tarimba. Encadear “rigor técnico e científico” e “política educativa vigente”, convenhamos, é de mestre; bem, pode ser que a “vigência” da “política educativa” seja milenar ou eterna e não esteja afinal limitada ao período de “vigência” da política imposta por determinado mandato governamental de quatro anos.
As urgências lentas são um mimo, portanto entende-se perfeitamente a falta de “pressa” da “urgência”.
Esperam por que a simples passagem do tempo faça caducar o engulho. O método dofacto consumado, que tão espectaculares resultados produziu na “adoção” do AO90, servirá de igual forma para que esta pequena lagartixa se transforme por metamorfose em mais um jacaré.
Metáforas à parte, por mais horripilante e abrangente que seja a analogia, o que importa realçar nestas nada subtis vigarices ministeriais e sindicais é a previsibilidade: fica absolutamente claro o que se pretende, na sequência “natural” da imposição feroz do #AO90 no sistema de ensino ex-português, assim como não subsistem — desde o início — quaisquer dúvidas sobre o papel da APP na “adoção” e, por conseguinte, o que é e para que serve essa tal Associação de Professores de Português brasileiro, quais dos/dasseus/suasassociados/as são os/as principais protagonistas da traição, em que ligações (olha, editoras, ah, que surpresa) está emaranhada.
Toda a gente sabe qual é a táctica, a rotina mecânica utilizada sempre pelos mesmos em processos parcelares ou pontuais, como é o caso deste, e qual é o desfecho mais comum dos seus métodos de demolição: ou passa tudo a brasileiro ou então vaiferrete de “xenofobia” na testa. A receita do costume, claro. Da qual, aliás, com ingredientes como o IAVE e a APP e tantos outros, se tem este Apartado ocupado amiúde, partilhando receitas, umas mais substanciais do que outras, algumas com sua graça mas quase sempre com o sabor amargo característico dos cozinhados acordistas, cujo veneno, mesmo em doses homeopáticas, pode tornar-se letal se consumido sem grandes cuidados.
É miserável mas não deixa de ser caricato o que vai sucedendo, por exemplo paradigmático, no assim dito “sistema de Ensino” indígena: evidentemente, visto que “eles são 230 milhões e nós somos só 10 milhões”, então há que — além de escrever como “eles” falam — “facilitar” e “agilizar” também o percurso académico “deles” (e só deles, para os alunos portugueses fica tudo na mesma), aceitando que escrevam como falam (ou como de resto lhes der na real gana). Este aparente conflito resultante da aculturação selvagem deixará de o ser de imediato, como que por milagre, com o estalar de dedos do costume — ou seja, via “orientações” internas da tutela, na secretaria da 24 de Julho, e de seguida com a consagração legal na respectiva linha de montagem, a São Bento. [A vitimização como arma política – 2 (Gerundiando o estando ensinando) 03.08.22]
Deste enorme Pantacruel devem servir-se os comensais — que de “chefs” estamos mal — com estrema parcimónia e, sobretudo, com extremo cuidado. Cuidado, por exemplo, com os “ouvi dizer” e com os “achismos”. Ainda piores do que os tachistas são os achistas, como sabemos, especialmente quando acumulam funções.
Ao invés do que dizem alguns idiotas úteis (ou do que “acham” outros idiotas e inúteis), não existe nisto — pelo menos, não existem precedentes que estabeleçam algum tipo de jurisprudência na matéria — o direito de “objecção de consciência”. A RCM 8/2011equivale, para todos os efeitos, a uma ordem por escrito: pode a posteriori ser contestada, mas primeiro terá de ser acatada; a sua recusa liminar e sumária, alegando uma putativa objecção de consciência quanto a escrever em língua brasileira, poderá resultar em igualmente sumário processo disciplinar tendo em vista… o despedimento.
Posso afiançar, para o duvidoso caso de isso servir para alguma coisa, que obviamente não sou eu próprio o autor desta ou de qualquer outra das inúmeras abjecções legislativas de que o sistema jurídico português está servido. Quem, por mania ou desfastio, persistir em desencantar culpados e destapar alçapões pode, por exemplo, tentar descobrir para que serve ou o que é ao certo a nacional Provedoria de Justiça, esse misterioso serviço que trata da defesa do cidadão comum em qualquer situação de injustiça, à excepção de possíveis engulhos com a… Justiça.
