Eu nem sei como hei-de começar a contar isto. Não é que eu tivesse motivos para me surpreender. Não tinha. Contudo, dada a natureza da cerimónia de homenagem a Aristides de Sousa Mendes, no Panteão Nacional, esperava que ali, diante de uma plateia de notáveis, e sendo a cerimónia algo solene, Marcelo Rebelo de Sousa, representando a República Portuguesa, tivesse o cuidado de discursar num Português escorreito. Mas não foi o caso.
A cerimónia desta homenagem, à qual assisti via TV, e cuja notícia pode ser consultada aqui:
decorreu com a sobriedade esperada. A encerrar, Marcelo discursou. E no meio do discurso, não é que se ouve falar “daqueles e daquelas” e, mais adiante, de “todos e todas”, (**) como se isto fosse linguagem adequada a um presidente da República, que tem o dever de se exprimir na Língua Oficial do País, e não num modismo linguístico, que não passa disso mesmo: um modismo inventado por uma esquerda ignorante, para elevar a mulher ao nível dos homens? Vá lá que quando se dirigiu aos Portugueses, dirigiu-se aos Portugueses (= POVO lusitano, POVO natural de Portugal), e não aos Portugueses e Portuguesas, como por vezes se ouve por aí, o que seria (e é) um grande disparate!
Mas o mais pernicioso ainda estava por vir.
Fui ouvir as notícias da uma. Ao almoço vejo a SIC. E numa reportagem em que Marcelo visita um sem-abrigo, já seu conhecido, lancha com ele e recebe um molho de couves, na despedida, Marcelo, no estilo brasileiro, algo que não me foi estranho, por não ser a primeira vez que brazucou, diz, dando-lhe um abraço: «EU ADORO VOCÊ».
E andamos nós aqui a tentar que Marcelo Rebelo de Sousa, como presidente da República Portuguesa, e como é do seu DEVER, defenda a LÍNGUA PORTUGUESA.
Para quem não sabe:
(*) Daqueles = contracção da preposição de com o determinante ou pronome demonstrativo aqueles que, por sua vez significa pessoas, e pessoas são pessoas, criaturas humanas dos dois géneros: eles e elas.
(**) Todos = a humanidade; toda a gente. Todos os Portugueses (elas incluído) que constituem o POVO português.
Isabel A. Ferreira
Subscrevo este texto de João-Afonso Machado, publicado no Blogue Corta-Fitas.
Por tudo o que conhecemos do carácter de Eça de Queiroz, ele jamais desejaria que a sua ossada repousasse no Panteão Nacional. Eça está acima dessa vã vaidade, além de que Tormes é o lugar ideal para acolher um corpo que deu guarida a um espírito que, se existisse nos dias de hoje, demoliria os que, para proveito político, pretendem desalojá-lo da paz da sua sepultura, varrida pelos ventos…
Contudo, como refere João-Afonso Machado, a derradeira palavra pertencerá à Família Eça de Queiroz.
Isabel A. Ferreira
Por João-Afonso Machado, em 19.12.20
«O grande Eça no Panteão Nacional?»
«Está na ordem do dia: os restos mortais de Eça de Queiroz, pretende o Governo de Costa trasladá-los para o chamado Panteão Nacional.
O grande Eça, caso não saibam - e muitos não saberão... - morreu em Neuilly, França, e foi o cabo dos trabalhos para o trazer para Portugal, onde foi sepultado nos Prazeres, Lisboa, e, posteriormente, levado para Tormes, em Santa Cruz do Douro.
Ali repousa na sua merecida paz, longe da política e de todos os Abranhos deste mundo.
Agora, manifesta o Governo a sua vontade em o levar para o Panteão Nacional. Onde jazem figuras várias, nenhuma com a sua visão da política, do mundo e da Arte. Aliás (sem procurar apoio historiográfico), arrisco dizer - quase todos os sepultos no dito Panteão, far-se-iam mais depressa em nada se Eça sobre eles escrevesse...