Convirá relembrar, ainda a propósito de abjecções, que os professores — e por maioria de razões os de Português — nem piaram quanto à “adoção” da cacografia brasileira. Exceptuando algumas honrosas excepções, informal ou formalmente, individual ou colectivamente, muitos deles acobardaram-se miseravelmente perante o camartelo governamental. Aliás, foi e continua a ser a tal APP, o professoral sindicato com mais sócios, uma das principais “bandeirantes” da neocolonização linguística.
Sem grande esforço de memória, recordemos apenas um dos vários episódios que têm marcado a empedernida (e altamente suspeita) militância de certos (in)docentes.
«A presidente da Associação de Professores de Português (APP),Edviges Ferreira, não só discorda como afirma que “muitos” docentes “prejudicaram seriamente os seus alunos por não terem cumprido em devido tempo as determinações do MEC”.» «Um aluno que não domine a nova ortografia e escreva “efectiva” em vez de “efetiva, “pára” em vez de “para” ou “acção” em vez de “ação” por exemplo, pode perder “entre quatro a cinco valores em 20, segundo a presidente da APP. O que, admite Edviges Ferreira, tem consequências potencialmente graves, nomeadamente no que respeita à nota final e ao acesso ao ensino superior.»
[“post” ‘Abuso de poder: prisão até três anos’, publicado em04/05/2018]
Os resultados estão à vista.
Podem fingir que não sabiam, não viram, não ouviram. Um dia, fatalmente, hão-de ter de prestar contas. E pagá-las. Nisso o futuro não costuma perdoar. Exige aquilo que tem a haver, logo ali, à vista e em contado. É brutal, o futuro. Nunca faz nada “sutilmente”.
Parabéns Manuel Matos Monteiro, por mais este excelente, minucioso e precioso texto, que rebate inteligentemente os (des)argumentos do Sr. Nobre-Correia, no que ao AO90 diz respeito.
Isabel A. Ferreira
Por Manuel Matos Monteiro
«Não encontro no texto de J.-M. Nobre-Correia uma resposta à única pergunta relevante nesta matéria: porque é o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 um instrumento melhor do que o anterior?»
«Admirável Língua Nova – uma resposta a J.-M. Nobre-Correia»
Começo por saudar J.-M. Nobre-Correia pela coragem. O acordismo tem andado mudo. Ei-lo de volta.
Quem já leu e ouviu quilómetros de discussão em torno do assunto ficou, porém, desanimado. Mais uma vez. Porque o acordismo sistematicamente defende o Acordo sem conseguir uma coisa singela: apresentar motivos de defesa do que o Acordo introduz (ou mutila) na nossa língua. Há sempre desvios, tergiversação, evasivas, subterfúgios, tiros para todo o lado, mas nunca nada que tenha que ver com a redacção desse texto. Perdi a conta ao número de discussões sobre o dito que seguem o padrão (só mudam os matizes):
— Erros? Já havia antes… Homografia? Já havia antes.
— Mas agora há novos erros… E bem mais palavras homógrafas, algumas que dificultam a leitura…
— A ortografia é dos aspectos menos importantes…
— Porque fizeram o Acordo Ortográfico, então?
— O que nos deveria preocupar não é o Acordo, é a falta de leitura, os estrangeirismos, uma série de erros que damos, isto, aquilo e aqueloutro.
— Mas o Acordo não resolveu nenhum desses problemas e criou inúmeros problemas. Porque está a defender o Acordo, então?!
— Também há coisas absurdas com que não concordo nada…
— E porque nem essas se emendam?
— Nada é perfeito.
Os argumentos em favor da adopção do “novo acordo” só têm legitimidade se consubstanciarem respostas à pergunta: quais as vantagens do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 (AO90) perante o anterior? Tudo o que não diga respeito à comparação entre os dois instrumentos é, por conseguinte, usando uma expressão popular do Brasil, conversa para boi dormir.
Não encontro notexto de J.-M. Nobre-Correiauma resposta à única pergunta relevante nesta matéria. Repito-a com outra formulação: porque é o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 um instrumento melhor do que o anterior?
J.-M. Nobre-Correia nem sequer se digna de responder a algumas das inúmeras perguntas que foram feitas ou sequer refuta incongruências e graves defeitos que muitos estudiosos da língua portuguesa, provenientes de diferentes países, têm denunciado ao longo dos anos. Não deverá espantar-nos. Nem os próprios fautores do AO90 se deram a tal trabalho, havendo até livros explicativos do AO90, designadamente do seu principal mentor, que contrariam o próprio texto do AO90. O único documento oficial de defesa do Acordo será a sua própria Nota Explicativa, que não apresenta nenhum estudo e que tem valor científico, técnico e linguístico nulo, enquanto jura amor eterno às pobres criancinhas, que terão de aprender as consoantes roubadas pelo AO90 para falar e escrever inglês (e francês e espanhol).
O Estado português, que decidiu ignorar a quase unanimidade de pareceres negativos sobre o AO90, não propôs — impôs. Não convocou uma discussão pública nem tão-pouco apresentou justificações ao povo português, que, a avaliar por todas as sondagens conhecidas, é contra o AO90. Pior do que isso: o Estado português continua a não saber aplicar o AO90. Não está sozinho. Nos livros, no jornalismo, na academia, na comunicação escrita que garante adoptar o Acordo, encontramos a escrita tripla: um pouco do AO90, um pouco do AO45, um pouco de hipercorrecção do AO90. Se J.-M. Nobre-Correia quiser, far-lhe-ei chegar (privada ou publicamente, como preferir), todos os dias, grafias destrambelhadas que começaram a surgir depois da aplicação do AO90: “mição”, “núcias”, “fição”, “oção”, “inteletual”, “proveta idade”, “helicótero”, “fatos e contatos” aos pontapés, entre tantas outras. Bem como adulterações da própria língua inglesa: fator, eletronic, eletro, diretion, nomes de meses em inglês com minúscula.
Esperava-se mais de quem é tão contundente na descrição dos que se opõem (publicamente, supõe-se) ao AO90: os “fetichistas da precedente ortografia”, a “autoproclamada intelectualidade” [quem se proclamou intelectual no exercício da crítica ao AO90?], a “autoproclamada “elite” persiste, no entanto, em escrever na antiga ortografia [vírgula que não está na versão em linha, mas está na versão em papel] marca para ela de pertença à “boa sociedade”, “esta mesma autoproclamada ‘elite’ purista”.
Homogeneizar um grupo tão vário é difícil, porquanto abrange diferentes faixas etárias, diferentes ideologias políticas e filiações partidárias, diferentes classes sociais, diferentes países. Sobra o insulto. Quanto ao mais, se o AO90 é “uma guerrilha largamente estéril”, não se compreende por que razão o autor decidiu meter a colher (e da forma que o fez…) na discussão.
J.-M. Nobre-Correia decidiu que a “autoproclamada intelectualidade continua a guerrear o acordo ortográfico, mas fica indiferente perante a acelerada perversão da língua” e que: “Curiosamente, esta mesma autoproclamada ‘elite’ purista não diz nada da avassaladora invasão da terminologia inglesa na versão estado-unidense.” Reconheço, como outros, a avassaladora invasão de que o autor, justamente, fala, tendo escrito sobre isso ao longo dos anos. Mas que tem isso que ver com o AO90? Nada. Acaso quem é crítico do AO90 é tendencialmente favorável a essa invasão? Evidentemente, não. Posso enviar-lhe, caro J.-M. Nobre-Correia, um punhado de autores que criticam o AO90 e essa avassaladora invasão. (Não o fazem é no mesmo arrazoado, inventando tribos e putativos nexos de causalidade.)
Já que falou da importância de consultar dicionários, pergunto-lhe: está ao corrente da quantidade de palavras em que os dicionários e prontuários acordizados não se entendem quanto à presença do cê ou do pê, à sua ausência ou à dupla grafia, bem como quanto à presença ou ausência de hífenes nas locuções? Sabe que, consoante a fonte acordizada que consultar, encontrará diferentes respostas quantos às ditas “consoantes mudas” em não poucas palavras e quanto à presença ou ausência de hífenes em muitas locuções (e, por conseguinte, da presença de maiúscula ou minúscula em nomes próprios que integrem tais locuções)?
Como sempre, a defesa do acordismo desagua num desvio. Ainda não foi desta que escutámos (consegue, J.-M. Nobre-Correia, explicar-me a vantagem de o AO90 tornar este acento dispensável, facultativo?) argumentos fundamentados em favor do AO90. Misturar alhos com bugalhos parece ser a única forma de defender o indefensável.