Eu suponho - e espero! - a derradeira palavra caiba à Família Eça de Queiroz. E contra a Família Eça de Queiroz, é óbvio nada tenho a contradizer. Tenho é algumas ideias na cabeça. Por exemplo:
- Os governantes da época de Eça não perderam muita atenção com a sua morte. Só devido aos esforços de alguns amigos dele, atribuiram uma "pensão de sobrevivência" (aliás, de extrema necessidade) à viúva, a Senhora Dona Emília de Castro, e aos Filhos;
- Os ditos Filhos perderam essa pensão em virtude das suas convicções monárquicas, pelas quais se manifestaram nas "Incursões" de 1911-12;
- Eça, monárquico que foi, é lido da frente para trás, assim se esquecendo os seus romances A Cidade e as Serras, e A Ilustre Casa de Ramires, entre outros escritos do maior significado;
- Eça, confrontado com esta III República morreria do primeiro mal que lhe desse. Calcula-se que esse mal seria a própria enunciação do termo - "III República". É só imaginar o grande Eça em conversa com o Eduardo (Dâmaso) Cabrita;
- Pensando em As Farpas, Ramalho acompanhá-lo-ia, também, em tal desterro no Panteão. Mas Ramalho, politicamente, não é tão sonante. Mais a mais, sobreviveu à Monarquia e (in Últimas Farpas) escreveu - «A República continua dando ao mundo o mais inacreditável espectáculo - existe»...
Costa quer popularidade. Eça, que na História vai imenso mais além deste batoteiro, quer sossego. Está bem em Tormes, e recomenda-se. Por isso... Vamos todos zurzir bengaladas nestes Palmas Cavalões (e cavalonas...) da sacanice governamental. Pelo inesquecível e inigualável Eça de Queiroz.»
Fonte:
https://corta-fitas.blogs.sapo.pt/o-grande-eca-no-panteao-nacional-7168155?view=35892891#t35892891
Nota: clicar no link para ler os comentários ao texto, porque vale a pena.
Eu não sabia que o Panteão Nacional, um lugar onde se honra a memória dos mortos, podia ser alugado para jantaradas. Não sabia.
Mas depois de saber, não me surpreendi, pois num país onde o seu maior símbolo de identidade - a Língua - é substituído pelo símbolo de identidade de uma ex-colónia, toda e qualquer vilania é expectável.
A polémica que se gerou ao redor do Panteão, nada tem a ver com o jantar da Web Summit, porque este foi apenas mais um, e o mais mediático.
O grande e grave problema é o Panteão Nacional, um lugar onde se recolhem os restos mortais dos mais ilustres portugueses, estar no rol dos lugares onde se pode comer, beber, cantar e brincar-se ao Harry Potter.
Aqui não interessa se no salão das jantaradas não existem restos mortais e só lá estão sarcófagos vazios.
O que aqui interessa é o Lugar onde se acolhem os Mortos, o Panteão Nacional, servir de palco para jantaradas.
António Costa, primeiro-ministro de Portugal, achou ofensivo e chocou-se com a realização do jantar da Web Summit no Panteão? Então e os outros jantares? Então e aquele jantar da Associação de Turismo de Lisboa, que o então autarca António Costa presidia?
Eu não sabia que se faziam jantaradas no Panteão. Mas isso sou eu, que não resido em Lisboa, não faço parte do governo, há coisas que às vezes me passam ao lado… Mas os governantes não sabiam? Antes da Web Summit outros jantares já lá se realizaram, e não sabiam? Logo no Panteão, cuja responsável é funcionária do Governo?
O que se passa no Panteão é um insulto à memória dos mortos que lá repousam.
Até agora, a única pessoa que pediu desculpa por esta ofensa, sem culpa alguma, foi o fundador da Web Summit, Paddy Cosgrave.
Senhor primeiro-ministro, tudo o que é agressão aos símbolos de Portugal ou à memória dos mortos, é ofensivo e choca os Portugueses.
Também é ofensivo para Portugal e choca os Portugueses a imposição da ortografia brasileira, defendida, com unhas e dentes, pelo ministro dos negócios dos estrangeiros, e não vejo nenhum governante português, incluindo o nosso tão prestimoso presidente da República, ofendidos e chocados com tal agressão à nossa identidade.
Sejam mais honestos e menos hipócritas!
Isabel A. Ferreira
. Desde “daqueles e daquela...
. Um governo que não respei...