Com excepção de lérias como “simplificação” (menos letras, menos acentos, menos hífenes não significa, de forma alguma!, maior facilidade de aprendizagem da escrita ou maior facilidade de leitura ou de clareza na mensagem, como demonstra o acento de “pára”, de que nem os acordistas abdicam); “evolução” (já mudámos antes, mudemos outra vez e tantas quantas forem necessárias, apenas porque isso é evolução!, desconhecendo-se que o AO90 tem características únicas, como a ortografia ir a reboque dessa mirífica “pronúncia culta”); “unificação” (é mentira, é mentira, é mentira), com excepção dessas tretas, dizia, não há, até hoje, um argumento sólido em favor do Coiso.
Deixo uma sugestão a J.-M. Nobre-Correia e a todos os leitores que se preocupam com a língua portuguesa. Procurem ler os resultados do projecto EILOS (Estudo sobre o Impacto na Linguagem Oral e na Sematologia – AO90), incluindo sobre a própria adulteração da pronúncia das palavras por parte dos discentes. Entre outros dados, leia-se: “33% dos alunos não distinguem o significado de receção e recessão (e 43% conhecem um deles); 73% não distinguem o significado de concessão e conceção (10% conhecem um deles); 60% não distinguem o significado de intercessão e interceção (16,6% conhecem um deles).”
Pós-escrito: para quem se proclama tão avesso a estrangeirismos, “constatação” e “constatações” são galicismos, e “em termos de”, um anglicismo.
Manuel Matos Monteiro - Autor, jornalista, formador e revisor
“Se há o português do Brasil e português europeu, porque é que não há o português de Angola ou de Moçambique ou da Guiné?” É fácil: porque há uma fraude chamada Acordo Ortográfico.
«O alerta vem de dois deputados e foi notícia no PÚBLICO de 28 de Junho: a Assembleia da República (AR) abusa de resoluções. Só entre 2015 e 2019 foram entregues pelos partidos 2278 projectos de resolução, com um pico na sessão legislativa 2017-2018 de 753 projectos, número que a actual está prestes a atingir, ou até ultrapassar, pois já vai nos 731. Qual o mal disto? Dar a impressão, falsa, de que vivemos num modelo de “governo de Assembleia”, o que é “inviável de acordo com o nosso sistema político”.
Quem o diz, citado pelo PÚBLICO, é Jorge Lacão (PS), ex-vice-presidente da Assembleia da República, que critica a “verdadeira inflação” desta figura regimental que “não passa de ser uma simples recomendação ao Governo”. Igual opinião tem Luís Marques Guedes, antigo líder parlamentar do PSD e actual presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, que vê nelas apenas um “resolve recomendar”.
Convém recordar que a Constituição atribui à AR a competência de (artigo 166.º) fazer e aprovar leis (a constitucional, a orgânica ou “sobre todas as matérias, salvo as reservadas pela Constituição ao Governo”), moções e resoluções que, estabelece ainda o mesmo artigo, “são publicadas independentemente de promulgação”. Sempre. Ora foram estas, precisamente, que se tornaram “moda”. Ouçamos, de novo, Lacão: “Não custa nada aprovar recomendações para que os outros as executem, não envolvendo isso nenhuma forma de responsabilização própria”; ou ainda: “A opinião pública, ao ouvir dizer que determinadas matérias foram aprovadas, fica persuadida que elas se tornaram efectivamente executórias o que não é verdadeiro”.
Com a “lição” aprendida, vem a propósito recordar um velho tema: o Acordo Ortográfico de 1990. Lembram-se de como foi aprovado? Sempre por resoluções. Primeiro o dito e depois os dois protocolos modificativos. Não admira, assim, que em tão polémica matéria sobressaia a ideia de irresponsabilidade parlamentar. “Não custa nada aprovar recomendações para que os outros as executem, não envolvendo isso nenhuma forma de responsabilização própria”, não é verdade? Daí que a iniciativa legislativa de cidadãos (ILC-AO), já aceite como projecto de lei e cujo objectivo é revogar o segundo protocolo modificativo do acordo (o tal que determinou que ele pudesse entrar em vigor com o “sim” de apenas três países), tenha esbarrado num muro. Até pelo desaforo de cidadãos a quererem fazer leis, quebrando o doce paraíso das resoluções.
Voltando um pouco atrás: para os que duvidam, o Acordo Ortográfico não é lei, nem nunca foi instituído como tal. Logo, ninguém fora da tutela governamental é obrigado a aplicá-lo. Se o Governo, seguindo o “resolve recomendar” da AR (ratificado pelo Presidente da República), decidiu pô-lo em prática, essa decisão só abrange as instituições a ele subordinadas, como a Função Pública (ensino incluído) ou a máquina estatal. Os privados podem aderir ou não.
Mas o expediente que ditou o abuso do segundo protocolo do AO90 vem de trás, do Conselho de Ministros da CPLP realizado em Brasília em 2002. Aí, “para agilizar a entrada em vigor” de actos firmados entre estados-membros, decidiu-se “recomendar seja considerada a conveniência” (sic) de incluir este artigo: “O presente Acordo entrará em vigor no primeiro dia do mês seguinte à data em que três Estados membros da CPLP tenham depositado na sede da CPLP […] os respectivos instrumentos de ratificação ou documentos equivalentes que os vinculem”. Para os que ficassem de fora, “o mesmo entrará em vigor no primeiro dia do mês seguinte à data do depósito”. E foi esta recomendação (que abusivamente se fez “lei”), sustentada em “resoluções” (sem nenhuma lei pelo meio), que ditou a sorte da ortografia da língua portuguesa!
Enquanto isto, vamos continuando a adiar o óbvio. Há dias, a Associação de Professores e Investigadores de Língua Portuguesa no Reino Unido promoveu em Glasgow um simpósio para discutir a “Diversidade linguística do português: oportunidades e desafios pedagógicos”. Luís Gomes, co-organizador e professor de português na universidade de Glasgow, interrogava-se, a propósito: “Se há o português do Brasil e português europeu, porque é que não há o português de Angola ou de Moçambique ou da Guiné?” Sim, porquê? É fácil: porque uma fraude chamada Acordo Ortográfico veio interpor-se na progressão natural da língua. Até que o removam, continuaremos a enganar-nos. A este propósito, uma boa notícia: surgiu no Facebook uma nova trincheira. Chama-se “Portugal em Movimento Contra o AO90” e faz este apelo: “Todos juntos seremos imparáveis e capazes de derrotar a inutilidade que é o AO90!” Assim seja.
ESCLARECIMENTO:
Da leitura do texto pode concluir-se, erradamente, que a Assembleia da República se desresponsabilizou no caso do Acordo Ortográfico ao aprová-lo, e aos respectivos protocolos modificativos, por via de resoluções. Ora neste caso concreto, as resoluções (não deixando de ser figuras decisórias menores no âmbito da AR) não são recomendações ao governo, mas sim aprovações a pedido do próprio governo, já que faz parte das competências do Parlamento (CRP, artigo 161.º, alínea i) a aprovação de Tratados Internacionais (caso do AO90). No entanto, o facto de a Assembleia da República aprovar uma resolução que é proposta pelo Governo não a isenta do seu papel de fiscalizadora da acção governativa, antes pelo contrário.
Mais adiante, quando se refere a IV Conferência dos Chefes de Estado e de Governo da CPLP, realizada em Brasília (2002), como origem do processo “que ditou a sorte da ortografia da língua portuguesa”, isso quer dizer que foi nessa reunião que se sugeriu que se passasse a usar o método de “três por todos” nos actos firmados, a partir dessa data, entre os estados-membros. O segundo protocolo do AO90, já a coberto dessa lógica, viria a ser aprovado dois anos mais tarde, em 2004, na V Conferência dos Chefes de Estado e de Governo da CPLP, realizada em São Tomé e Príncipe. Num caso e noutro, em discordância com a Convenção de Viena sobre Tratados Internacionais que Portugal ratificou também em 2004.»
Considerações ao redor da Língua Portuguesa, que está na berlinda, por ser a única Língua do mundo abandonada à sua má sorte.
Nenhuma outra Língua foi tão açoitada como a Língua Portuguesa, que anda por aí mal-tratada, mal-ensinada, mal-escrita, mal-falada, graças ao mal-parido AO90, assente maioritariamente na grafia brasileira, e na falácia dos milhões de falantes, contra os milhares que a escrevem e falam correCtamente.
(Alusão ao belíssimo poema do poeta José Gomes Ferreira, Acordai! musicado por Fernando Lopes Graça, um hino à inércia de um povo que, placidamente, aceita a sua má sorte).
Carlos Reis, ensaísta e professor português, “especialista” em estudos queirosianos [?)] e defensor acérrimo do AO90, em 2015 (*) disse esta verdade de la palisse: "não temos de falar como os brasileiros". Na verdade, não temos. Mas também não temos de ESCREVER como eles. Ou temos?
Num artigo publicado no Jornal PÚBLICO, no passado sábado, sob o título «Académicos no Reino Unido debatem descolonização da língua portuguesa» (**), Luís Gomes, co-organizador e professor de Português na Universidade de Glasgow, diz o seguinte: «Em certa medida, ainda há uma sensação de que Portugal é o dono da língua portuguesa, quando, na verdade, a maior parte dos países que falam português têm mais falantes do que Portugal, salvo algumas excepções. É uma questão que está muito presa na língua portuguesa, mais do que noutras línguas, como o inglês”».
Contudo, o que é ser “dono” da Língua? Todas as línguas têm um berço: são filhas dos Países onde foram geradas. A Língua é como aquele filho que, apesar de solto no mundo, e de ter gerado os seus próprios filhos, noutros lugares, não deixa de pertencer aos Pais que o conceberam, os quais não sendo os “donos” dele, são a sua raiz, a sua origem, a sua fonte, a sua alma, em suma, a sua genetriz.
Portanto, esta coisa de dizer que Portugal não é o dono da Língua, nem sequer se põe. Portugal não será o dono da Língua, mas a Língua Portuguesa é pertença de Portugal, o seu berço. O berço da Língua Portuguesa não é, pois, nenhuma das ex-colónias portuguesas que ao adoptarem a Língua Portuguesa, como língua oficial, geraram as suas próprias variantes (filhas), e não há nada que possa mudar a circunstância genética da Língua, porque foi em Portugal que ela nasceu, como Língua Portuguesa, pela mão de Dom Dinis. E isto é um facto que não pode ser desprezado. Daí que cada país deva ficar com a Língua ou variante da Língua que gerou.
Porém, por conveniências político-jurídico-económicas, surge a ideia peregrina e delirante de que lá por existirem o tais milhões de falantes, que se apoderaram da Língua e a destruíram (porque de destruição se trata não tendo sequer esse direito), por serem muitos, há que impor aos milhares que a escrevem e falam correCtamente, nos quatro cantos do mundo, um mal-engendrado acordo ortográfico, que apenas Portugal, cega e servilmente, tenta cumprir.
Os milhares de Ingleses, ou Espanhóis, ou Franceses, que também espalharam pelo mundo as suas respectivas Línguas, jamais permitiriam que elas fossem desenraizadas e destruídas, apenas porque também é falada por milhões.
Como diz José Saramago (cuja memória está a ser insultada, com a acordização da sua obra) «Uma língua que não é defendida, morre».
Sabemos que a Língua Portuguesa está a morrer, e que a intenção é matá-la e enterrá-la de vez.
O que andam a fazer todas estas vozes, que não as ouço gritar bem alto, contra esta infame tentativa de assassinato do nosso mais precioso património identitário?
***
Nota marginal:
Há quem ande no Facebook a dizer (porque serve os interesses acordistas) que quem acredita, como eu, que um Acordo Ortográfico (mesmo que mal-amanhado, como foi este de 1990) consegue EXTERMINAR a Língua Portuguesa, não sabe nada de idiomas; e até me mande escrever poesia ou romances de terror, mas que não fale do que não sei.
Coitado, o que pretende, quem assim fala, é que eu não fale do que SEI, porque não lhe convém, nem a ele, nem aos que ele serve, sem a mínima cultura crítica.
A Língua Portuguesa terá os dias contados, sim, nas mãos daqueles que acham que nada sei de idiomas. Na verdade, nada sei dos idiomas que desconheço. Mas sei da Língua Portuguesa e do que os seus predadores são capazes de fazer e de dizer para acabar com ela.
A autora deste Blogue não adopta o “Acordo Ortográfico de 1990”, por recusar ser cúmplice de uma fraude comprovada.
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